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'Não vamos perseguir o lucro cegamente', diz Cristina Junqueira, do Nubank

Segundo cofundadora, fintech brasileira já gera caixa, mas está focada em oportunidades de crescimento em vez de obter ganhos; meta para 2020 é ampliar base de usuários e lançar novos produtos

7 jan 2020 - 05h10
(atualizado às 15h37)
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Fundado em 2013, com quase 20 milhões de clientes e avaliado em cerca de US$ 10 bilhões, o Nubank pode ser considerada hoje a maior startup brasileira. No mercado, é frequente o questionamento de que a empresa seja capaz de dar lucro em breve. Mas essa não é uma prioridade para a fintech, diz a cofundadora Cristina Junqueira. Em entrevista exclusiva ao Estado, ela afirma que a empresa quer crescer de forma sustentável.

"Se nós parássemos de crescer hoje, sem absorver novos clientes, que consomem investimentos até gerarem receita, já daríamos lucro", afirma a executiva. "Não é algo que vamos perseguir cegamente. Queremos crescer em ritmo sustentável e com oportunidades de eficiência. Se isso vai nos levar a dar lucro, ótimo." No primeiro semestre de 2019, vale lembrar, o Nubank teve prejuízo de R$ 139 milhões.

Além de falar sobre rentabilidade e lucro, Cristina também falou ao Estado sobre os planos do Nubank para 2020 - nesta segunda-feira, 6, a startup anunciou a primeira aquisição de sua história. Trata-se da Plataformatec, consultoria especializada em software e que vai reforçar o time de engenharia da fintech. Segundo a executiva, "nosso maior gargalo" é a contratação de engenheiros - só em 2019, a empresa atraiu cerca de 300 profissionais para sua equipe. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Nubank levou quase sete anos para anunciar sua primeira aquisição. É uma questão de princípios?

Não. Não temos o princípio de não fazer aquisições, mas para nós, aquisição é ferramenta, não é uma estratégia de negócios. Precisa ser um passo para se alcançar um objetivo - e creio que muitas empresas fazem isso de forma errada. Obviamente, adoraríamos fazer mais acordos como esse, mas temos uma barra alta de exigência. Não adianta adquirir uma empresa que tenha produtos ou profissionais que não sejam tão bons quanto os nossos.

E por que adquirir a Plataformatec?

Nós já vínhamos trabalhando com eles há algum tempo. São um time talentoso e que pode nos ajudar com a área de engenharia. Nosso maior gargalo está na área técnica. Tudo que puder agregar em produtividade, temos que testar e avaliar. Começamos a negociar desde setembro, achamos que eles tinham um bom "fit" cultural com o nosso. Além disso, começamos recentemente a montar um time de M&A (fusões e aquisições) aqui no Nubank, buscando empresas que nos ajudassem a acelerar nosso crescimento. Além disso, eles tem um nível de experiência muito bom, o que é um problema no mercado. Outra vantagem é que eles já são um time bastante entrosado, o que ajuda a acelerar a curva de adaptação dos profissionais - no ano passado, contratamos 300 engenheiros. É algo bom, mas exige muito do ponto de vista da organização da empresa.

Além de faltarem bons engenheiros, também falta experiência no mercado?

Sim. Não adianta só contratar 100 desenvolvedores júnior e não dar orientação a eles. É preciso ter profissionais que consigam gerir os times, treinar e avaliar os profissionais. Sem isso, a emenda pode sair pior do que o soneto. E nós usamos uma tecnologia própria, usamos programação funcional aqui dentro do Nubank. É algo ainda não tão difundido, então precisamos ser bastante criativos ao longo da nossa trajetória para conseguir recrutar profissionais. Também tentamos ter mais diversidade no nosso time de engenharia: hoje, 17% da equipe é de mulheres. E claro, não se trata só de contratar, mas também de reter os talentos: não adianta contratar 100 pessoas e perder 80 nos meses seguintes. Em 2020, queremos conseguir contratar mais 300 engenheiros, se for possível. A maior restrição é a qualidade do talento que encontramos.

Há uma cobrança frequente no mercado para que o Nubank dê lucro. Como você vê esse assunto?

Bem, as pessoas podem falar o que quiserem. Entendo que há um grupo que não entende o que fazemos. Ao contrário de startups como o WhatsApp, nós temos um modelo de negócio claro. Se nós parássemos de crescer hoje, sem absorver novos clientes, que consomem investimentos até gerarem receita, já daríamos lucro. Os clientes novos demoram a se pagar e tem muita gente que sequer entende isso, é uma visão míope do mercado. Agora, tem outra visão, que entende que uma empresa com milhões de clientes e sete anos de mercado talvez pudesse ter equilíbrio entre crescimento e rentabilidade. Em 2020, de fato, a gente quer buscar isso. Com as novas contratações, temos recursos para investir em projetos que vão trazer rentabilidade. Mas lucro não é algo que a gente persegue cegamente. Queremos crescer num ritmo sustentável, priorizando geração de valor para o longo prazo.

Que projetos são esses?

Uma das metas para 2020 é lançar um produto de empréstimo pessoal. Está em testes desde 2019. Com mais capacidade de time, vamos acelerar isso. E é um produto que trará rentabilidade rapidamente. Outros são iniciativas de eficiência, com automatização de processos. Além disso, queremos ampliar a base de usuários. Começamos 2019 com 5 milhões de clientes. Esperávamos ter 12 milhões no final do ano. Chegamos a quase 20 milhões. Para 2020, esperamos aumentar essa base em 50%. Mas não basta só isso, precisamos ter certeza de que as pessoas estão usando os produtos, seja a conta ou o cartão.

Como está o cenário de expansão internacional?

A resposta inicial no México é boa, mas ainda é muito cedo. Por enquanto, estamos fazendo testes reduzidos, para ver se as transações passam, se a fatura fecha. Queremos fazer um lançamento maior por lá neste primeiro trimestre. Na Argentina, ainda estamos aguardando autorizações regulatórias.

E como você vê o cenário macroeconômico? Como o momento da economia pode afetar o Nubank?

É uma pergunta que eu sempre ouço. A questão é: nós começamos o Nubank no fundo do poço. A inflação estava alta, a Selic também, o desemprego estava altíssimo e o PIB encolhendo. E ainda assim, crescemos. Adoraríamos que o cenário macro estivesse melhor. É engraçado: nos EUA, as fintechs cresceram num cenário de economia aquecida, mas os investidores estão preocupados agora com o ciclo de recessão. Nós estamos do lado oposto. A economia ainda não decolou, estamos na expectativa de retomar o crescimento. Mas espero que 2020 seja um bom ano, com crescimento econômico e inflação sob controle. E isso ajuda muito: quando o Banco Central não precisa apagar incêndio com a taxa de juros, eles podem fazer avançar agendas importantes. É o caso de open banking e pagamentos instantãneos, que podem nos beneficiar.

Estadão
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