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Fiéis de favelas retomam congado na igreja católica de MG

Após um século de proibição, congadeiros resgatam tradição religiosa afro-brasileira na capital mineira e entorno

3 set 2023 - 05h00
A cena desta foto, com congadeiros dentro de uma igreja católica, estava proibida há cem anos em Belo Horizonte
A cena desta foto, com congadeiros dentro de uma igreja católica, estava proibida há cem anos em Belo Horizonte
Foto: Divulgação

Após proibição que durava exatos cem anos, pessoas religiosas pretas e periféricas de Belo Horizonte conquistam uma vitória histórica contra o preconceito religioso: a possibilidade de realizar cerimônias de congado, ou reinado, em dependências da igreja católica.

A celebração reúne canto, dança, teatro e espiritualidade cristã de matriz africana. Comemorada em todo o país, o congado se destaca em Minas Gerais, e ganhou força em morros, favelas e periferias. Mas estava proibida em Belo Horizonte e arreadores desde 1923.

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O Muquifu - Museu dos Quilombos e Favelas Urbanos, é protagonista no resgate do direito à prática religiosa junto à população negra da periferia do Aglomerado Santa Lúcia e das irmandades dos congados e reinados.

A iniciativa chamou atenção da arquidiocese de Belo Horizonte e o arcebispo metropolitano Dom Valmor revogou a proibição em 10 de agosto, passados exatos cem anos da proibição que foi assinada por Dom Cabral, então bispo da diocese da capital mineira, exigindo a expulsão dos reinados do interior das igrejas católicas.

Primeira missa com congadeiros em uma igreja católica após liberação ocorreu em 10 de agosto de 2023, data histórica
Foto: Divulgação

Representantes do congado lutaram por reparação

Isabel Casimira, Rainha dos Reinados de Minas Gerais, foi uma das praticantes da tradição cultural afro que batalhou para reintegrar o congado à igreja. Ela chegou a enviar carta ao Papa Francisco.

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“Eu não posso deixar que os meninos que vão herdar essa nossa tradição não consigam fazer uma missa na igreja, se eles assim o quiserem”, diz Isabel.

Quando a revogação foi conseguida, o Muquifu organizou a roda de conversa Senhor Padre Abre a Porta, para oficializar a conquista. Um dos convidados, Nivaldo Ferreira, bispo auxiliar da arquidiocese da capital mineira, lembra que “brancos, homens e mulheres, se acharam no direito de subjugar e excluir vontades, emoções, costumes e religiosidades de outras matrizes”.

Padre Mauro Luiz, curador do Muquifu, explica que o retorno dos congados às igrejas é só o primeiro passo para reduzir o abismo religioso criado entre pretos e brancos católicos.

Da esquerda para direita, alguns dos responsáveis pela liberação do congado na igreja católica: bispo Nivaldo Ferreira, historiadora Luciana Araújo, rainha Isabel Casimira, pesquisadora Mariana Ramos, padre Mauro Luiz.
Foto: Divulgação

“Nosso olhar é de esperança, de que, a partir de agora, a gente possa, pelo menos, dialogar com essas outras experiências, que nem sempre nos acolhem”, afirma o padre, que também é pesquisador.

A primeira cerimônia liberada

A retomada do congado em igreja católica aconteceu exatamente no dia da liberação, em 10 de agosto de 2023. A celebração foi realizada na Igreja das Santas Pretas, localizada na Vila Estrela, uma favela de Belo Horizonte.

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A cerimônia teve a presença de congadeiros das periferias da região, que iniciaram a trajetória na porta da igreja, suplicando a abertura para as irmandades. Após a manifestação do reinado, o documento de reparação foi lido pelo bispo Nivaldo Ferreira e distribuído para todas as pessoas presentes na igreja.

A Rainha Isabel Casimira apontou a sucessão de erros irreparáveis, durante um século, sem deixar de comemorar. “Esse documento é uma vitória maravilhosa do nosso povo, que reza cantando, canta rezando, dança rezando”, discursou a rainha, com visível emoção.

A cultura do congado chegou ao Brasil na metade do século 18 com o objetivo de louvar santos protetores, chamados de “santos dos pretos”, como São Benedito, Santa Efigênia e Nossa Senhora do Rosário.

Momento da entrada dos fiéis congadeiros na Igreja das Santas Pretas, ao lado do Muquifu, em Belo Horizonte
Foto: Divulgação

Sobre o Muquifu

O Muquifu - Museu dos Quilombos e Favelas Urbanos, foi criado em novembro de 2012 pelo padre e pesquisador Mauro Luiz. Fica na Vila Estrela, em Belo Horizonte.

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O Museu de território nasce com a proposta de ser comunitário, instrumento de resistência diante do risco iminente de expulsão dos favelados dos centros urbanos.

Pretende promover o reconhecimento e a preservação do patrimônio, das histórias, das memórias e dos bens culturais dos moradores dos quilombos urbanos e favelas de Belo Horizonte.

É o único museu de favela do Estado de Minas Gerais e mantém um acervo com fotografias, objetos, imagens de festas, danças, celebrações, tradições e histórias.

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