PUBLICIDADE

Óleo em praias do Nordeste: Por que manchas surgiram de novo no litoral?

Vestígios podem fazer longo percurso até as praias do Brasil, impulsionados pela corrente Sul Equatorial

5 set 2022 - 15h10
Compartilhar
Exibir comentários

RECIFE - Nas últimas semanas, cidades do Nordeste voltaram a registrar vestígios de óleo nas praias e temem reviver um pesadelo de três anos atrás, quando um rastro do poluente foi visto em vários pontos do litoral brasileiro. Só no Estado de Pernambuco, mais de 400 quilos de material foram achados desde 25 de agosto. Mas por que essas manchas reapareceram? Esse tipo de problema será mais frequente?

Fragmentos de óleo voltaram a ser vistos em praias do Nordeste brasileiro; ainda não está claro que os vestígios são os mesmos de um derramamento que ocorreu em 2019 Foto: Semas/Divulgação

Segundo especialistas, é provável que registros desse tipo ocorram mais vezes. Esses vestígios de óleo podem fazer longo percurso até as praias do Brasil e a principal razão para isso é a corrente Sul Equatorial, predominante no Atlântico Sul, região onde há intensa rota de navios petroleiros, tornando alta a recorrência desse tipo de fenômeno. Sua latitude coincide com o litoral nordestino, bifurcando-se ao norte, próximo ao Ceará, e no sul da Bahia.

"Se pegarmos o centro dessa corrente Equatorial, ela está mais ou menos entre a latitude da Paraíba, de Pernambuco e Alagoas, mas a depender da situação, vai um pouco mais ao norte ou ao sul", explica Clemente Coelho Jr., professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco, e responsável por alertar às autoridades pernambucanas sobre o surgimento do material no último dia 25. Também foram notificadas manchas em Alagoas, Bahia, Paraíba e Sergipe.

Segundo ele, a corrente Sul Equatorial, que sai do costa da África, espalha esse material. Esse poluente de agora pode ser o mesmo do vazamento de 2019 - em 2020 e no ano passado, fragmentos daquele período ressurgiram em algumas praias - ou de um novo vazamento. Só a análise das amostras, que já estão sendo feitas pela Marinha e pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), poderá determinar a origem do óleo.

Jesser Fidelis de Souza Filho, chefe do Departamento de Oceanografia da UFPE, para onde foram mandadas para análise as amostras colhidas em Pernambuco, diz que há diferenças visíveis em relação ao formato do óleo. Em 2019, o material chegou como um tapete de piche, com odor muito forte; agora chega em forma de pequenas bolas, sem cheiro intenso.

"Outro fator interessante é a presença, agora, de organismos incrustados no óleo, o que também indica que esse material não estava perto da costa. Precisaria estar flutuante há meses para ter esses organismos", explica. "Trabalhamos com várias hipóteses, inclusive a de que, por ter aparecido no fim de agosto, mesma época de 2019, esse material poderia ter estado no fundo e, agora, com os ventos, a corrente, ter voltado à superfície", detalha.

Pesquisadores avaliam que novos vestígios têm características diferentes dos encontrados em 2019 Foto: Semas/Divulgação

"O melhor cenário seria que este fosse o mesmo óleo de 2019, pois um diferente significaria outro tipo de derramamento e novos desdobramentos", diz ele, que conduz pesquisas sobre os efeitos do derramamento de óleo três anos atrás. "Nos estudos conduzidos em Itamaracá, Suape e Carneiros, em Pernambuco, percebemos que houve alteração no padrão de alimentação dos caranguejos, que estão buscando outros tipos de comida, fugindo da contaminação, deformações no sistema reprodutor de alguns aratus, o que pode gerar a incapacidade daquele grupo de reproduzir, entre outros, como deformações físicas nos caranguejos", alerta Jesser Fidelis.

Até o momento, o Estado com a maior incidência dessas bolotas de óleo é Pernambuco, que já recolheu 400 kg de material em 12 municípios. Lá, foi criado um comitê para monitorar o problema, composto pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, a Agência Estadual de Meio Ambiente, o Ibama e Capitania dos Portos, com o apoio das prefeituras das cidades litorâneas.

O Estado com a maior incidência dos vestígios de óleo é Pernambuco Foto: Semas/Divulgação

Na Paraíba, foram encontrados em João Pessoa (praias de Caribessa e Jacarapé), Conde (Praia do Amor, Carapibus, Coqueirinho, Tambaba e Grau), Pitimbu (Praia Bela, Praia Azul e Guarita, Pontinha e Acaú) e Cabedelo (Praia de Intermares, Ponta de Campina e Praia do Poço), mas as autoridades estaduais não informaram o quantitativo retirado dos locais.

Em Alagoas, segundo o Gerenciamento Costeiro, do Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas, até agora foram constatados alguns fragmentos de óleo, na praia do Francês, no município de Marechal Deodoro, e um tambor em Coruripe, além de alguns pequenos fragmentos em Maceió, na praia de Ipioca. Em nota, o Estado informou "que está em contato com o grupo de integração, que abarca todos os estados da zona costeira, com o objetivo de monitorar essas áreas".

Sobre a situação em Sergipe, a Administração Estadual do Meio Ambiente (Adema) informou, em nota, que desde os surgimentos das manchas de óleo no litoral nordestino, em setembro de 2019, vem monitorando os 163 km de litoral sergipano. Desde 30 de agosto, foram encontrados vestígios de óleo em pequenas quantidades nas praias de Abais, Dunas e Saco, no município de Estância, e Caueira e Coqueirinho em Itaporanga D'Ajuda, todas no litoral sul.

Informou ainda que não há comprometimento da balneabilidade e que todas as praias estão propícias para banho - o relato é semelhante ao de governos de outros Estados que reportaram o aparecimento do óleo. O que todas recomendam é que se evite o contato com o óleo ou a inalação.

Na Bahia, segundo informações da Marinha, foram achados fragmentos nas praias de Arembepe, Itacimirim, Stella Maris e Piatã, no Litoral Norte, em praias da Ilha de Itaparica e, no Litoral Sul, em Arraial da Ajuda, Cumuruxatiba, Caravelas e nas praias ao norte de Porto Seguro. Conforme a Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpurb), também foram identificados materiais nas praias do Flamengo, Farol de Itapuã e Jaguaribe, com um total de 2,5 kg retirados em Salvador.

A Limpurb ainda ressaltou que, para a retirada do material, as equipes seguem o protocolo determinado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O resíduo é coletado, depois colocado em recipiente plástico para armazenamento temporário, com impermeabilização de solo, e posterior encaminhamento para unidade de análise e tratamento do material.

Procurado, o Ibama afirmou que no início da semana "realizou sobrevoo de análise da costa e do alto mar nessa segunda (29) e terça-feira (30) e não encontrou vestígios de manchas de óleo no litoral nordestino, que seguirá em monitoramento nos próximos dias."

A Marinha informou que, em colaboração com os órgãos ambientais federais e estaduais, as amostras colhidas foram encaminhadas para o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM), no Rio. Estes laudos serão complementares a outros que estão em análise/produção nos demais Órgãos. A previsão é de que, os laudos sejam emitidos nas próximas semanas.

Estadão
Compartilhar
TAGS
Publicidade
Publicidade