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Coronavírus

Socorro a times de futebol une 'rivais' no Congresso

Impacto da crise do coronavírus sobre o esporte alinha projetos antagônicos da Câmara e do Senado

18 mai 2020 - 05h12
(atualizado às 08h17)
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A crise do novo coronavírus, que piorou a grave situação financeira dos times de futebol, levou ao alinhamento dos dois principais projetos que tramitam no Congresso sobre a atividade esportiva e os clubes.

Plenário da Câmara dos Deputados
07/08/2019
REUTERS/Adriano Machado
Plenário da Câmara dos Deputados 07/08/2019 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

A convergência se dá entre o deputado carioca Pedro Paulo - que propôs um projeto em nome do presidente da Câmara, Rodrigo Maia - e o senador Rodrigo Pacheco. Ambos são autores de propostas antagônicas sobre como salvar o esporte. Agora, porém, eles discutem a possibilidade de um relatar o projeto do outro.

A iniciativa de Pedro Paulo foi aprovada pela Câmara em novembro e enviada ao Senado, onde tramita a proposta de Pacheco. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, sinalizou aos envolvidos que, como os dois parlamentares em questão são do seu partido, o DEM, o tema só será pautado depois de haver entendimento entre eles. Os detalhes vêm sendo acertados nos últimos dias. Em conversa longa na quarta-feira passada, Pedro Paulo e Pacheco discutiram como se daria a fusão das duas propostas em um eventual relatório no Senado.

"Existe sim convergência nos dois projetos", explicou Pacheco ao Estadão. "Eles propõem a modernização do futebol e a busca do investidor. No entanto, tratam de maneiras distintas as questões. E possível que sejam apensados para que o debate seja em conjunto", acrescentou.

Questionado se Pacheco pode relatar o seu projeto no Senado, Pedro Paulo respondeu: "Isso que a gente discutiu, (a possibilidade) de ele construir uma convergência a partir desse projeto e de incorporar algumas soluções desse período de calamidade, mas manter toda a estruturação do projeto sobre a mudança no formato organizacional (dos times)".

Antes mesmo da pandemia do novo coronavírus, as dívidas dos times bateram cerca de R$ 7 bilhões - a maior parte é tributária e algo entre 30% e 40% é referente a dívidas comerciais e trabalhistas. Com a crise da covid-19, o Ministério da Economia publicou, na terça-feira passada, uma portaria que prorroga o pagamento de parcelas tributárias de maio, junho e julho dos clubes que aderiram ao Programa de Refinanciamento Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), de 2015.

A proposta de Pedro Paulo prevê a criação do clube-empresa, já que hoje os times são associações sem fins lucrativos. Junto com isso, o deputado propõe a possibilidade de os times pedirem recuperação judicial desde já - sem esperar o prazo de dois anos a partir da constituição da empresa -, a criação de um novo programa de parcelamento de dívidas tributárias parecido com o Profut e a centralização das execuções de ações trabalhistas de cada time, para que o mesmo o juiz administre os recursos disponíveis do clube.

Já o projeto do senador Pacheco, além de permitir que clubes se tornem empresas, prevê um novo tipo societário: a sociedade anônima do futebol. Sua adoção acarretaria no cumprimento de um rol de padrões de compliance, visando a captação de recursos no mercado. Também está prevista a criação do "Debenturefut", um programa para tratar da emissão de títulos de dívida por parte dos times, para captar dinheiro. A proposta de autoria de Pacheco contou com a orientação do advogado Rodrigo Monteiro de Castro, um dos autores do estudo de viabilidade encomendado pelo São Paulo Futebol Clube para virar uma sociedade anônima.

Brigas

Até recentemente, os apoiadores de um projeto eram contrários ao outro: opositores da iniciativa de Pedro Paulo alegavam nos jornais que ela seria um instrumento de calote para os cartolas, enquanto críticos à proposta de Pacheco argumentavam que não é necessário criar um tipo societário específico para a atividade do futebol.

No final do ano passado, houve, entre os times, quem deixou de apoiar a proposta vinda da Câmara. Em outubro, um mês antes de os deputados aprovarem a proposta, a Comissão Nacional de Clubes da CBF emitiu nota demandando "um período maior de debates, e reflexões que tragam legitimidade e segurança jurídica". O texto afirmava que "na avaliação dos clubes, por ora, a iniciativa não está madura a ponto de ser colocada em votação imediata".

Na época, houve acusações na imprensa de que a urgência na tramitação serviria para beneficiar o Botafogo, time do coração de Rodrigo Maia e que encabeça a lista dos mais endividados, com pendências que somavam R$ 730 milhões, de acordo com números de 2018 consolidados pela consultoria Ernst & Young. Maia chegou a ironizar, em outubro, as críticas da comissão de clubes. "Fico feliz que o Vasco vive um ótimo momento financeiro e não tem mais dependência da CBF. Ótima notícia", afirmou ao jornal Folha de S. Paulo, em referência presidente da comissão, Alexandre Campello, que também é presidente do Vasco.

Efeito

No entanto, o abalo que os times sofreram diante da covid-19 fez com que ambos os lados passarem a ver as iniciativas como complementares. "O projeto do deputado Pedro Paulo prevê mecanismos de recuperação, o que se tornou essencial nesse momento de uma crise econômica sem precedentes. Por isso, pode ser que a união dos projetos, tratando de possibilidades diferentes, seja um caminho", explicou Pacheco.

Opções

"Tem uma frase que é meio batida, mas é que a crise gera oportunidades. O real está muito desvalorizado, os clubes aumentaram muito as suas dívidas e isso significa que o ativo que é o clube de futebol vai ficar mais barato, não necessariamente para empresários brasileiros, mas para empresários de outros lugares do mundo", disse Pedro Paulo, sobre a captação de recursos no mercado. "Esse projeto pode ajudar a acelerar o processo de transformação dos clubes. Aquilo que a gente imaginava que iria gerar críticas antes hoje já é, para muitos, um consenso de que é necessário", acrescentou.

Para viabilizar a convergência, a proposta unificada dos dois parlamentares deverá prever a criação da sociedade anônima do futebol, mas sua adoção pelos times não será obrigatória: os clubes poderão optar entre ela e outros tipos societários que já existem, como a sociedade anônima ou a limitada. Eles também poderão escolher permanecer na condição de associações sem fins lucrativos, se assim preferirem.

Estadão
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