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Redes sociais prometem 'comunidade global', mas resultado é polarização e não união, diz historiador

Niall Ferguson compara o momento atual com a reforma protestante e como o advento da imprensa há 500 anos fez a mensagem de Martinho Lutero 'viralizar' com resultados inesperados e violentos.

13 nov 2017 - 08h00
(atualizado às 15h09)
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Niall Ferguson
Niall Ferguson
Foto: BBC News Brasil

O historiador britânico Niall Ferguson comparou o impacto da mensagem de Martinho Lutero, há 500 anos, com o prometido hoje pelo que chamou de 'sacerdotes do Vale do Silício'. Em ambos os casos, os resultados imediatos não foram tão bons quanto as intenções.

"Na maior parte da história de que temos conhecimento, instituições hierárquicas, como os Estados, dominaram as (chamadas) redes sociais", disse.

"Houve duas eras em que novas tecnologias empoderaram redes (sociais) e enfraqueceram hierarquias. A primeira vez foi 500 anos atrás, quando Martinho Lutero lançou sua campanha pela reforma da Igreja Católica. A segunda é o momento atual", argumentou.

"Se não fosse pela imprensa escrita, Lutero teria sido só mais um herege 'torrado na fogueira'. Mas a imprensa, uma espécie de internet antiga, permitiu que sua mensagem viralizasse pela Europa."

Montagem: Viewsnight
Montagem: Viewsnight
Foto: BBC News Brasil

"Lutero era um utópico. Acreditava que a reforma traria um 'sacerdócio de fiéis'. Em vez disso, a Europa mergulhou em conflitos. Da mesma forma, os sacerdotes do Vale do Silício nos prometeram uma comunidade global. Mas, agora, assim como antes, redes recém-empoderadas levaram à polarização, e não à união. Viraram, também como antes, um meio de transmissão de notícias falsas e visões extremistas", concluiu.

As redes sociais não deram poder às pessoas, pelo contrário, se aproveitam delas, afirma o historiador, defendendo que não devemos deixar às empresas de tecnologia o poder de decidir por nós qual conteúdo bloquear.

"Os sacerdotes do Vale do Silício nos prometeram uma comunidade global, mas as redes sociais levaram à polarização, em vez de à união", afirmou Ferguson no quadro opinativo Viewsnight, do programa da BBC Newsnight. "As redes não nos empoderam - nos usam. Para o Vale do Silício, somos perdedores."

Em referência à pressão de governos e agentes regulatórios para que as redes sociais expliquem seu papel na difusão de notícias falsas durante a eleição americana e para que ajam para bloquear conteúdo extremista, Ferguson opina que devemos reivindicar para nós, usuários, esse poder de vetar conteúdo.

"Hoje, agentes regulatórios exigem que o Vale do Silício retire o discurso de ódio das plataformas. Mas atenção quanto a dar às empresas de tecnologia ainda mais poder. Se é censura o que você quer, não a deixe cargo do Facebook", declarou o historiador.

"Pessoalmente, defendo a liberdade de expressão sob o risco de me sentir ofendido pelo que os outros dizem, (mas) decidindo eu mesmo o que bloquear em vez de deixar isso para 'Cidadão Zuck'."

Reforma protestante

Ferguson, hoje na Universidade Stanford (EUA), foi professor de Harvard e é autor de 14 livros, entre eles A Ascensão do Dinheiro, sobre o mercado financeiro, e A Grande Degeneração, com críticas à sociedade ocidental.

Representantes de Facebook, Google e Twitter em audiência no Congresso dos EUA a respeito da difusão de notícias falsas na eleição americana
Representantes de Facebook, Google e Twitter em audiência no Congresso dos EUA a respeito da difusão de notícias falsas na eleição americana
Foto: BBC News Brasil

Em manifestações prévias, Ferguson - tido como ideologicamente mais alinhado à direita - já havia mencionado seu ceticismo com as revoluções tecnológicas originadas no Vale do Silício.

"Ofereço-lhes uma lição simples de história: informação em maior volume e velocidade não é algo bom por si só. Conhecimento nem sempre é a cura. E efeitos em rede nem sempre são positivos", argumentou em artigo de 2012, chamado Não acredite na onda tecno-utópica.

"Houve grande progresso tecnológico nos anos 1930. Mas isso não pôs fim à Grande Depressão. Foi necessária uma guerra mundial (para isso). Será que algo tão horrível poderia acontecer nos nossos tempos? Não descarte essa possibilidade. Lembremo-nos da sequência de eventos: depressão econômica, crise de democracia, caminho à guerra."

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