Estudantes e professores de escolas na periferia de São Paulo protestam contra o fechamento de turmas do ensino médio, especialmente noturnas, alegando impacto negativo na educação, segurança e acessibilidade, enquanto a Secretaria da Educação nega as alegações e afirma que ajustes são procedimentos habituais.
Gustavo da Silva Almeida, 17 anos, leva duas horas de ônibus e metrô até o trabalho, e outras duas para voltar. Com o fechamento do ensino médio noturno em sua escola, precisará pegar mais dois ônibus para estudar em outra, mais distante. Por isso, ele, colegas e alguns professores se mobilizam — situação que se repete em ao menos sete escolas do extremo sul da capital paulista.
Almeida estuda na Escola Estadual Margarida Maria Alves. Segundo ele, todas as turmas de 2º e 3º anos do ensino médio noturno serão fechadas, além do 1º ano da manhã. Ele calcula que mais de 90 estudantes serão afetados e teme a violência na região para onde pode ser transferido. “Tem muito assalto à noite. A gente sai por volta das onze horas e roubam celular direto.”
Na semana passada, estudantes e professores protestaram contra o fechamento de turmas, sobretudo no período noturno, em frente à Unidade Regional de Ensino Sul 2. Foram recebidos, apresentaram demandas e assinaram uma ata com as reivindicações. Nas escolas, há estudantes que se organizam, produzem cartazes e recolhem assinaturas em abaixo-assinados eletrônicos, como na Escola Estadual José Lins do Rego e na Gil Vicente, no Parque do Lago.
Fechamento de turmas dez anos após ocupações estudantis
As escolas com turmas fechadas do ensino médio noturno e diurno – com previsão de novos cortes até 2027 – ficam no corredor da M´Boi Mirim, “uma das zonas com maior quantidade de estudantes trabalhadores de São Paulo”, afirma uma professora. As escolas estaduais estão no limite da zona sul de São Paulo, na divisa com Itapecerica da Serra.
Kevin Kagis, da União Municipal de Estudantes Secundaristas (UMES), visitou cinco escolas. Segundo ele, na Samuel Morse, das seis salas de ensino médio noturno, restarão quatro. Na Eudoro Villela, duas turmas de 2º ano noturno serão transferidas para outra instituição. Na José Lins do Rego, não haverá ensino noturno no próximo ano. Na Gil Vicente, permanecerão apenas duas das quatro turmas de 2º ano. Na Margarida Alves, as três turmas de 2º ano serão fechadas.
O fechamento de turmas ocorre dez anos após as ocupações de escolas em São Paulo, em 2015, movimento que ganhou repercussão nacional. A Escola Estadual Honório Monteiro, cujas turmas de 1º ano do ensino médio noturno podem ser encerradas, foi ocupada e dirigida pelo grêmio estudantil. Na José Lins do Rego, a polícia tentou retirar os manifestantes que ocuparam a escola por 90 dias.
Estudantes podem parar de estudar com fechamento de turmas
Uma das escolas afetadas é a David Nasser, encravada entre três ocupações. O 1º ano do ensino médio da manhã será extinto; em seguida, sairá o 2º ano e, em 2028, não haverá mais 3º ano. O atendimento a alunos com deficiência intelectual e autismo é referência, com trabalho reconhecido oficialmente e em reportagens da imprensa.
Raquel Ribeiro dos Santos, 15 anos, moradora do Jardim Macedônia, começará o ensino médio no próximo ano e terá que se transferir da David Nasser. “Muitos alunos vão parar de estudar, entrar para o baile ou para o tráfico. O governo vê como solução; nós, como piora. A retirada do ensino médio vai enfraquecer os alunos.”
A preocupação com o próprio futuro e o dos colegas também é de Isabelly Carolinne da Silva, 15 anos. “Muita gente vai parar de estudar de vez. Estou muito chateada, criei laços fortes com colegas e professores”. Segundo uma professora, “aos poucos foram desmontando a escola: tiraram o noturno, a feira de ciências, debates e várias atividades extras. Só restará o fluxo e a praça, único lugar de lazer, mas nenhuma educação”.
O que diz a secretaria de Educação?
Professores e estudantes também são contrários ao fechamento de turmas na Escola Estadual Amélia Kerr Nogueira, José Porphyrio da Paz e Jardim Aracati II. A Unidade Regional de Ensino Sul 2, responsável pelas escolas mencionadas nesta reportagem, nega o fechamento de turmas. “A movimentação de alunos entre as classes da rede estadual é um procedimento habitual, realizado periodicamente ao final de cada bimestre”, afirma nota da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
A nota nega que o anfiteatro e a sala de informática da escola Margarida Alves sejam transformados em salas de aula e afirma que “ao longo de todo o ano letivo, novas turmas podem ser abertas se houver demanda de estudantes que não possam ser alocados nas já existentes, garantindo que nenhum aluno fique sem vaga”.