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Poupar contratações, 'criar DNA' e dar espaço a atletas: por que clubes brasileiros investem no sub-23?

O retorno do Brasileirão de Aspirantes motivou a criação do sub-23 nos grandes clubes do país. Ao L!, dirigentes deram os motivos para ter a categoria

13 ago 2018 - 09h19
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Apesar do grande número de jogadores que deixaram o país ainda muito jovens para atuar no futebol internacional, existe uma outra realidade que mostra os desafios dos atletas que compõem as categorias de base dos clubes brasileiros. No mesmo ambiente em que a transferência de 15 atacantes com 23 anos ou menos gerou receita de R$ 1 bilhão só nesta janela, de acordo com dados do GloboEsporte.com, há atletas que encontram dificuldade para se firmar no time profissional no limite da idade dos juniores e acabam perdendo espaço, sendo emprestados para outros times locais.

Com a finalidade de responder a esse problema de faixa etária e melhorar a qualidade dos atletas na transição da base para o profissional, a criação da categoria Sub-23 voltou à tona entre dirigentes de clubes que enxergam uma boa oportunidade com o Brasileirão de Aspirantes. A competição é organizada pela CBF, com apoio do presidente eleito para o quadriênio 2019-2023, Rogério Caboclo, atualmente diretor-executivo da entidade. O cartola considera a categoria uma chance para que os atletas possam conseguir emprego - já que muitos acabam abandonando a profissão quando chegam aos 21 anos sem uma oportunidade na equipe principal.

Criado em 2017, com dez times formados por jogadores de até 23 anos, o torneio teve um curto calendário em sua primeira edição, com todos os jogos realizados nos três últimos meses do ano. A final, disputada entre Santos e Internacional, rendeu o troféu ao Colorado, que atualmente conta com destaques daquele time na disputa do Campeonato Brasileiro da Série A.

Em 2018, o calendário melhorou, mas, apesar de a CBF ter convidado seus 20 clubes de maior expressão em janeiro, apenas cinco dos times de maior torcida do país (Grêmio, Internacional, Santos, São Paulo e Cruzeiro) entraram na competição. Alegando não ter jogadores suficientes na idade para formar um time, os cariocas Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco, o Atlético-MG e os paulistas Corinthians e Palmeiras recusaram o chamado. Com isso, o torneio, iniciado em junho passado, adotou o formato com 16 times, oito em cada grupo, incluindo clubes da segunda divisão.

- A Liga Brasileira é uma das poucas que não têm um calendário de competições para o Sub-23. Alguns atletas do Sub-20 vão para o profissional e, muitas vezes, quando isso não acontece, acabam sendo transferidos para clubes pequenos - afirmou o executivo de futebol do Sport, Klauss Câmara, que celebra o retorno da competição de aspirantes

- Nós brigamos muito para que a CBF voltasse a organizar torneios pela formação dos atletas, mas acho que ainda falta um projeto unificado, onde grandes equipes possuam um time Sub-23 para que tenhamos um calendário de competições ao longo do ano e uma liga cada vez mais forte.

A partir da necessidade de manter as promessas da base e desenvolvê-las para que sejam integradas ao elenco profissional, os clubes dão passos curtos no desenvolvimento do setor, mas aprovam o retorno do investimento realizado. Atualmente, dez participantes da Série A possuem time com jogadores até 23 anos: América-MG, Grêmio, São Paulo, Vitória, Atlético-PR, Sport, Chapecoense, Internacional, Santos, Bahia. Nesse grupo, destaca-se o modelo organizacional implantado pelo Colorado.

Internacional aposta em modelo europeu na formação do Sub-23

Baseado na concepção europeia que visa a padronização do elenco desde as categorias mais jovens até o Sub-23, a comissão gaúcha aposta na formação de atletas com futebol inteligente e agressivo, que desenvolvam um estilo jogo voltado para a posse de bola e preenchimento de espaços em campo. Além disso, o investimento do clube em contratar atletas promissores para formar o time B, somado a uma valorização nos destaques revelados no próprio Internacional, geram recompensas, como o título mais recente do Brasileirão de Aspirantes, em 2017, e da Copa Sub-23, em 2010, conquistado por um grupo formado por grandes nomes como Alisson Becker (Liverpool), Fred (Manchester United), Eduardo Sasha (Santos), Oscar (Shanghai SIPG), Ricardo Goulart (Guangzhou Evergrande), e os atuais colorados Leandro Damião e Rodrigo Moledo.

O Internacional foi campeão do primeiro Campeonato Brasileiro de Aspirantes (Foto: Lucas Figueiredo/CBF)

- Os atletas que chegam ao Sub-23 fazem parte de um planejamento para que evoluam e aprimorem aquilo que imaginamos que falta para que sejam integrados ao time profissional. E a gente acredita que o benefício é grande, pois alguns jogadores de valor no cenário internacional já passaram por essa categoria. Além do Juan Alano, que está em transição, já temos no profissional o Richard, Nonato, Gabriel Silva, Álvaro, Iago, o segundo goleiro Daniel e o terceiro Keiller, que são jogadores que aturam na equipe de aspirantes no ano passado - contou o diretor executivo da base colorada, Diego Cabrera.

América-MG investe em time de Aspirantes para economizar

O sucesso do modelo estabelecido pelo Internacional serviu de inspiração para outros clubes, que viram nele a oportunidade de aproveitar no plantel profissional os jogadores que se destacam nos juniores. No América-MG, o time de aspirantes foi formado com a base da categoria Sub-20 e alguns jogadores que já passaram pelo profissional, mas precisam desenvolver suas qualidades e técnicas para estarem aptos a retornar.

América-MG comemora vitória sobre o Internacional na segunda rodada do Brasileirão de Aspirantes 2018 (Foto: Mourão Panda / América)

Ao LANCE!, O diretor-executivo das categorias de base do Coelho, Paulo Bracks, explicou que o perfil dos jogadores selecionados foi estabelecido a partir de uma análise do departamento de inteligência, apontando os potenciais atletas a se encaixarem no time de aspirantes, já mirando na possibilidade de chegarem ao profissional. Questionado sobre os benefícios de ter uma equipe sub-23, Paulo Bracks foi pontual ao mencionar a economia na contratação de atletas.

- São muitos os benefícios em retorno técnico e desportivo. E isso trás consequências positivas, como a repercussão do nome do clube e o investimento para o futuro. Hoje, o América de cinco jogos ganhou quatro na categoria contra grandes escolas do futebol brasileiro e isso trás um retorno técnico e, posteriormente, financeiro, além de uma economia que se faz quando um atleta ou outro integra o elenco profissional. No ano passado mesmo, os elencos do Santos e do Inter forneceram jogadores que atuam no profissional em 2018. Então, a gente passou a se basear nisso para que alguns desses atletas do time de aspirantes possam integrar o elenco principal do América estando aptos a jogar a Série A em 2019.

O diretor da base americana também falou sobre o trabalho realizado com os atletas no centro de treinamento do clube e do relacionamento do sub-23 com os jogadores do time principal.

- Ser integrado ao profissional depende de diversos fatores, mas, sem dúvida, uma competição como esta dos Aspirantes ajuda bastante nesse processo de preparação. No América, constantemente os atletas do Aspirantes tem participado dos treinos do profissional durante a semana. No período de inter-temporada, o Clube promoveu também um jogo-treino da equipe que disputa o Brasileiro de Aspirantes contra o time profissional. Então, todo o trabalho para deixar o atleta o melhor preparado possível tem sido feito para quando a comissão técnica principal solicitar a inclusão de um jogador sub-23 ou sub-20 em definitivo no time profissional.

Santos estabelece igualdade de condições por bom entrosamento no clube

No Santos, a categoria sub-23 foi criada em 2015, ainda durante a gestão do ex-presidente Modesto Roma Júnior. Ao contrário dos outros clubes que têm a intenção de conquistar títulos com o time de aspirantes e, com sorte, aproveitar os atletas no plantel principal, o intuito central do Peixe é ter uma equipe para fornecer jogadores com qualidade técnica para o grupo profissional. A iniciativa surtiu o efeito esperado e o reflexo está nas promoções de Vitor Bueno, que foi titular e transferiu-se recentemente para o Dínamo de Kiev (UCR), e o meio-campista Diego Pituca, que negocia a possibilidade de renovar contrato profissional com o Santos.

Santos comemora vaga na final do Brasileirão de Aspirantes 2017 após vitória sobre o São Paulo (Foto: Ivan Storti/ Santos FC)

- Há também uma integração com a equipe principal, todos os atletas são vistos em igualdade de condições. Para se atingir a equipe principal existem vários fatores: o técnico e a necessidade de contar com atletas em uma determinada posição carente no time principal são alguns exemplos. Apesar de a equipe ter sido criada recentemente, temos alguns jogadores que passaram pela categoria e estão no time principal, como o Lucas Veríssimo e Diego Pituca - declarou o responsável pela estrutura da base santista, Carlão Muniz.

São Paulo aposta no DNA dos oriundos da base para fortalecer sub-23

Inter foi o campeão do Brasileirão de aspirantes de 2017 (Foto: Lucas Figueiredo/CBF)
Inter foi o campeão do Brasileirão de aspirantes de 2017 (Foto: Lucas Figueiredo/CBF)
Foto: Lance!

Na Barra Funda, a equipe sub-23 do São Paulo tem grande participação no planejamento do clube, que quer reduzir o elenco de jogadores no time profissional para o segundo semestre de 2018. A expectativa é de que o Tricolor mantenha 25 atletas de linha, além dos goleiros. Para alcançar o objetivo, há um plano estabelecido pelos dirigentes que inclui a utilização dos destaques do time de transição, algo que geraria retorno técnico e economizaria as finanças do clube.

Time-base do São Paulo em formação antes da partida contra o Coritiba, pela 2ª rodada do BR de Aspirantes (Foto: Igor Amorim/saopaulofc.net)

- Não costumamos selecionar atletas de fora para contratação. Normalmente contamos no sub-23 com jogadores que já tem o DNA do São Paulo. O time de transição também é importante para a manutenção de ritmo dos atletas que, por ventura, não são utilizados no profissional ou que precisam pegar ritmo de jogo e recuperar a condição física quando saem do departamento médico. Os jogadores que voltam de empréstimo também passam um período no grupo de transição. A ideia é que os atletas da base formem o Sub-23 juntamente com esses jogadores pouco utilizados no profissional para disputar os campeonatos do calendário.

Grêmio quer evitar gastos com sub-23, mas recebe bons retornos

Tendo um plano definido para agregar atletas com instinto competitivo maior ao elenco de aspirantes, o diretor-executivo de futebol do Grêmio, André Zanotta, é específico ao afirmar que o clube não pretende gastar altos valores para manter o grupo de transição, mas valoriza a participação da equipe nos principais torneios disputados no Sul, pois desta forma, os jogadores amadurecem e ganham experiência. Prova da preocupação do Tricolor com o desenvolvimento dos jogadores reflete na longa lista de campeonatos já disputados pelo Time B, lista que vem aumentando gradualmente.

Time de Aspirantes do Grêmio em preparação para as disputas do Campeonato Brasileiro da categoria (Foto: Divulgação Site Oficial do Grêmio)

Em 2015, o grupo de transição participou do Campeonato Valmir Louruz (FGF, profissional) e a Copa Luiz Fernando Costa (FGF, profissional). No ano seguinte, o time marcou presença no Estadual Sub-23 e no Campeonato José Luiz Barreto (FGF, profissional). A lista começou a crescer em 2017, quando os aspirantes disputaram o Campeonato Gaúcho da Segunda Divisão, o Brasileirão de Aspirantes, a Copa da China-América Latina (torneio em que foi campeão) e algumas rodadas do Campeonato Brasileiro de profissionais. Em 2018, uma surpresa: como o período de férias do plantel principal foi prolongado devido a participação do Grêmio no Mundial de Clubes da FIFA, o time de aspirantes assumiu o comando das quatro primeiras rodadas do Gaúchão profissional. Além disso, a equipe disputa atualmente a segunda edição do Brasileirão de Aspirantes e se prepara para o início do Campeonato Wianey Carlet (FGF, profissional).

- Estabelecemos que não queremos um custo alto para o grupo de transição, mas buscamos atletas que tenham potencial. Acredito que essa participação em torneios faz parte do processo de amadurecimento dos atletas, que ganham mais experiência participando dessas disputas. Nós tentamos dar as mesmas oportunidades para todos. Eles estão no Sub-23, mas também são avaliados pela comissão técnica comandada por Renato Gaúcho. Há uma semana, o Jean Pyerre foi promovido para o profissional. Ele era destaque no Sub-23. Na partida contra a Chapecoense, o autor do gol gremista foi o Pepê, que iniciou a transição há dois meses e também se destacou, passando a integrar o time principal. Penso que o trabalho com a base tem sido muito bem feito para que, quando esses atletas chegarem ao time profissional, não sintam tanta diferença. O trabalho deles tem sido bem representado e a gente respeita o desenvolvimento, sem pressa.

Questionado sobre a possibilidade de algum atleta da equipe de transição ser promovido ao elenco principal nas próximas semanas, André Zanotta indicou o lateral-esquerdo Guilherme Guedes de apenas 19 anos, que foi convocado pela Seleção Brasileira Sub-20 em junho deste ano para as disputas de amistoso contra o México e gerou expectativa de um novo chamado para o Sul-Americano de 2019.

- A observação é constante entre todos os atletas que estão no Sub-23, mas para subirem para o profissional, depende de uma série de fatores. Contra a Chapecoense, utilizamos o lateral-esquerdo Guilherme Guedes, de apenas 19 anos. Ele tem mostrado um bom trabalho, tem algumas convocações para a Seleção Brasileira Sub-20, então é um jogador com um potencial que acreditamos muito. Mas se ele vai ser o próximo a ser promovido depende da necessidade de jogador da posição no time principal, do rendimento e da adaptação que o jogador terá pela frente.

Sport apresenta sub-23 em 2018 cobrando mais competições para a categoria

O Sport já idealizava a criação do sub-23 desde 2015, mas o projeto só foi anunciado em 2018. Com um plano de meta que não visa a contratação de jogadores para formar o grupo, a comissão técnica, encabeçada pelo técnico Júnior Câmara e o assistente Wilton Bezerra, que também comanda o elenco Sub-20, optou por aproveitar na equipe jogadores de 21 ou 22 anos oriundos do Nordeste, tendo em vista o objetivo de promovê-los ao time principal futuramente.

Time Sub-23 do Sport durante disputa do Brasileirão de Aspirantes 2018 (Foto: Williams Aguiar: Sport Club do Recife)

Ao L!, o gestor executivo das categorias de base do clube, Coronel Genivaldo Cerqueira, explicou que o Sport aposta na realização de conversas diárias entre membros da comissão técnica e treinamentos em conjunto (jogos-treino) para promover a integração do time de aspirantes com o profissional. O fator auxilia no desenvolvimento dos atletas, mas nem tudo são flores e apesar de estar presente na disputa do Brasileirão de Aspirantes e no Campeonato Pernambucano da Segunda Divisão, o dirigente considera que são poucas as oportunidades que o calendário brasileiro oferece à categoria.

- Formamos a categoria com alguns atletas oriundos do Sub 20, juntamente com jovens jogadores com potencial de desenvolvimento, especialmente na região Nordeste. Porém, pela escassez de competições na categoria, só conseguimos iniciar esse projeto embrionário do Sub 23 este ano, com o convite para disputar o Brasileiro de Aspirantes e após termos acertado com a Federação Pernambucana de Futebol para disputar o Campeonato Pernambucano Profissional da 2ª divisão com esta categoria. O investimento é modesto por se tratar de um projeto embrionário, iniciando na categoria Sub 20 e encaminhando para se ter uma categoria exclusiva. Mas o retorno poderia ser maior considerando a formação mais acabada dos atletas, com possibilidade de aproveitamento pelo Departamento de Futebol Profissional.

Atlético-PR e um sub-23 com grandes resultados

Quando se trata de conquistas com o time de jovens até 23 anos, o Atlético-PR também se destaca e fala com orgulho dos feitos realizados pelos "crias" da base. O elenco sub-23 foi formado em 2013 e logo no primeiro ano já mostrou que seria um difícil adversário a ser batido, conquistando o vice-campeonato paranaense do ano com direito a uma larga vitória por 3 a 1 sobre o Coritiba no confronto de ida. Em 2018, o time de aspirantes garantiu mais um importante feito ao se tornar campeão estadual, título que emociona o vice-presidente do do Furacão, Marcio Lara, que revela o segredo para o notável desenvolvimento dos atletas: investir na preparação dos jogadores desde os 14 anos.

Atlético-PR em partida do Campeonato Brasileiro de Aspirantes (Foto: Reprodução Twitter)

- Entre os momentos marcantes, nós fomos vice-campeões paranaenses no primeiro ano do Sub-23 jogando contra o time principal do Coritiba, inclusive vencemos com goleada por 3 a 0 (3 a 1). Em 2014, também fomos às oitavas de final e agora, em 2018, fomos campeões paranaenses jogando com nosso time de aspirantes. Muitos jogadores se destacaram nesses compromissos. Em 2013 tivemos o aparecimento do Hernane, do Otávio, o Douglas Coutinho. Em 2014, o Douglas Coutinho e Marcos Guilherme. Ou seja, uma série de jogadores da nossa formação que se destacaram, subiram para a equipe profissional, inclusive como titulares.

*sob supervisão de Miro Neto

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