Fux faz críticas a Moraes, alega incompetência do STF e anima bolsonaristas

Antes mesmo de finalizar a leitura de seu voto, as falas de Fux geraram repercussão entre apoiadores do ex-presidente

10 set 2025 - 13h06
(atualizado às 13h36)
Resumo
Luiz Fux criticou a competência do STF no julgamento do núcleo 1 da trama golpista, defendendo a anulação do processo e dividindo opiniões no tribunal e na política, com repercussão entre apoiadores de Jair Bolsonaro.

Após completar mais de três horas de exposição de argumentos, o ministro Luiz Fux tem dado novo ânimo aos bolsonaristas. Ele, que é o terceiro da Primeira Turma a votar no julgamento do núcleo 1 da trama golpista, iniciou sua exposição, nesta quarta-feira, 10, já defendendo a anulação do julgamento, por considerar que o Supremo Tribunal Federal (STF) não possui competência para julgar o caso.

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Para Fux, ao se tornar ex-presidente, Jair Bolsonaro (PL) deveria ser julgado pela Justiça comum, em tribunais de primeiro grau

"Concluo assim pela incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para o julgamento deste processo, na medida em que os denunciados já haviam perdido os seus cargos. E, como é sabido, em virtude da incompetência absoluta para o julgamento, impõe-se a declaração de nulidade de todos os atos decisórios praticados", disse Fux, ainda no início da exposição de seu voto.

Fux diz que tinha dúvidas durante julgamento de réus do 8/1
Fux diz que tinha dúvidas durante julgamento de réus do 8/1
Foto: Gustavo Moreno/STF

Ele considerou ainda que, mesmo que fosse o caso do processo ser julgado na Corte, o ideal seria que fosse julgado no plenário do STF, não somente pela Primeira Turma. 

Antes mesmo de finalizar a leitura de seu voto, as falas de Fux geraram repercussão entre apoiadores do ex-presidente. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do réu, publicou que "Fux desmonta a narrativa de Moraes, expõe perseguição política e defende a anulação total do processo"

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Um dos advogados de Bolsonaro, Celso Villardi, presente no plenário, comentou que o voto de Fux "lavou a alma".

Próximo das 13h, o ministro pediu uma pausa para o almoço --tendo já exposto ser contrário à alegação de que Bolsonaro e os outros sete réus formavam uma organização criminosa. 

Veja os destaques da fala de Luiz Fux até aqui

Divergência de Fux a Moraes

Ainda na terça-feira, 9, quando o relator do processo, Alexandre de Moraes, iniciava seu voto, Fux o interrompeu, dizendo que iria levar ao plenário da Primeira Turma um debate sobre pontos do processo dos quais divergiu. A promessa foi cumprida nesta quarta.

Sem mencioná-lo diretamente, Fux alfinetou Moraes logo no início da leitura do seu parecer. Ele disse que o magistrado não deve ter função investigativa -- a fala pode ser relacionada com o que Moraes afirmou no dia anterior, quando defendeu que o juiz "não pode ser uma samambaia jurídica" e deve fazer perguntas nos interrogatórios.

Fux diz que juiz deve ter ‘distanciamento’ e ‘humildade para absolver quando houver dúvida’
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Fux afirmou que o papel de produzir provas é do Ministério Público e não dos magistrados. “Como titular da ação penal, [o MP] tem o primeiro ônus de produzir evidências, diretas e indiretas que corroborem e põem firme as hipóteses acusatórias. [...] O juiz, por sua vez, deve acompanhar a ação penal com distanciamento, não apenas por não dispor de competência investigativa ou acusatória, como também, por seu necessário dever de imparcialidade”, declarou. 

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Em outro momento, também sem citar nomes, Fux disse que "o juiz que se faz mais severo que a lei se torna injusto". 

Papel do STF

Em seguida, Fux começou a sua defesa de que o STF não seria o tribunal adequado para o julgamento do ex-presidente. Antes, ele havia feito uma análise do papel da Corte na divisão entre os Três Poderes. 

‘Não compete ao STF realizar um juízo político do que é bom ou ruim’, diz Fux
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"A missão precisa do STF é a guarda da Constituição, fundamento inabalável do Estado Democrático de Direito. Dessa ordem, irradia a promessa de igualdade entre todos os cidadãos perante a lei, sem distinções de identidade, de origem social, de condição econômica ou de posição política", disse. Ele complementou que o Supremo não poderia "realizar um juízo político do que é bom ou ruim, conveniente ou inconveniente, apropriado ou inapropriado". 

Crítica à celeridade e comparação com Mensalão

Fux concordou com o alegado pelos advogados dos acusados de que houve "cerceamento da defesa", em razão do alto número de provas vinculados ao processo e o pouco tempo que tiveram para elaborar seus argumentos. Segundo o ministro, até ele teve dificuldade em construir seu voto, devido à quantidade de denunciados, testemunhas e material probatório

Fux fala em ‘tsunami de dados’ e diz que teve ‘dificuldade’ em analisar provas da investigação
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“Estou há 14 anos no Supremo Tribunal Federal, julguei processos complexos, como por exemplo o Mensalão, nossa decana [Cármen Lúcia] também esteve presente. O processo levou dois anos para receber a denúncia e cinco anos para ser julgado”, disse.

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Ele citou que em fevereiro deste ano, a Polícia Federal havia apreendido 1,2 mil equipamentos eletrônicos dos envolvidos, extraído 255 milhões de mensagens de áudios e vídeos, e os peritos haviam produzido mais de mil laudos. O ministro apelidou a situação de "tsunami de dados". 

Discorda de existência de organização criminosa

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Fux também defendeu que uma reunião para discutir um plano de tentativa de golpe de Estado não caracteriza a formação de uma organização criminosa. "A imputação do crime de organização criminosa exige mais do que a reunião de vários agentes para a prática de delitos, a pluralidade de agentes. A existência de um plano delitivo não tipifica o crime de organização criminosa", disse.

De acordo com o ministro, os crimes associativos em geral, em que se incluem organização criminosa e associação criminosa, exigem para que sua caracterização apresente os requisitos da estabilidade e da permanência. "A consumação do delito de organização criminosa está condicionada efetivamente à existência de estabilidade e durabilidade", defendeu. 

Mais uma vez, Fux relembrou o julgamento do Mensalão para embasar seu argumento. "Como já destaquei, no caso do Mensalão, este tribunal concluiu com maioria que a reunião de vários agentes, voltados à prática reiterada de crimes de corrupção ativa, passiva, lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro nacional, não preencheria a elementar típica concernente à série indeterminada de crimes. Razão pela qual foram os réus absolvidos dessa imputação de formação de quadrilha", afirmou. 

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Nega relação de acusados com 8/1

Passando para as acusações de dano qualificado e de dano ao patrimônio, Fux considerou que os réus não teriam relação com o que ocorreu no 8 de Janeiro, na invasão à sede dos Três Poderes, em Brasília. 

"Não há provas nos autos de que os réus tenham ordenado a destruição. Pelo contrário, há evidências de que, assim que a destruição começou, um dos réus tomou medidas para evitar que o edifício do Supremo fosse invadido pelos vândalos. O réu Anderson Torres assim agiu", acrescentou o ministro ao analisar o crime de dano qualificado. 

Outros réus

Luiz Fux também fez considerações sobre os outros investigados. Sobre Mauro Cid, delator do caso, o ministro acompanhou o relator e votou por aplicar ao ex-ajudante de ordens de Bolsonaro benefícios sugeridos pela Procuradoria Geral da República (PGR). 

"Estou acompanhando a PGR nesse sentido, que sugeriu restituição de bens e valores pertencentes ao colaborador, extensão de todos os benefícios da colaboração aqui assegurados para seu pai, esposa e filhos do colaborador e ação da Polícia Federal, como evidente, visando garantir sua segurança e de seus familiares", defendeu.

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Segundo as condições estabelecidas no acordo de delação, o tenente-coronel Mauro Cid pode ser beneficiado com: 

  • Perdão judicial 
  • Substituição da perda de liberdade por restrição de direito 
  • Redução em até ⅔ da pena privativa de liberdade 

Além disso, Fux falou especificamente sobre o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O ministro votou por suspender parte da Ação Penal (AP) 2668 contra ele. A suspensão defendida pelo ministro se aplica a um dos crimes cometidos antes da diplomação de Ramagem como deputado federal.

"Na decisão impugnada, há uma conclusão de que o crime de organização criminosa ocorreu antes da diplomação do réu. Contudo, considerando que o crime de organização criminosa é, por essência, um delito de natureza permanente, há suficiente razão para que este tema seja revisado. Incluindo-se esse delito de permanência durante o mandato do deputado", disse Fux.

Em despacho anterior, o relator Alexandre de Moraes já havia suspendido a tramitação da acusação dos seguintes crimes contra Ramagem: dano qualificado por violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, com prejuízo considerável à vítima, além de deterioração de bem tombado. As acusações por tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito e organização criminosa continuaram tramitando normalmente no STF. Fux, no entanto, votou para suspender este último crime. 

Fonte: Redação Terra
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