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Copa da Rússia

Tá russo! Valores invertidos na Fifa

Para a entidade, um crime comercial é pior do que a ofensa a um ser humano

7 jul 2018 - 05h12
(atualizado às 05h12)
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Não há pior crime na Fifa que violar regras comerciais. Desde o começo da Copa do Mundo na Rússia, a entidade tomou uma série de medidas disciplinares contra a xenofobia, o racismo, contra o envolvimento político e a homofobia. No entanto, a multa mais pesada adotada pelos organizadores acabou sendo contra quem entrou num estádio com publicidade de marcas de cervejas não autorizadas. Este, sim, um crime lesa-pátria para o "padrão Fifa".

A maior multa foi aplicada contra a Associação Croata de Futebol. US$ 70 mil (algo na casa dos R$ 275 mil) acabaram sendo cobrados por conta de uma tentativa de membros da seleção de mostrar a publicidade de uma marca de cerveja que não fosse a Bud, dona de um contrato de exclusividade com a entidade máxima do futebol.

Ciente da dimensão de um evento global, a Fifa promete a seus patrocinadores uma proteção total a suas marcas, em troca de milhões de dólares. O acordo parece equilibrado: de um lado, a Copa oferece uma plataforma global para as marcas. De outro, recebe cheques que engordam os cofres da Federação Internacional.

Mas a mesma proteção não é observada quando a violação se refere a direitos fundamentais, como a não-discriminação e a violência.

A mesma Croácia foi multada pela Fifa por apenas US$ 13 mil (pouco mais de R$ 51 mil) devido à briga em que seus torcedores se envolveram no jogo contra a Argentina, que ainda acabou com objetos sendo atirados entre os grupos rivais.

Já a Dinamarca foi penalizada em US$ 20 mil (R$ 78,5 mil) por conta de cartazes com conteúdo sexistas num jogo. O México também recebeu multa similar por cantos homofóbicos.

O valor ainda se contrasta com os US$ 10 mil (R$ 39 mil) cobrados da Federação Russa por conta de um cartaz mostrado no jogo entre Rússia e Uruguai, com um óbvio caráter racista. Os sérvios também foram punidos por mensagens de cunho fascista. Mas a multa não chegou a US$ 20 mil. Um valor ainda menor acabou cobrado dos mexicanos por conta das brigas da torcida no jogo contra a Suécia.

A mesma Sérvia também foi punida por cartazes com "conteúdo discriminatório" no jogo contra a Suíça. Mas a pena ficou abaixo da multa por violações comerciais: US$ 54 mil (quase R$ 212 mil). Seu presidente e seu treinador também foram multados por atitudes antidesportivas, mas por irrisórios US$ 5 mil (R$ 19,6 mil) cada. Mesmo os jogadores suíços - Granit Xhaka, Xherdan Shaqiri e Stephan Lichtsteiner - que causaram polêmica ao fazer um gesto simulado a bandeira do Kosovo no jogo contra a Sérvia (a Fifa proíbe manifestação política em campo) resolveram o "problema" com um cheque de US$ 10 mil.

Caixas de ressonância, estádios vivem no cimento de suas estruturas muitos dos embates de uma sociedade. Entre certos cartolas de uma outra geração, lidar com a arquibancada é ainda um desafio. Não são poucos os que alegam que tais comportamentos de torcedores são "culturais" e que certas ofensas não devem ser entendidas de uma forma literal.

Pressionada, a Fifa mudou sua atitude de manter um silêncio constrangedor e passou a distribuir multas por comportamentos de torcedores nas arquibancadas. Mas sempre em valores irrisórios que não têm conseguido frear atitudes que não condizem com o século 21.

Atribui-se, correta ou incorretamente, a Einstein a frase de que é mais fácil esmagar um átomo que o preconceito. No futebol, não é muito diferente. Em 2018, a exibição de uma marca num estádio é ainda um crime mais grave que ofender um outro ser humano.

*REPÓRTER DO 'ESTADÃO'

Estadão
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