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Proposta de Bolsonaro de mudar ICMS de combustíveis deve atrair forte resistência

17 jan 2020 - 16h05
(atualizado em 18/1/2020 às 05h05)
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Uma proposta do presidente Jair Bolsonaro de alterar a cobrança do ICMS sobre combustíveis para reduzir preços da gasolina e do diesel tem potencial para realmente diminuir custos, mas deve enfrentar uma forte oposição política que pode tornar muito difícil ou inviável sua aprovação, disseram advogados à Reuters.

 REUTERS/Sergio Moraes
REUTERS/Sergio Moraes
Foto: Reuters

O presidente disse a jornalistas que o ICMS, um tributo estadual, deveria incidir sobre preços nas refinarias, e não no consumo. Na quinta-feira, ele afirmou que apresentou proposta nesse sentido ao Ministério de Minas e Energia, mas não forneceu detalhes.

Atualmente, a maior parte dos Estados recolhe o ICMS junto a produtores, distribuidores ou importadores com base em um preço estimado da venda ao cliente nos postos, que já leva em consideração margens de lucro em todos os elos da cadeia até a chegada aos consumidores finais.

"Você tem hoje o ICMS final incidindo sobre uma base que é o preço final para o consumidor. A ideia do presidente imagino que seja concentrar o ICMS no produtor, onde a base (a ser tributada) é menor, desonerando as demais etapas da cadeia. Por conta disso você teria redução do preço", explicou o sócio da área tributária do escritório Veirano Advogados, Filipe Richter.

Mas essa mudança, além de potencialmente reduzir a arrecadação dos Estados com o imposto, ainda poderia deixar alguns deles sem qualquer receita, o que tornaria a aprovação da proposta no Congresso um enorme desafio político para o governo.

A Petrobras, que concentra quase 100% da capacidade de refino no Brasil, possui refinarias em 10 dos 27 Estados brasileiros, se considerado o Distrito Federal.

"A questão é que nem todos os Estados têm refinarias, e os que não têm perderiam 100% do ICMS sobre combustível. Esses Estados certamente bateriam o pé, porque a arrecadação do ICMS sobre combustíveis é bastante expressiva", pontuou Richter.

A alteração no ICMS demandaria lei complementar, que exige aprovação pelo Congresso com maioria absoluta dos deputados e senadores-- isso significa votos equivalentes à metade mais um do número de parlamentares de cada Casa, independentemente de quantos deles estiverem presentes durante as deliberações.

"É um caminho bastante difícil... principalmente porque o número de Estados produtores de combustíveis é muito mais limitado, enquanto os postos de gasolina estão espalhados pelo país inteiro", acrescentou Richter.

CAMINHO MAIS DIFÍCIL

Segundo o tributarista Paulo Vieira da Rocha, sócio do escritório VRBF Advogados, a ideia apresentada por Bolsonaro parece um caminho muito mais difícil que a redução de outros tributos incidentes sobre gasolina e diesel, como os federais PIS e Cofins.

"Isso baratearia, obviamente, com toda certeza. Mas há várias outras formas de baratear o combustível. De fato, metade do preço do combustível no Brasil é imposto. Mas, sendo honesto, não consigo acreditar que governadores vão deixar suas bancadas livres para votar isso, a pressão vai ser gigantesca", afirmou.

Os impostos respondem por cerca de 45% do custo final dos combustíveis, sendo em média 29% correspondentes ao ICMS, segundo cálculo da Petrobras com base nos valores em 13 Estados.

Um caminho alternativo para cortar custos seria via redução de impostos federais como PIS e Cofins, o que teria aprovação mais fácil, com maioria simples no Congresso, acrescentou Rocha, mas isso causaria perda de receita para a União.

"É uma cortesia com chapéu alheio", afirmou Rocha, em referência ao fato de a proposta não ter impactos para o governo federal. "Isso iria privilegiar não só os Estados que têm refinarias, mas os que têm as maiores refinarias", adicionou.

Eventualmente, a proposta poderia contemplar alguma divisão de receitas entre Estados do ICMS cobrado nas refinarias, mas isso provavelmente exigiria mudança constitucional, por meio de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que ainda poderia ser questionada junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).

As PECs exigem aprovação por três quintos dos deputados e senadores.

Antes de falar sobre a mudança na cobrança do ICMS, Bolsonaro chegou a sugerir que governadores reduzissem a alíquota do imposto, o que foi prontamente rejeitado.

O diretor institucional do Comitê dos Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), André Horta, afirmou no início de janeiro que os Estados não conversaram ainda sobre cortes no ICMS sobre combustíveis e que a ideia não deve prosperar.

"Entre 18% e 20% da arrecadação própria dos Estados com ICMS é com ICMS sobre combustíveis. Esse valor é bastante representativo e na situação fiscal atual dos Estados não está sendo possível (abrir mão)", disse.

"Não faz nenhum sentido jogar isso nas costas dos Estados", disse o governador de São Paulo, João Doria, no início de janeiro. "Esse assunto nem será estudado."

Ao comentar sua proposta para o ICMS nesta semana, Bolsonaro defendeu que o preço dos combustíveis não é um tema de interesse só do governo federal e disse que os governadores têm que ter parcela de responsabilidade no debate.

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