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Falar de saúde mental nas quebradas salva vidas

Os problemas decorrentes da saúde mental são agravados para pessoas que vivem em comunidades

20 set 2022 - 05h00
(atualizado às 16h04)
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Saúde mental.
Saúde mental.
Foto: Representação.

No Brasil, muitas pessoas sofrem com problemas de saúde mental, o que pode levar, em muitos os casos, a morte. Neste mês ocorre o “Setembro Amarelo”, uma importante campanha de conscientização na prevenção ao suicídio no pais.

Esses problemas do transtorno mental, principalmente a depressão, vem impactando na saúde da nação. Conforme uma pesquisa da Vigitel 2021, um dos mais amplos inquéritos de saúde do país, em média, 11,3% dos brasileiros relataram ter recebido um diagnóstico médico da doença. A frequência foi maior entre as mulheres (14,7%) em comparação com os homens (7,3%).

“Eu tinha dificuldade até em ir para as consultas com psicólogo e psiquiatra, pois não tinha vontade de sair de casa e nem ver ninguém, emagreci muito. Uma vez ocorreu um episódio no qual eu tomei vários comprimidos, no intuito de me matar, passei muito mal e até fui hospitalizada. Depois disso, a minha família passou a me acolher e me ajudar”, diz Emile Fagundes da Silva Passos, 32 anos, moradora do bairro de Brotas, da cidade de Salvador.

Ela conta que sofreu depressão por sete meses, no ano de 2012. “Foi um conjunto de acontecimentos, desde a minha infância, meu ingresso na faculdade e inclusive o término de noivado. Tudo isso me levou a ter depressão”, revela.

Para Emile Passos, enfrentar a doença foi bem complicado, porque no início do problema a família não reconheceu o que ela estava passando, então ouviu várias vezes que era preguiça por não conseguir sair da cama.

Mesmo com todas as consequências da depressão, como perda de peso, convívio social abalado, ela venceu a doença fazendo psicoterapia, acompanhamento com psiquiatra e tratamento medicamentoso com fluoxetina (antidepressivo).

A jovem, que é Terapeuta Ocupacional, ressalta a importância de falar sobre os problemas mentais. Ela fala que é salutar a campanha Setembro Amarelo, pois é necessário conscientizar as pessoas que doenças mentais, como a depressão, é um problema sério. “As pessoas que estão enfrentando uma depressão, tentativas ou ideações suicidas merece atenção, acolhimento. Em outras palavras, é uma pessoa que está sentindo uma dor muito grande”, enfatiza.

O primeiro passo a fazer quando uma pessoa tem depressão, diz a terapeuta, é oferecer     acolhimento e a escuta, e fazer com que essa pessoa procure ajuda de um profissional especializado.

Emile Passos trabalha com pessoas privados de liberdade com problemas mentais, explica como ajuda as pessoas com transtornos psicológicos.

“A terapia ocupacional visa prevenir e/ou tratar as dificuldades físicas e psicossociais que possam interferir tanto no desenvolvimento, quanto na independência do indivíduo, buscando fazê-lo ter autonomia na vida diária.

A terapeuta fala que o trabalho na área da saúde mental é sempre desafiador, pois os pacientes, em sua maioria, necessitam de atenção, acolhimento e escuta, principalmente os pacientes que não tem um suporte/apoio familiar.

As principais causas dos problemas mentais, de acordo com Emilie Passos, podem surgir a partir de uma combinação de fatores genéticos, psicológicos e sociais. “Ressaltando que muitos transtornos são adquiridos pelo uso de substâncias psicoativas”.

Ela informa que os problemas mentais têm diversas classificações: “Na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, o CID-10, podemos encontrar um leque de classificações de transtornos mentais, sendo eles os mais comuns, a depressão, transtorno afetivo bipolar, e a esquizofrenia que é o transtorno da maioria dos pacientes com o qual trabalho.

A jovem faz questão de mencionar que os problemas com a saúde mental podem levar ao suicídio.  Conforme a Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), com números do Ministério da Saúde, há mais de 10 mil suicídios todos os anos no Brasil.

“Segundo a Biblioteca Virtual da Saúde (BVS), dados no Ministério da Saúde mostram que há registros de cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil. Há também registro que aproximadamente 96,8% dos casos de suicídio estão relacionados aos transtornos mentais, principalmente a depressão, que tem levado muitos a tirarem própria vida”, conta.

Terapeuta Emile Fagundes da Silva Passos.
Terapeuta Emile Fagundes da Silva Passos.
Foto: Arquivo Pessoal.

Ela ainda frisa que a depressão, assim como alguns transtornos mentais, gera uma dor emocional muito intensa, com sentimentos de vazio, abandono, culpa e angústia. Ou seja, muitas pessoas acreditam que o suicídio é a melhor opção para acabar com o sofrimento. “No fundo, ninguém quer tirar própria vida e sim a dor”, assegura.

Os problemas decorrentes da saúde mental, ocorrem em todos os lugares, principalmente em locais em que as pessoas não tem nenhuma estrutura de moradia, como em comunidades carentes, como fala Emile Passos.

“Eu vejo nossa sociedade toda doente, precisando de ajuda nessa questão da saúde mental dos indivíduos. Esse é um problema de saúde pública, contudo não recebe a atenção devida”, enfatiza e completa:

“Não tem como uma pessoa estar com plena saúde mental lidando com o desemprego, falta de saneamento básico, falta de segurança, falta de acesso à educação e à saúde, falta de uma moradia, entre outros, incluindo o racismo. Segundo dados do IBGE, a grande maioria da população que reside em bairros periféricos são negros e mais pobres. Eles sofrem muito”, lamenta.

Psicologia no combate aos problemas mentais

Além de profissionais da terapia ocupacional, têm os psicólogos que ajudam muitas pessoas a combater os transtornos mentais, através da escuta atenta.

“Na atualidade o psicólogo, faz parte de uma equipe multidisciplinar, podendo contribuir com uma escuta atenta, qualificada, ética e cuidadosa. Na minha prática, eu utilizo a arte como uma forma de vinculação, aproximação e cuidado para com a saúde mental”, diz o psicólogo Genilson Costa, 40 anos, que mora no bairro de Vida Nova, Lauro de Freitas, Região Metropolitana de Salvador.

Ele faz parte de dois projetos que atende a população em situação de rua: o projeto “Levanta-te e Anda” e o ponto de Cidadania.

 “O projeto Levanta-te e Anda, é um centro de convivência específico para a população em situação de rua, com um espaço que oferece dignidade, cuidado, carinho e respeito. O objetivo principal é a emancipação do sujeito, como o próprio nome do projeto sugere: levanta-te e Anda”, conta.

Já o segundo projeto, descreve o psicólogo, é o ponto de Cidadania, que faz parte da rede girassóis de rua.

 “O ponto de cidadania é um serviço que atende a população em situação de rua. Serve como uma ponte entre os usuários aos serviços de saúde, socioassistencial, justiça e educação. O projeto é um espaço no qual funciona na rua em um contêiner. O local é oferecido aos moradores para tomar banho, além de ser um espaço para fazer as necessidades fisiológicas. Como sempre digo: é um espaço de dignidade, um espaço do encontro, um espaço da disponibilidade”, esclarece.

Ele salienta que as maiores dificuldades nesse trabalho são as barreiras de acesso aos públicos, pois, muitas vezes, os usuários ficam desassistidos por ser população de rua. “O trabalho com a população em situação de rua é prazeroso, encantador, no entanto a adversidade é o acesso nos serviços, mesmo sendo um direito dos usuários acessar a saúde e a educação”.

Para dar sentido à profissão, o psicólogo pontua que precisava ajudar a construir uma sociedade melhor, por meio do trabalho.

“ Eu acredito e vislumbro em uma sociedade de amor, justa, onde as pessoas possam ter seus direitos garantidos, não só no papel. Trabalhar com a população de rua me fez mais humano, eu nunca mais fui o mesmo depois da experiência. Aprendo todos os dias”, fale alegremente e completa: “trabalho com a população de rua para favorecer o processo de emancipação e garantia de direitos. Em outras palavras, é satisfatório trabalhar com a população de rua, oferecer o mínimo como escuta, uma conversação, é grandioso”.

Os problemas de saúde mental podem desencadear diversos problemas, em razão de existir racismo, preconceitos, individualismo na sociedade. “Na atualidade, a ansiedade decorrente da Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA), é o que vem acometendo uma parcela muito da grande da sociedade”, comenta, Genilson Costa.

O baiano relata que ter um transtorno mental independe da condição social, pois o problema está muito relacionado com a forma de como as pessoas lidam com o seu contexto.

“Na minha perspectiva, o transtorno é inerente a condição social, tem muita gente rica aí financeiramente, porém ‘pobre de espírito’, sem amigos, não consegue dormir, enfim, conheço muitos pobres financeiramente, mas, rico de espírito, feliz, dormem bem”, ressalta.

Durante a pandemia da covid-19, os números de pessoas com problemas mentais cresceram, visto que a depressão e a ansiedade foram doenças que tiveram aumento no momento pandêmico. Além disso, outro fator como, a condição social do indivíduo, acarreta em problemas mentais, ocasionando o suicídio, como conta o psicólogo.

 “Uma sociedade doente, faz pessoas doentes. Na verdade, a pessoa não deseja tirar a própria vida, ela quer ‘matar’ algo interno que está doendo, e muita das vezes não acha acolhimento para poder falar sobre os problemas. Dessa forma sem apoio, muitos desisti da viver”, destaca.

O suicida dá sinais que a qualquer momento pode tirar a própria vida, como diz Genilson Costa: “são muitos os sinais. Geralmente, a pessoa se isola, deixar de fazer as coisas as quais gosta. Deixa de cuidar da higiene, as vezes comenta com alguém próximo a possibilidade de tirar a vida. O  indivíduos entra num processo, como diz o senso comum, fica na ‘deprê’”, evidencia.

Mas será que dá para evitar a depressão? Tem como tratá-la? São perguntas que muitas pessoas fazem. De acordo com Costa, a depressão não é uma doença que depende exclusivamente do sujeito, no sentido de evitar, pois as condições estão muito relacionadas com o contexto que o mesmo está inserido.

 “Para evitar a depressão, as pessoas devem ter acesso a cuidados com a saúde mental. A gente ver hoje nas empresas o estímulo a competitividade, por exemplo: aquele que consegue clientes, é considerado o bom, entretanto que não consegue é o fracassado. Este fracassado pode desencadear um transtorno, se o mesmo não tiver suporte. Uma pessoa acometida com a depressão, pode se cuidar por meio de três pilares: farmacológico, atendimento individual e atividades em grupos”.

Psicólogo Genilson Costa.
Psicólogo Genilson Costa.
Foto: Arquivo Pessoal.

O psicólogo acentua que existem alguns projetos que oferecem atendimentos gratuitos e com preços acessíveis e indica o site ( https://crp03.org.br/) do Conselho Regional de Psicologia da Bahia – 3ª Região -, para encontrar uma lista de atendimentos gratuitos.  Todavia, enfatiza:

“As pessoas precisam dar mais importância para o cuidado com a saúde mental, muita gente paga academias caras para cuidar do corpo, faz churrascos finais de semana, porém, quando se trata em psicólogo, em cuidar da saúde mental, geralmente querem de graça e acham caro. Mais caro é ser acometido com um adoecimento psíquico”, chama atenção.

Ele faz questão de falar da importância em discutir essa temática, e traz como exemplo o Setembro Amarelo   .

“As pessoas não falam, não discutem. O Setembro Amarelo é o momento que a gente senta com vários atores e reflete a temática do suicídio e busca formas de enfrentar. Nas minhas orientações, costumo falar sobre a valorização da vida, - estimular a pessoa a pensar o sentido de viver. O Setembro Amarelo é importante para marcar as discussões, ainda assim precisamos falar sobre essa situação o ano inteiro”.

Ele manda uma mensagem para as pessoas que estão passando por depressão.

“Não pare de se cuidar, costumo falar que nós somos um livro. As coisas que acontecem com a gente, é um capítulo do livro. As outras partes do livro são importantes para escrevermos uma nova história. Se por uma circunstância da vida fomos acometidos por essa doença, devemos sempre estar próximos de pessoas positivas. Você que está sofrendo com a depressão, tenha certeza que só é uma fase, é só uma parte do seu livro, é só um capítulo. Portanto, você pode escrever uma nova história”, conclui.

ANF
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