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Famílias desistem de velar mortos do massacre por mau cheiro

Em vez da cerimônia, caixões saem direto do IML para algum cemitério da cidade

1 ago 2019 - 09h10
(atualizado às 09h17)
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Foto: Daniel Teixeira / Estadão

Por causa do mau cheiro causado pelo estado de decomposição dos corpos, familiares têm desistido de velar vítimas do massacre no presídio de Altamira, no interior do Pará. Em vez da cerimônia, os caixões saem direto do Instituto Médico Legal (IML) para algum cemitério da cidade.

Foi o caso de Anderson dos Santos Oliveira, de 26 anos, um dos ao menos mortos no ataque promovido pela facção Comando Classe A (CCA) contra rivais do Comando Vermelho (CV). Assassinado na manhã de segunda-feira, 29, ele foi enterrado mais de 48 horas depois. "O corpo já está em decomposição", afirmou a esposa Sirleide Cardoso Pereira, de 41.

Um velório coletivo das vítimas do massacre chegou a ser planejado na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, mas apenas dois caixões chegaram lá - ainda assim, era possível sentir o odor através da madeira. "A funerária informou que as outras famílias desistiram por causa da situação dos corpos, que demoraram mais para sair", disse uma recepcionista.

Até a noite de quarta-feira, 27 corpos haviam sido liberados do IML. Outros 31, entretanto, só devem ser entregues às famílias após identificação por DNA. Desde o massacre, parentes se reuniram na frente do local para tentar reconhecer as vitimas e passaram também a reclamar da demora de atendimento.

O IML de Altamira conta com seis médicos legistas no seu quadro fixo de profissionais. Para realizar necropsias, foi preciso receber ajuda de agentes de Belém.

Já a câmara fria só é apropriada para receber até seis cadáveres - número bem inferior à demanda do massacre. Mesmo com um caminhão frigorífico, o tempo fez o mau cheiro dos corpos tomar a rua do IML e obrigou os presentes a recorrer a máscaras de proteção.

Entre os que tiveram velório está Efrain Mota Ferreira, de 22 anos, um dos primeiros a ser liberado do IML. O caixão passou a noite na Paróquia e foi sepultado no início da manhã de quarta, no Cemitério São Sebastião, onde 30 covas foram cavadas. Durante o enterro, urubus faziam sobrevoos no local.

Ferreira estava preso desde outubro de 2018 por roubar um celular, segundo a família. "Choro desde segunda de manhã. Não consigo dormir, não tenho vontade de comer...", disse a mãe Dijane Mota. "Ele mesmo dizia que errou, mas estava pagando. O que aconteceu não é certo. Ninguém vai para o presídio para morrer."

Estadão
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