São Silvestre fez empreendedor superar divórcio e trauma de infância: 'Meu pai molhava a chupeta na Coca-Cola'

Marcelo do Rego narrou como a corrida anual paulistana foi o auge na luta contra quadro clínico e traumas do passado

30 dez 2025 - 04h59
Resumo
Marcelo do Rego, empreendedor paulistano, superou depressão e adversidades ao adotar mudanças de hábitos, inspirando-se na Corrida de São Silvestre como um marco de transformação pessoal e celebração de sua resiliência.
Corrida Internacional de São Silvestre ajudou Marcelo do Rego a superar depressão e divórcio com mudança de hábitos
Corrida Internacional de São Silvestre ajudou Marcelo do Rego a superar depressão e divórcio com mudança de hábitos
Foto: Arquivo Pessoal

"Os homens da nossa geração não foram incentivados a falar sobre sentimentos, emoções, a gente sempre acha que vai ser menos quando traz um pouco de vulnerabilidade": a declaração do empreendedor Marcelo do Rego é essencial para entender o contexto que o levou a encontrar, na linha de largada da Corrida Internacional de São Silvestre, a vitória em uma luta contra um quadro clínico de depressão que o acompanhou por anos. 

Para a 100ª edição da corrida de rua mais popular da América do Sul, que percorre 15 quilômetros pelas ruas de São Paulo, o Terra ouviu a história do paulistano de 38 anos, pai dos gêmeos Joaquim e Samuel e autor do livro Do Tarja Preta à São Silvestre, lançado em novembro passado, em que detalhou como a corrida simboliza, para ele, a retomada de um propósito e a celebração pela sobrevivência. 

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"Corri minha primeira São Silvestre, em 2019, sem gostar de correr. Não era a corrida em si, mas sim o que eu tinha que fazer e o único meio de que eu tinha à disposição. Mas a energia e a emoção que tem na corrida é incrível. Não é uma prova que você vai correr pelo índice de velocidade, mas é uma prova que, sem dúvida nenhuma, você vai terminar diferente do que quando você começou", afirma. 

Antes da primeira largada na Avenida Paulista, há seis anos, Marcelo lembra que sua vida estava no 'piloto automático': "É como se eu colocasse a responsabilidade no mundo, no tempo, como se os resultados que eu tinha, fosse na carreira, fosse na vida pessoal, nos relacionamentos, fosse por conta de tal situação ou de tal pessoa."

A decisão por uma mudança de hábito surgiu dois anos antes do paulistano decidir participar da prova anual, em uma véspera de Natal: "Horas antes da ceia, eu olhava para a mesa e me questionava, precisava fazer alguma coisa para sair do sedentarismo, para ter mais energia para brincar com meus filhos". Marcelo, no entanto, não esperava o resultado de uma simples alteração na rotina: tirar a Coca-Cola da dieta. 

"Parecia um desafio para mim. Eu tinha, e ainda tenho uma questão emocional com o refrigerante, meu pai molhava a chupeta na Coca-Cola, então aquilo me trazia alguns temas sobre saúde mental, alguns traumas. Já nas primeiras semanas, percebi que meu corpo começou a mudar, estava menos inchado, mais disposto, e isso impactou em outros comportamentos. Entendi que tinha um padrão, e comecei a aplicar isso em outras áreas da minha vida", conta. 

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Em paralelo à rotina como pai e empreendedor, Marcelo também enfrentava questões ligadas à própria saúde mental e, particularmente, a luta contra a depressão. Ele conta que fazia uso de medicação para o quadro clínico desde a adolescência, com pausas na idade adulta. O remédio também estava presente quando decidiu pela mudança de hábitos. 

"A medicação entrou na minha vida quando eu era jovem, depois de um trauma ligado a uma violência, a um assalto, depois fiquei um tempo sem e voltou em meados de 2017, 2018. O que também me ajudou foi a terapia, que comecei em 2016, depois que descobri que seria pai", diz. 

Nessa seara, Marcelo encontrou na leitura uma maneira de intensificar seu processo de autocura: "Na rotina com meus filhos, eu acordava antes das crianças, fazia uma meditação e ia para minha leitura de desenvolvimento pessoal, que retroalimentava essa questão da mudança de hábito. Às vezes, não conseguia aplicar tudo o que lia na minha rotina, mas podia adaptar. Ter essa consciência fez a diferença".

Corrida Internacional de São Silvestre ajudou Marcelo do Rego a superar depressão e divórcio com mudança de hábitos
Foto: Arquivo Pessoal

'Começou com uma decisão simples, que depois mudou tudo'

Em meio à autodescoberta, Marcelo se inspirou em Hal Elrod, autor de O Milagre da Manhã, para começar a praticar a corrida. A tomada pela decisão aconteceu em março de 2019, nove meses antes do paulistano participar de sua primeira São Silvestre. 

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 "O Hal fala de uma história de superação de um câncer e que a corrida o ajudou a superar o pós e uma falência muito grande. Ele deixava um tênis atrás da porta, que era uma facilidade para ele, no sentido de vestir o tênis e sair. E enquanto eu fazia a leitura, olho para atrás da porta, vejo a sapateira e penso que precisava fazer alguma coisa", relembra. 

A inspiração para participar da prova paulistana veio de um tio já falecido que, segundo ele, sempre chegava em casa com uma medalha no último dia do ano. Depois, a São Silvestre passou a ser uma garantia de uma programação certa para o final do ano, na qual Marcelo colocou a participação como um novo objetivo pessoal. 

"Os 15 quilômetros são um baita desafio para quem não corria, foi uma outra forma de eu me desafiar, de completar um ano de mudanças. O treino exigiu um pouco de mim, cheguei a ter uma lesão em outubro, na coxa, que cheguei a pensar que não ia conseguir completar, mas procurei um médico e rolou", conta. 

Para ele, o momento mais marcante da prova não é a chegada, mas sim a largada: "Me emociono muito quando começa a tocar a música Carruagem de Fogo, você vê a galera passando a faixa para começar a corrida. É como se eu fizesse uma retrospectiva do meu ano, independentemente se eu terminar a prova ou não, eu cumpri minha parte e estou aqui". 

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Marcelo do Rego e os filhos gêmeos, Samuel e Joaquim, em prova de rua entre pais e filhos
Foto: Arquivo Pessoal

De volta ao 'tarja preta' e nova superação

Com exceção das edições de 2020, suspensa pela pandemia, e de 2023, quando estava fora de São Paulo, Marcelo participou de todas os anos da São Silvestre desde sua estreia na prova. E, para além da motivação para iniciar, o paulistano também teve de buscar forças para se reestruturar após viver o fim de um casamento de 11 anos, em 2021. 

"Lembro de um domingo de abril em que chegou um momento em que começaram a vir pensamentos de deixar esse mundo. Eu já tinha mudado um monte de hábitos, mas com essa depressão que estava guardada, com o divórcio, todo mundo sofreu na pandemia, tudo isso virou uma combustão. Quando esses pensamentos vieram, entendi que não podiam mais acontecer, então voltei a pedir ajuda profissional, na terapia". 

O primeiro passo, explica, foi buscar a energia necessária para colocar em prática o que ele já entendia que funcionava para si na mudança de hábitos, além de aceitar que precisava, novamente, de ajuda: "A primeira metade do ano foi sobrevivência, voltar para superfície. Depois, aplicar o que já estava no meu inconsciente". 

"Lembro que, depois da São Silvestre daquele ano, tirei uma foto em que eu saí numa posição de vitória. Comparei com a de 2019, em que estava com um sorriso amarelo e, olhar para aquela foto, que saiu instintivamente, representa muito o que é a São Silvestre para mim, especialmente naquele ano. É um encontro de energia, de pessoas, de almas", revela.  

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Marcelo também busca inspirar os filhos gêmeos com a própria rotina. Orgulhoso, conta que já participou de corrida de pais e filhos por interesse das próprias crianças: "É clichê, mas o exemplo arrasta. Hoje, eles pedem para ir a corrida de rua. Quando corri uma maratona, eles foram assistir e, no último quilômetro, o Joaquim correu comigo, passamos a linha de chegada de mãos dadas". 

Por fim, o paulistano, que também participará da 100ª edição da São Silvestre, também exalta a prova como um patrimônio cultural: "Já corri na Europa, corri maratona, mas a energia aqui é diferente, tem a magia do final do ano. Tem muita história de muita gente que já passou por aquela linha de chegada, então deixo esse incentivo para quem já pensou em correr. No final, pergunto: Qual é a decisão simples que você pode tomar agora, mas pode mudar tudo lá na frente?", finaliza. 

Fonte: Portal Terra
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