Cinco anos após Brexit, crise histórica com Washington faz Reino Unido buscar maior cooperação com UE

Nesta terça-feira (30), completam-se cinco anos desde que o Reino Unido assinou com a União Europeia o acordo de cooperação comercial que selou o Brexit. A instabilidade da parceria anglo-americana e a nova postura geopolítica de Donald Trump colocam Londres diante de um dilema: manter o isolamento pós-Brexit ou avançar para uma integração "sob medida" com a União Europeia.

30 dez 2025 - 12h42

Joris Zylberman, da RFI em Paris

O referendo que levou os britânicos a escolher a saída da União Europeia completa dez anos em junho de 2026. No entanto, este ano, a Grã-Bretanha de Keir Starmer pode se aproximar ainda mais dos europeus, enquanto sua "relação especial" (sic) com a América de Trump vacila seriamente. 

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É o fim de uma era para a relação anglo-americana, uma das mais próximas do mundo. Se ela é chamada de "especial", é porque, desde o discurso do primeiro-ministro britânico Winston Churchill sobre a "cortina de ferro", em 1946, a mesma foi considerada um dos pilares da ordem liberal liderada pelo Ocidente.

Londres e Washington haviam assinado, em 1941, a Carta do Atlântico, matriz tanto da Otan quanto da ONU. Mas, 80 anos depois, essa relação já não é tão especial. Donald Trump não se apresenta mais como líder do mundo livre e coloca o Reino Unido em uma posição de constrangimento e apreensão diante da possibilidade de perder seu aliado por excelência. 

Ataques à Venezuela causaram afastamento

Em 12 de novembro passado, pela primeira vez, os britânicos suspenderam parcialmente o sagrado compartilhamento de informações com os americanos para não se tornarem cúmplices de seus ataques mortais contra navios venezuelanos no Caribe, sem base no direito internacional.

Washington, por sua vez, suspendeu seu acordo de parceria tecnológica com Londres em 15 de dezembro. Motivo alegado: os acordos comerciais firmados em maio para isentar os britânicos das sobretaxas alfandegárias de Donald Trump não avançam rápido o suficiente para os americanos. Eles exigem melhor acesso para suas exportações agrícolas ao mercado britânico e, sobretudo, a eliminação das regulamentações inglesas sobre internet e segurança sanitária dos alimentos. 

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De fato, a simbiose anglo-americana em torno dos valores democráticos e de uma ordem mundial regulada já não existe. É um terremoto geoestratégico, segundo ex-diplomatas britânicos. 

Starmer se aproxima de Bruxelas, mas enfrenta riscos 

Tudo isso empurra o primeiro-ministro Keir Starmer a se aproximar da União Europeia, já que a atual geopolítica mundial lhe deixa poucas opções.  

A nova doutrina estratégica de Donald Trump lembra a conferência de Yalta em 1943: o compartilhamento do mundo entre grandes potências segundo suas zonas de influência — hoje, Estados Unidos, Rússia e China.  

Qual é o lugar do Reino Unido nisso tudo? Em Londres, torna-se urgente estreitar laços com Bruxelas diante da ameaça de Putin e da instabilidade de Trump: depender menos das garantias de segurança americanas e apostar mais nos gastos militares europeus. 

Em 2025, Keir Starmer assinou um novo acordo de defesa com a Alemanha, renovou seu tratado com a França e concluiu uma parceria de segurança com a União Europeia, que deve se intensificar até a cúpula UE-Reino Unido em maio próximo. Uma dinâmica que merece ressalvas: Londres ainda não concorda totalmente com Bruxelas sobre sua contribuição aos fundos europeus para estimular os gastos com defesa. Some-se a isso o desafio da extrema direita do Reform UK nas eleições locais britânicas de 7 de maio, que pode enfraquecer a autoridade de um Starmer já muito impopular e complicar os projetos conjuntos com os europeus. 

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Uma reintegração "sob medida"? 

Nesse contexto, o retorno ao status de membro da União Europeia não está na pauta. Mesmo que a maioria dos britânicos hoje considere que o Brexit foi um erro, está fora de questão reabrir um debate tão doloroso. De qualquer forma, não seria fácil reintegrar a UE.

A Grã-Bretanha teria de apresentar um novo pedido de adesão e negociar suas condições, em meio à oposição firme da extrema direita e dos conservadores. Além disso, os britânicos não recuperariam seu desconto orçamentário especial e poderiam ser obrigados a adotar o euro. 

Sem contar que a União Europeia já não é a mesma de dez anos atrás: política externa e de segurança mais ativa, uso mais frequente do voto por maioria e um orçamento maior com empréstimos significativos. Por outro lado, a UE está mais aberta a adesões parciais, "sob medida", como no caso da Suíça. O que poderia ser mais adequado ao Reino Unido do que um Brexit duro — escolha feita por Londres nos últimos dez anos. 

A RFI é uma rádio francesa e agência de notícias que transmite para o mundo todo em francês e em outros 15 idiomas.
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