Upcycling beauty: como resíduos de alimentos e bebidas viram cosméticos sustentáveis
Marca brasileira é pioneira na prática no país; insumos são derivados da casca da maçã, uva e sementes
O cuidado com a pele e a preservação da natureza podem sim estar de mãos dadas. Nas prateleiras, o surgimento de novas marcas que reutilizam resíduos que poderiam ser descartados no meio ambiente se tornou comum no mundo todo, e é chamado de upcycling beauty. Prática que tem favorecido uma relação mais saudável entre a beleza e a sustentabilidade.
No upcycling beauty, resíduos de alimentos --como as sementes, cascas de frutas e bagaços-- são reutilizados como uma importante matéria-prima para a criação de cosméticos, entre eles, sabonetes, shampoos, condicionadores e cremes. Essa produção evita o descarte desnecessário desses componentes.
Esse movimento se fez necessário nos últimos anos, principalmente com impacto da pandemia da covid-19 e das crises climáticas globais. O pensamento no futuro do nosso planeta se torna mais palpável com esses eventos, e isso reflete no comportamento do consumidor, que passa a buscar por produtos e marcas que busquem gerar menor impacto no nosso ecossistema.
É o que aponta uma pesquisa da Beautystreams. Cerca de 73% dos consumidores da geração Z – nascidos entre 1995 e os e 2010– tem como prioridade a sustentabilidade na hora de escolher um produto, mostra o estudo. Desse total, quase 45% estão dispostos a pagar mais por produtos que se enquadrem nesse nicho.
Pioneirismo e inovação
Com o crescimento desse movimento, a tendência é que cada vez mais as empresas de beleza pensem em soluções inovadoras para reaproveitar materiais que poderiam ser descartados. Quem protagoniza o upcycling beauty aqui no Brasil é a Ziel, que surgiu no Rio Grande do Sul no final de 2021, criada pela farmacêutica Ana Koff.
A marca é pioneira neste segmento no país e produz cosméticos de beleza limpa, naturais, veganos, e sem desperdício de água. Entre os produtos, estão shampoo, sabonetes, e condicionadores em barra, além de sais de banho.
A CEO conta que toda a sua carreira foi direcionada para a área da inovação, sempre com um amor muito grande pela área cosmética, que era seu grande objetivo. Mas para levar a marca adiante, ela não deixou de pensar no meio ambiente.
"A ideia da economia circular, e aí entra a beleza circular, é conseguir não só reduzir, reciclar, o que também é muito importante, mas é dar uma nova vida e isso voltar a uso. Isso gera um impacto positivo muito grande", afirma.
Para a produção, a Ziel utiliza insumos que seriam descartados pelas indústrias de sucos e vinhos, como matéria-prima nobre para os produtos. Ela pontua que na casca da uva são encontrados poderosos antioxidantes, que exercem um papel fantástico, não só para a saúde, mas para a pele e o cabelo. Já na semente, há ácidos graxos, como ômega 3, 6, 9, além de vitamina E, que ajudam a hidratação.
"Esse foi o grande pioneirismo da Ziel, essa conexão de aproveitar todo um material que seria descartado como matéria-prima, e dar uma segunda vida para ele. Isso causa um impacto positivo muito grande, não só para o meio ambiente, mas também social, porque são famílias e pequenos produtores que produzem essa uva. Eles têm uma safra por ano, têm um ganho anual, e esse material todo pode ser utilizado na integralidade, não só, para produção de vinho e suco", explica a CEO.
Beleza que faz bem
Hoje, a marca possui cinco ingredientes de circularidade, que vem de 30 produtores orgânicos: a casca da uva; o óleo da semente; a sobra da semente, que vira um pózinho; a casca da maçã; e os cristais de fermentação do vinho, que se formam naturalmente no tonéis.
"Eles têm que raspar as paredes [dos tonéis], e jogam esses cristais no lixo. Muitas acabam lavando com soda, que também gera um impacto ambiental. A gente viu que esse cristal pode ser um grande sal de banho, e a gente fez uma formulação onde ele efervesce, e criou a primeira esfera de banho efervescente do mundo feita a partir do cristal da fermentação", relata.
Esse produto, que deve ser patenteado em breve, já vem com o selo da vinícola em que o cristal foi produzido e da safra do vinho. Assim como os demais, ele também não contém plástico na embalagem, o que reforça o compromisso da marca com o ambiente.
Além disso, a marca como um todo se preocupa em não danificar a barreira cutânea da pele, um escudo protetor natural, que preserva a saúde e evita problemas como alergias e desidratação. Então, as formulações também são livres de alumínio, parabenos e ftalatos, encontrados em cosméticos convencionais
Conscientização
Para Ana, o maior desafio é a educação dos consumidores, no sentido de conscientizar sobre o upcycling e a importância dele. Outro fator é a quebra do preconceito com os produtos naturais, já que a população está habituada aos convencionais.
"Muitas vezes, quando a gente fala que é um produto natural ou que a matéria-prima foi retirada da sobra de uma produção, muitas pessoas têm um certo preconceito, achando que não vai ser tão bom quanto, o que não é verdade", afirma.
Apesar desses desafios, a marca vem crescendo no mercado. A CEO vê o empreendimento com orgulho e planeja o futuro. "A aceitação está sendo incrível, e depois que as pessoas experimentam, tem relatos tão bons do uso, da performance, isso nos enche de gás para continuar. Eu realmente tenho um propósito de revolucionar o mercado para esse caminho. Então, quando a gente acredita nisso, os desafios ficam pequenos e isso se torna muito maior. E vê-la crescendo, dá uma satisfação muito grande, e a sensação de que a gente está no caminho certo", finaliza.