Chefs têm elevado status da massa fresca com versões autorais para além dos clássicos italianos

Diferentes formatos e novas combinações de sabores são algumas características de massas autorais, que vêm ganhado espaço no cardápio dos restaurantes

2 set 2024 - 17h28
(atualizado às 17h29)

Embora a culinária italiana tenha uma infinidade de receitas de pasta, é possível ultrapassar as fronteiras do clássico e apostar em novas versões para a massa fresca. Por conta de sua versatilidade, diversos chefs têm encarado a massa fresca como uma tela em branco. "Além de ser uma das formas mais universais de entregar sabor, a massa ajuda a transmitir uma mensagem", acredita o chef Luiz Filipe Souza, que comanda o restaurante duas estrelas Michelin Evvai.

Uma das etapas de seu menu-degustação atual (R$ 799, 13 etapas) é o raviolo de galinha d'angola com cogumelos e tucupi. Ele, que apresenta uma cozinha autoral com influências dos imigrantes italianos, se inspirou no pato no tucupi - receita clássica da região norte do País. "A ideia é sempre propor um diálogo entre as cozinhas italiana e os produtos brasileiros", explica o chef.

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De uma forma ou de outra, as massas sempre marcam presença no menu-degustação, do Evvai. Na temporada passada, por exemplo, a pasta foi servida na forma de pré-sobremesa: linguine frio com molho de açafrão e sorbet de cupuaçu. "A massa é um excelente meio para criar coisas novas. É interessante criar algo disruptivo a partir de uma receita popular e afetiva", explica Souza.

Quanto ao quadrucci, massa em formato retangular em que os raviolini vêm todos grudados, é uma brincadeira do chef italiano com a clientela. "Aqui, as pessoas cortam o espaguete, cortam o fettuccine. Por que não deixar elas cortarem o ravioli também?", diverte-se ele. Na primeira versão, Loi a recheava com vitela, mas, na versão atual, a massa abriga um recheio de brasato de fraldinha e é servida com demi-glace, creme de Grana Padano e trufas negras.

Segundo Loi, o seu objetivo sempre foi apresentar a cozinha italiana sob uma nova perspectiva, mas ele faz questão de ressaltar que a criatividade tem limites. "Vale mudar a apresentação, pensar em novas combinações de sabores, mas sem deixar de lado as raízes da cozinha italiana", acredita ele. O chef Pier Paolo Picchi concorda. "Por ser neutra, a massa aceita tudo. Mas é preciso ter coerência", diz o chef do restaurante Picchi.

Menos é mais

Segundo Picchi, um dos segredos para se preparar uma boa massa, seja ela clássica ou autoral, é a qualidade da matéria-prima. "De uns anos para cá, o mercado de pasta fresca evoluiu muito no Brasil. Além de uma nova geração de cozinheiros talentosos, é possível encontrar farinhas importadas e a melhora na qualidade dos ovos disponíveis no mercado", explica o chef.

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Entre as massas do menu do Picchi, restaurante em que o chef apresenta uma cozinha italiana de alto nível, destaque para o espaguete ao vôngole, pancetta e ouriço (R$ 182), "um carbonara do mar", define ele. Outra sugestão é o tortelli de bacalhau, com molho de limão-siciliano, lulinhas grelhadas e ovas de arenque (R$ 174). E o chef apresenta um menu-degustação chamado de tutto pasta, somente com massas artesanais (R$ 487, 4 etapas). "A gente procura fazer massa recheada, longa, um pouco de tudo", e Picchi.

Poucos ingredientes e a melhor qualidade possível. Eis o lema do restaurateur e pastaio Marcio Shihomatsu, do restaurante Shihoma Pasta Fresca e do Shihoma Deli. "Fazer massa tem uma similaridade com a cozinha japonesa, porque envolve poucos ingredientes e sabores simples", diz ele. A influência asiática marca presença no espaguete (R$ 64), que é elaborado com a técnica japonesa temomi, em que os fios são amassados até formar ondulações, que absorvem a manteiga com aliche - a massa é finalizada com pistache.

Ao lado da dupla de chefs Bia Freitas e Joey Lim, Shihomatsu desenvolve, constantemente, receitas de massas que combinam delicadeza, criatividade e produtos locais. Uma das criações mais recentes de Shihomatsu é o capunti, pasta típica do sul da Itália que ele serve com alho serpente (caule verde do próprio alho, de sabor mais suave), quejo grego Capril do Bosque e vagem roxa - em breve estará no menu do Shihoma Deli.

O restaurateur e pastaio Marcio Shihomatsu prepara o capunti, massa típica da Puglia, no sul da Itália
O restaurateur e pastaio Marcio Shihomatsu prepara o capunti, massa típica da Puglia, no sul da Itália
Foto: Leo Martins/Estadao / Estadão

Revolução das massas

A chef Ana Soares, que comanda o pastifício artesanal Mesa III, vê com entusiasmo essa nova revolução das massas. "O mais fascinante é que eu posso entregar uma massa para o Bassoleil (chef francês Emmanuel Bassoleil, do restaurante Skye) e outra para o Rodrigo Oliveira (chef do restaurante de cozinha sertaneja, Mocotó) e vão render receitas incríveis. Mas cada um com seu estilo", diz Ana.

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Ao longo de 28 anos de pastifício, ela acompanhou de perto uma verdadeira revolução no mercado de pasta artesanal. "Os molhos pesados foram saindo de cena para dar lugar a combinações mais leves. E muitos passaram a investir em novos recheios, que vão além da carne e do queijo", conta ela.

Marcio Shihomatsu e o capunti, que ele serve com alho serpente, queijo grego Capril do Bosque e vagem roxa
Foto: Leo Martins/Estadao / Estadão

Uma de suas criações repletas de delicadeza é o cappellacci de alcachofra (R$ 58, 400 g), em que quadradinhos de massa verde e branca são sobrepostas, abrigam um recheio de alcachofra, e tem um formato que lembra a flor comestível. "As duas camadas de massa são para proteger a umidade do recheio. Já a cor verde é um indicativo do que há dentro da massa. Nada é aleatório", explica Ana.

A chef Ana Soares acompanhou de perto a "revolução das massas". Há 28 anos ela comanda o pastifício artesanal Mesa III
Foto: Márcio Fernandes/Estadão / Estadão

Arquiteta de formação, ela gosta de dizer que as suas massas são como folhas de papel com as quais ela desenha. "Adoro passear pelo mercado e ver os ingredientes que estão mais bonitos. O tempo inteiro eu estou pensando em novas combinações", diz a chef do Mesa III.

Evvai

Rua Joaquim Antunes, 108, Pinheiros. 3062-1160. Instagram: @evvai_sp

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Mesa III

Rua Doutor Paulo Vieira, 21, Sumaré. 3868-5500. Instagram: @mesa3_pastificio

Modern Mamma Osteria

Rua Oscar Freire, 497, Jardins. Instagram: @modernmammaosteria

Picchi

Rua Oscar Freire, 533, Jardins. 3065-5560. Instagram: @restaurantepicchi

Shihoma Pasta Fresca

Rua Medeiros de Albuquerque, 431, Vila Madalena. 93819-2333. Instagram: @pastashihoma

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