Venezuelanos compartilham vídeos de saques a supermercados
Desabastecimento de produtos básicos e falta de confiança na mídia local faz venezuelanos usarem as redes sociais para mostrar realidade
Toda semana, vídeos mostrando pessoas saqueando um supermercado ou caminhão são compartilhados nas redes sociais pelos venezuelanos. Alguns são vistos milhares de vezes e mostram a crise de abastecimento de alimentos pela qual passa o país.
Com sua moeda em queda livre e altas taxas de inflação, a falta de produtos básicos tornou-se a norma na Venezuela. A crise se instaurou no início do ano, quando milhares de pessoas postaram fotos na internet de prateleiras vazias - e, agora, a situação parece ter piorado. Vídeos dos saques estão sendo compartilhados por WhatsApp, YouTube e Facebook. Alguns são reproduzidos pela parte da mídia que se opõe ao governo venezuelano ou são enviados diretamente a sites antigoverno. "Com certeza, houve um aumento do número de vídeos", disse uma pessoa que trabalha em um destes sites. "Toda semana, recebemos entre cinco e dez."
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O problema é ser muito difícil verificar a origem, data e locais onde estes vídeos foram feitos. "Sem dúvida, existe a chance de eles serem falsos ou antigos. Mas a grande maioria dos casos é real", disse o porta-voz do Dolar Today, que pediu para se manter anônimo por sua segurança. "Tomamos muito cuidado para não publicar nada falso. Às vezes, falamos com a pessoa que nos manda o vídeo, mas, em outros casos, não achamos que isso é necessário."
Mas por que os venezuelanos estão compartilhando estas imagens?
Falta de informação
Uma razão pode ser o fato de que, segundo uma pesquisa da empresa Datanalisis, os venezuelanos consideram o desabastecimento o maior problema enfrentado pelo país no momento, seguido pela inflação e a criminalidade. "As pessoas, principalmente das classes média e mais baixas, precisam ficar nas filas por horas todos os dias para conseguir comida e outros produtos básicos, como detergente, óleo e papel higiênico", diz Marcelino Bisbal, professor da Universidade Central da Venezuela e especialista em opinião pública.
Outra razão, sugere o pesquisador de mídia Andres Cañizares, é a falta de informação confiável tanto por parte da mídia governamental quanto da oposição em um país altamente polarizado politicamente. "Isso leva muitas pessoas a compartilhar o que eles pensam ter valor jornalístico, já que não há um veículo de mídia na Venezuela que pode nos dizer o que está acontecendo", afirma Cañizares.
"Publico estas imagens para mostrar a quem é pró-governo a realidade de nosso país", disse no Twitter a usuária @aeggatite, que tuitou a imagem acima. Outros cidadãos ecoam estes sentimentos.
"Sou venezuelano, e me faz mal ver o que está acontecendo no meu país e como a mídia local não fala destes fatos", comentou a usuária @negritaVALIEN.
Incerteza
No entanto, publicar estas imagens implica em um risco: espalhar informações que podem ser falsas. "Estas mensagens podem servir de combustível para o sentimento de incerteza em um momento em que as pessoas estão ansiosas com o desabastecimento", afirma Cañizares. "Isto é muito perigoso em um país onde a política do governo é não falar nada sobre o assunto, como se não estivesse acontecendo", acrescenta Bisbal.
O BBC Trending entrou em contato com o governo venezuelano para que ele se posicionasse sobre o assunto, mas não recebeu resposta. No entanto, no passado, o governo afirmou que estas imagens publicadas em redes sociais são parte da campanha contra o presidente Nicolás Maduro orquestrada por empresas privadas e governos estrangeiros.