Esporros, eleição e mil vidas: veja como Luxemburgo afundou com o Flu
Vanderlei Luxemburgo já assumiu o Fluminense sem ser unanimidade entre as quatro vozes que participam das decisões mais importantes nas Laranjeiras. Demitido em menos de quatro meses e com o time imerso à zona de rebaixamento, o treinador evidenciou uma carreira que despenca ano a ano e que chegou a seu pior momento enquanto o clube também afundava.
Com 40% dos pontos conquistados no Fluminense, Luxemburgo teve seu aproveitamento mais baixo desde que virou treinador top, ainda no início dos anos 90. Nas Laranjeiras, a aposta era de que ele fosse capaz de contornar uma crise institucional, especialmente do ponto de vista financeiro, e dominar um vestiário que rezava de maneira fiel a cartilha do antecessor Abel Braga. Mas ele acabou engolido por ela.
Experiente, vitorioso e dono de jogo de cintura, Luxemburgo ficou marcado por sucumbir a essa crise que envolveu penhoras na Justiça, lesões de jogadores importantes, atrasos de salários e desencadeou dentro de campo. Sem a possibilidade de contratar, o treinador teve apenas jovens à disposição. Por isso, o presidente Peter Siemsen preferia Ney Franco.
Com alguns dos jovens, Luxemburgo exagerou na motivação e deu margem a reclamações. Os jogadores se queixaram do palavreado forte do treinador e inclusive por ameaças de que retornariam a Xerém, sede das categorias de base. Nos momentos de maior pressão, o diagnóstico geral é de que faltou o carinho de Abel Braga para um time inexperiente. A bola queimou no pé dos mais jovens, intranquilos, principalmente a partir da derrota para o Vitória.
Derrota no Maracanã sela fim de Luxemburgo e arranha presidente
A queda com Maracanã lotado e um jogador a mais deflagrou o fim da linha de Luxemburgo em episódio que também arranhou a imagem do presidente Peter Siemsen. Naquela mesma noite, pressionado pelo grupo político que integra, ele assegurou a diversas pessoas próximas que o treinador seria demitido, versão mantida nos dois dias seguintes. A Flu Sócio até divulgou nota contra o treinador.
Na noite de terça (29 de outubro), assessores de Peter tinham a informação de que Luxemburgo seria substituído na quarta e que Caio Júnior chegaria da Espanha para assumir seu lugar na quinta (31). Antes de a saída ser oficializada, o presidente foi demovido por Celso Barros, presidente da Unimed, Rodrigo Caetano, diretor executivo, e Marcelo Teixeira, gerente de futebol.
"O Peter deu um chilique. Foi um ataque de torcedor, indignado, saiu falando que iria demitir", conta um aliado do presidente. "Ele parece não ter aprendido até hoje que suas palavras têm um peso, porque fala pela instituição. O desabafo vazou e virou verdade, isso criou um clima tenebroso para o elenco, a torcida e ele próprio. Esse clima foi o maior problema".
Luxemburgo já havia balançado no cargo em setembro depois de derrotas seguidas para São Paulo, Goiás (Copa do Brasil) e Santos, mas não caiu pela segunda vez. Para dar força ao treinador, Peter Siemsen se reuniu no vestiário e endossou a permanência em entrevista coletiva. Antes, porém, pensava até em recontratar Abel Braga.
A avaliação geral era de que, apesar de reclamações isoladas principalmente dos mais jovens, Luxemburgo não tinha problemas com os jogadores. Antes do Fla-Flu do domingo retrasado (3 de novembro), uma reunião com seis lideranças do elenco foi realizada pelos dirigentes. Eles asseguraram que todos estavam fechados com o treinador, mas o Flamengo ganharia o clássico com time misto.
Velhos métodos não salvam Luxemburgo, e política ferve o Fluminense
Supostamente respaldado para os seis jogos finais, Luxemburgo optou por uma antiga estratégia: retirar o grupo do Rio de Janeiro, isolar os jogadores em Atibaia e esconder a formação para pegar o Corinthians. A partida evidenciou as insistentes mudanças do treinador no sistema tático e nas escolhas individuais. Sem Carlinhos, seis diferentes jogadores foram testados na lateral esquerda, o último deles Felipe - na ala, protegido por três zagueiros. O time jogou mal e perdeu.
Com três pontos conquistados nos últimos 27 disputados e quase demitido em setembro e outubro, Luxemburgo não suportou em novembro. Peter Siemsen, extremamente pressionado por seus aliados políticos e escorado nos resultados ruins, não encontrou mais obstáculos para formalizar a saída do treinador na segunda-feira.
A 11 dias das eleições, mantê-lo seria assinar a própria sentença, e Peter aproveitou a demissão para tentar mostrar autoridade. As notas sobre a saída de Luxemburgo e a contratação de Dorival Júnior começaram com a frase "por decisão do presidente Peter Siemsen". Seu grupo político, entretanto, já não vê a vitória contra Deley como favas contadas no próximo dia 23.
Entre os dirigentes do Fluminense, a dúvida é até que ponto Luxemburgo foi incompetente ou vítima do momento complicado do clube e do clima ruim criado desde sua chegada - "demite esse flamenguista", se cansou de ouvir Peter Siemsen. "O trabalho dele foi muito bom, da comissão técnica dele também. Ele trabalhou, se dedicou, fez de tudo, mas não deu certo", disse um membro do departamento de futebol.
Aos 61 anos, Vanderlei Luxemburgo pode ter participado de seu primeiro rebaixamento desde a passagem pelo Palmeiras em 2002, mas contará com um antigo "aliado". Em 2010, Dorival Júnior assumiu o Atlético-MG que Luxemburgo deixara na zona de rebaixamento e salvou. Sua missão é repetir o feito no Fluminense.