Bets mergulham na vaquejada e se misturam a políticos em leilões de cavalos milionários
Casas de apostas entraram com força no mundo dos cavalos, com patrocínio a competições e também com ofertas em leilões de animais que chegam a mais de R$ 8 milhões
BRASÍLIA - As bets, que movimentam um mercado bilionário no Brasil, entraram forte, em 2023, em uma modalidade que mistura tradição popular do Nordeste, negociações milionárias de cavalos de raça, políticos poderosos e empresários investigados. Neste ano, as casas de apostas "descobriram" a vaquejada.
Em um movimento inédito, os sites de apostas passaram a movimentar competições e leilões de animais, espaços de poder e prestígio frequentados por lideranças políticas de Brasília, como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, e por personalidades como o cantor Wesley Safadão, um dos maiores agitadores do setor.
O mergulho mais profundo das bets no mundo da vaquejada ocorreu no segundo semestre, quando surgiram competições patrocinadas, arena e equipes próprias. Em paralelo, as casas de apostas lidavam com fatores cruciais aos negócios: a pressão de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) aberta na Câmara e a definição de uma regulamentação do setor pelo governo federal. O Senado deve votar nesta semana um projeto que cria regras e impostos.
Lira e bets se encontram em leilão e compram 'filhos' de cavalo raro de Wesley SafadãoNo mesmo leilão, Edelson Gomes da Silva, um dos sócios da Bet Nacional, comprou um cavalo por R$ 800 mil e outro por R$ 200 mil. "Iniciando suas compras, ele, que é novo investidor na raça Quarto de Milha, nosso amigo Edelson, da Bet Nacional. Vai pra Passira, no Pernambuco", anunciou o locutor.
Edelson é ex-vice-prefeito da cidade pelo PSB. Na eleição de 2012, declarou um patrimônio de R$ 272 mil. Atualmente, filiado ao PP, foi assessor parlamentar, entre 2018 e 2019, da deputada estadual Roberta Arraes (PP). Em agosto de 2021, abriu a Egomes Suporte Online, empresa de "suporte técnico, manutenção e outros serviços de tecnologia da informação". A firma está registrada em um endereço residencial do Recife.
O haras de Edelson ainda não saiu do papel. Segundo ele, as obras, dentro da fazenda da família, deverão ser concluídas em seis meses. Mesmo assim, garante que os animais que arrematou em leilões já estão sendo trabalhados para reprodução. À reportagem, ele afirmou que a criação de Quarto de Milha é uma nova paixão, mas um negócio individual e familiar, sem relação com a Bet Nacional.
"A empresa não investe em nada de Quarto de Milha. Não tem interesse no momento. Foi uma compra minha, pessoa física, não tem nada a ver com a empresa. Absolutamente nada", afirmou.
Sócio de Safadão é condenado por desviar verba do Fundeb
Em um mundo em que a criação de cavalos e o gosto pela vaquejada vêm de gerações, o caso de Ariel Almeida chama a atenção. Chegado no segmento do Quarto de Milha há pouco mais de um ano, o empresário de Manaus (AM) começou grande: tem disputado lance a lance alguns dos principais animais à venda em leilões e arrematou o cavalo mais caro já negociado no Brasil. Dias depois da compra que o notabilizou, foi condenado por desvio de verbas federais da educação.
O empresário pagou a Wesley Safadão R$ 4,2 milhões por metade dos direitos sobre a égua Eternal Offling Peju. A cifra fez do animal o mais caro da raça. Segundo Almeida, foi um passo ambicioso para uma mudança de ramo. De criador de bovinos, ovinos e caprinos, ele pretende se tornar uma referência na região Norte na criação de cavalos Quarto de Milha.
Almeida tem uma teoria sobre o forte crescimento da vaquejada em 2023. Para ele, o pós-pandemia levou muita gente a gastar dinheiro com gostos pessoais. "Depois dessa grande tragédia que vivemos, a pandemia, muita gente começou a fazer mais o que gosta. As pessoas mais conservadoras começaram a entender para que serve o dinheiro, que não adianta deixar parado", disse.
O empresário não esconde, porém, que seu objetivo maior é o lucro. Ele afirma que a criação demanda estrutura menor que a dos pastos e ainda será mais rentável. Ele pretende criar um grande centro genético no Amazonas especializado na reprodução dos animais. "Com uma estrutura compacta, enxuta, você consegue ter talvez um faturamento maior que a fazenda, onde gira muito mais área, muito mais mão de obra, muito mais esforço", disse.
Lira compra cavalo de R$ 200 mil em leilão de Wesley Safadão com égua de R$ 8,4 milhõesSobre a condenação, Ariel Almeida disse que "foi uma sentença errada, mas o advogado já recorreu para que seja feito o reparo".
Os responsáveis pela Pixbet não foram localizados. O Estadão tentou contato com Wesley Safadão por meio de sua produtora e de seu advogado. Não houve retorno. Os representantes da MarjoSports também não se manifestaram. Arthur Lira não comentou.
O Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), do MP-PE, informou que recorreu da decisão de um colegiado de juízes que rejeitou a acusação contra a MarjoSports em agosto. A Promotoria apresentou o recurso em 11 de setembro, "ainda pendente de análise pelo Judiciário". "Após análise judicial, serão intimados os recorridos e posteriormente o feito será remetido ao Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE)", registrou o Gaeco.