"Estou com a cabeça totalmente pirada", diz Odete Lara
Talvez a timidez de Odete Lara explique muito sobre o mito. "Sou retraída. As pessoas não acreditam, mas não abandonei a carreira porque me converti ao budismo. Quando tive mais tempo para mim é que o descobri", justificou ela, de 82 anos, que enjoou de atuar, cantar e escrever, e vive reclusa há 20 anos. "Estou com a cabeça totalmente pirada, cansada de tudo", disse ela, que, avessa à entrevistas, só topou falar com O DIA por causa da retrospectiva de seus filmes que começa na próxima terça-feira (10), no Centro Cultural Banco do Brasil.
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Na mostra, vão ser exibidos 16 dos 32 longas que a atriz estrelou. Dois deles estão despertando sua curiosidade. "Não me lembro de ter feito As Sete Faces de um Cafajeste (1969) e Um Filme 100% Brazileiro (1986)", confessou. "Mas fiquei com vontade de assisti-los. Estava disposta a não ir. Nem sei se mereço a homenagem. Eu era boa atriz, tinha intimidade com a câmera, era paixão mútua. Mas depois enjoei", disse ela, que foi dirigida por Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Walter Hugo Khoury, entre muitos outros.
Dona de um histórico de vida intenso, dentro e fora das telas, a atriz confessa que era egoísta. "Não resta nada para eu ficar chorando em cima. Busquei autoconhecimento e me transformei. Tive uma infância terrível. Minha mãe se suicidou quando eu tinha 6 anos. Depois meu pai fez o mesmo, aos 15. Nunca tive instinto maternal. Achei que ter filho seria dar sofrimento", contou a atriz.
Por isso, hoje Odete conta apenas com uma ajudante no apartamento do Flamengo, para onde se mudou no começo do ano. "Sou do tempo da liberação da mulher. Eu fazia coisas naquela época que eram mal vistas: morar sozinha, jantar sozinha num restaurante", recordou ela, que abandonou o refúgio em Friburgo após a morte da mulher do caseiro. "Ele não quer mais viver lá por causa das lembranças e não tenho mais como administrar", falou.
Meio desanimada com a vida - "muitos já foram e eu continuo aqui" - Odete descarta de vez voltar a atuar. "Já recusei muitos convites. Preferia catar jabuticaba. Acho que nem teria memória para decorar um texto. Mas, às vezes, eu me pego cantando", disse a diva.
Para ajudar a refrescar a memória de Odete Lara, procuramos Norma Blum, que dividiu a cena com a atriz em As Sete Faces de um Cafajeste, e Maria Gladys, que participou de Um Filme 100% Brazileiro. "É claro que ela fez Cafajeste. Eu tenho uma foto de nós duas. Ela sempre foi profissionalíssima", recordou Norma. Já Gladys aumenta as dúvidas. "Odete nesse filme? Acho que está errado. Fiz uma participação. Não lembro dela. Também fiz Copacabana me Engana (1969) e Bonitinha, Mas Ordinária (1963) - que estão na mostra -, mas nunca tive o prazer de contracenar com ela", lamentou Maria Gladys.
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