Ofensiva dos EUA contra petroleiros mira ponto vital do regime de Maduro
Captura de petroleiro na costa da Venezuela sinaliza abertura de nova frente na ofensiva dos EUA para minar regime de Maduro: devastar receitas do país altamente dependente de exportação de petróleo.Um dia após capturar o petroleiro Skipper na costa da Venezuela, o governo Trumpanunciou que o navio está sendo levado para um porto nos Estados Unidos. A embarcação possui uma carga de cerca de 1,9 milhão de barris de petróleo, que deverá ser confiscada pelas autoridades americanas.
"O navio irá para um porto americano e os Estados Unidos têm a intenção de apreender o petróleo. Existe, porém, um processo legal para a apreensão desse petróleo, e esse processo legal será seguido", declarou Karoline Leavitt, a porta-voz da Casa Branca, nessa quinta (11/12).
A captura do petroleiro, que ocorreu na última quarta (10/12), é o mais novo capítulo da crescente pressão feita pelo presidente Donald Trump sobre o líder venezuelano, Nicolás Maduro e arrisca sabotar a última fonte confiável de receita do regime chavista: a exportação de petróleo.
Nos últimos meses, o governo dos EUA efetuou cerca de 20 ataques militares a embarcações no Pacífico e no Caribe, que resultaram na morte de mais de 80 pessoas que, para organizações de direitos humanos, foram ilegais. Washington afirma que as visam combater o narcotráfico, ao mesmo tempo que acusa o ditador venezuelano de ser o chefe da organização criminosa Cartel de los Soles.
A nova frente de Trump na ofensiva contra Maduro, no entanto, parece ter se voltado principalmente para a principal fonte econômica da Venezuela. De acordo com informações da agência de notícias Reuters, os Estados Unidos planejam, em breve, novas capturas de embarcações que transportam petróleo venezuelano.
Skipper foi o primeiro petroleiro apreendido pelos EUA, mesmo que a matéria-prima produzida no país sul-americano seja alvo de sanções americanas desde 2017. A embarcação navegava com uma bandeira falsa da Guiana. O país, vizinho da Venezuela, deu respaldo à operação de Trump no Caribe e vem travando uma disputa com Caracas por Essequibo, região no território guianense e rica em reservas de petróleo e gás.
A porta-voz de Trump se negou a comentar operações futuras, mas disse que os EUA vão seguir executando as políticas de sanções do presidente.
"Não vamos ficar parados vendo navios sancionados navegando pelos mares com petróleo clandestino, cujos lucros irão alimentar o narcoterrorismo de regimes desonestos e ilegítimos ao redor do mundo", disse Leavitt.
Rotas clandestinas conectam Venezuela, Irã e Rússia
A operação de captura do Skipper ocorreu por ordem de um juiz americano. O navio transportava barris venezuelanos. No entanto, tinha recebido sanções dos Estados Unidos em 2022, quando ainda era conhecido com MT/Adisa, sob a acusação de que fazia parte de uma rede clandestina que traficava petróleo para a Guarda Revolucionária do Irã e o para o Hezbollah.
Os dados de localização mostravam que o Skipper navegava perto da costa da Guiana. Subitamente, o petroleiro começou a traçar um deslocamento em zigue-zague, uma manobra fisicamente impossível. Na realidade, era uma tentava de ocultar o local exato onde se encontrava, já que o navio levava uma carga ilícita no valor dezenas de milhões de dólares.
Foi quando helicópteros do Pentágono surgiram sobrevoando o navio. Soldados americanos desceram de rapel na embarcação - não no local onde os localizadores mostravam o Skipper, mas num ponto 600 quilômetros a noroeste, próximo à costa venezuelana.
Maduro reagiu. O líder de Caracas alegou que a operação de Washington tinha como objetivo "roubar" o petróleo venezuelano e afirmou que a tripulação do navio estava "desaparecida".
Leavitt, por sua vez, disse que o petroleiro está passando por um "procedimento de confisco" e que uma equipe de investigação americana está a bordo do navio, interrogando a tripulação.
Dados da Windward, empresa de inteligência marítima que rastreia embarcações como o Skipper, indicam que o navio teria transportado, nos últimos meses, petróleo iraniano para a China. Há também indícios de que o petroleiro estaria recebendo carga ilícita da Rússia. Segundo documentos vazados pela estatal petrolífera venezuelana PDVSA à Associated Press, pelo menos metade da carga do Skipper tinha Cuba como destino.
Anda de acordo com a Windward, há, perto da Venezuela, cerca de 30 petroleiros sancionados pelos Estados Unidos e que podem ser alvo de uma apreensão americana por ter bandeiras falsas, o que implica numa infração das leis marítimas internacionais.
Esses petroleiros clandestinos ocultam suas localizações manipulando o sistema de identificação automática (um recurso de segurança obrigatório destinado a ajudar a evitar colisões) para ficarem totalmente ocultos ou parecer estarem navegando a quilômetros de distância. Além das bandeiras falsas, eles também costumam utilizar registros falsos de outras embarcações.
"Existem centenas de petroleiros sem bandeira e apátridas que têm sido uma fonte vital de receitas para regimes como o de Maduro, o Irã e o Kremlin", afirmou Michelle Weise Bockmann, analista sênior da Windward, à agência Associated Press.
"Eles não podem mais operar livremente," complementou Weise.
Fonte de receita para Maduro
O mercado clandestino de petróleo tem crescido desde 2022, quando a Rússia sofreu embargos pela invasão da Ucrânia. Maduro, por sua vez, vem tendo sucesso em utilizar essa rede para dar saída ao petróleo venezuelano.
Segundo dados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opec), a Venezuela aumentou a produção de petróleo em 25% nos últimos dois anos. A commodity responde por 15% do Produto Interno Bruto (PIB) e 80% das exportações totais do país - a China é o destino de 80% do petróleo exportado por Caracas.
Por causa disso, o cerco de Trump aos petroleiros clandestinos pode gerar repercussões econômicas que impactariam a própria manutenção de Maduro no poder. A captura física de um navio clandestino é diferente de sanções e marca uma mudança no jogo, que já implica num aumento do custo de se fazer negócios com a Venezuela.
A operação no Skipper fez com que ao menos uma transportadora suspendesse as viagens de três navios recém-carregados, num total de quase 6 milhões de barris do petróleo de alta densidade do tipo Merey, o principal produto de exportação da Venezuela.
"Os barris haviam acabado de ser carregados e estavam prestes a partir para a Ásia. Agora, as viagens foram canceladas e os petroleiros estão esperando na costa venezuelana, pois é mais seguro", disse um executivo envolvido na comercialização e transporte de petróleo venezuelano à Reuters.
Logo, o cerco americano deverá impactar no preço do petróleo venezuelano clandestino, já que menos compradores estarão dispostos a correr o risco de ter uma carga apreendida.
Por outro lado, os perigos do investimento na mercadoria clandestina podem acabar pressionando os preços internacionais de petróleo, o que pode gerar aumentos no custo de energia e combustíveis e acabar sendo um problema para o próprio Trump nos Estados Unidos.
Mas a saída pode estar na própria Venezuela. Uma possível queda de Maduro, com a ascensão de um eventual governo apoiado pelos Estados Unidos em Caracas abririam o mercado local para Trump. Atualmente, apenas uma empresa energética norte-americana, a Chevron, opera no setor petrolífero da Venezuela, sem ser afetada pela política anti-Maduro de Trump.
fcl (AP, EFE, Reuters, ots)