Mercado busca opção depois que QuintoAndar encerrou serviço que garantia pagamento de aluguel
Empresas iniciaram corrida para conquistar os clientes que ficaram desamparados, mas pregam cautela nessa migração
No início de junho, o QuintoAndar anunciou o fim do QuintoCred, ferramenta de garantia locatícia que tinha cerca de 45 mil contratos com 3 mil imobiliárias. Antes do apagar oficial das luzes, empresas e startups do setor iniciaram uma corrida para conquistar os clientes que ficaram desamparados, mas pregam cautela nessa migração.
A garantia locatícia permitia que o proprietário recebesse o pagamento do aluguel mesmo que o inquilino não pagasse. Caso não encontrem um substituto até 3 de agosto, data em que os contratos serão rescindidos, os proprietários deverão recorrer a alternativas como fiança, caução ou título de capitalização.
Em comunicado enviado aos parceiros, a empresa apresentou uma lista de prestadores de serviços aptos a realizar essa função. Entre eles, aparece a Mell.ro, fintech paranaense fundada em 2018 que possui R$ 140 milhões em contratos garantidos.
Osni Passos, CEO da startup, conta que já notou um aumento de 90% na demanda nas primeiras semanas depois do anúncio.
De olho neste público, a empresa criou uma linha de capital de R$ 65 milhões para conquistar as imobiliárias, proprietários e corretores.
Por meio dessa linha, será possível antecipar os valores de aluguéis e comissões de imóveis. O objetivo é garantir uma oportunidade de liquidez imediata e previsibilidade aos clientes.
"Percebemos que o acesso a crédito está cada vez mais limitado para todos. Esta é uma chance de respiro nesse cenário", diz Passos.
O dinheiro para manter esse fundo para antecipações por, no mínimo, dez meses é fruto de aportes de investidores-anjos.
Outra arma da empresa para reter imobiliárias nesse movimento de transição é o alto índice de aprovação dos novos contratos. "Temos uma ferramenta de inteligência artificial que nos ajuda no processo. Aprovamos até 90% das garantias", afirma.
Portabilidade em risco
A aprovação dos inquilinos, aliás, é um dos grandes desafios das empresas nessa jornada.
Na CredAluga, outra marca indicada pelo QuintoAndar para auxiliar na portabilidade, a regra é focar nos contratos recentes.
"Quando você pega um imóvel que foi alugado há dois anos, pode significar que a rescisão esteja próxima. E, nessa saída, ele pode discordar da imobiliária em relação aos reparos necessários", justifica Rodrigo Werneck, CMO da empresa.
Por isso, a companhia está focando nos contratos assinados há menos de três meses. "O tempo médio de uma locação é de 20 meses. Desta forma, eu consigo aproveitar 17 meses", contabiliza Werneck.
A partir deste recorte, a empresa inicia a avaliação do perfil de crédito dos locatários. "Sabemos que esses contratos representam uma receita alta, mas podem atropelar uma empresa que não esteja preparada para absorvê-los", diz.
A decisão da CredAluga, porém, não significa que ela não esteja na corrida pelos clientes do QuintoCred.
A empresa intensificou os esforços de aproximação com as imobiliárias afetadas e afirma que o mês de junho já marcou um recorde histórico de contratos, com um aumento de 100% em novas imobiliárias cadastradas.
Mercado milionário e grandes empresas
De acordo com a Creditas, o mercado de locação movimenta R$ 36 bilhões por ano no Brasil. E, diante de um ambiente de juros altos e financiamentos mais caros, a expectativa do setor é que o segmento cresça nos próximos anos.
Não à toa, a Loft reforçou sua equipe com 20 profissionais oriundos do próprio QuintoCred para integrar seu time comercial.
Sandro Westphal, vice-presidente de alianças e parcerias estratégicas da Loft, diz que a expectativa é incorporar pelo menos 70% dos contratos elegíveis.
Como "contratos não elegíveis", ele cita aqueles muito próximos do fim ou com problemas na análise de crédito. "Criamos um script para que as imobiliárias pudessem migrar rapidamente toda a base e mobilizamos os times comerciais e de tecnologia para atender essas empresas", detalha.
"Já analisamos mais de 10 mil contratos, e 95% das propostas que fizemos já foram aceitas", afirma Westphal.
A estimativa é que o número aumente com a proximidade do dia 3 de agosto (o QuintoCred ainda se comprometeu a manter as obrigações até 2 de outubro). É natural que muitas deixem para fazer isso só no último minuto, antecipa.
Atualmente, a Loft tem 500 mil contratos sob gestão e tem a meta de fechar o ano com 650 mil. "A absorção de toda a carteira do QuintoCred representaria menos de 10% da nossa", diz o executivo.
"Sabemos que é um momento difícil para as imobiliárias, por isso estamos mobilizados para fazer a análise de crédito e responder às aprovações de contratos em até oito horas".
Garantia no segmento econômico
Fora da lista de empresas indicadas pelo QuintoAndar para auxiliar neste processo de transição, a Alpop corre como um azarão e aposta no segmento econômico para se destacar.
A proposta da companhia é disponibilizar garantia locatícia para profissionais informais, pessoas que não conseguem comprovar a renda e locatários negativados.
"O endividamento não é algo binário. A pessoa pode estar negativada por causa da conta de luz, do cartão de crédito ou de um empréstimo. Analisamos 22 parâmetros para entender o contexto", pontua Caio Belazzi, CEO da fintech.
"Normalmente, a Alpop é procurada quando outras garantidoras já recusaram aquele cliente. Ainda assim, aprovamos entre 40% e 44%", afirma.
Belazzi conta que, desde o anúncio do fim do QuintoCred, a companhia chegou a analisar em apenas um dia mais do que o triplo da média mensal. Em junho, o crescimento da companhia foi de 8%.
No entanto, a posição é de cautela. "Temos uma análise de risco que é diferente das demais. O mercado popular é pujante, mas as imobiliárias estão mais desconfiadas e, por isso, nos posicionamos com cuidado".
O receio dos proprietários, segundo Belazzi, é que novas garantidoras sigam o mesmo caminho do QuintoCred, ou que empresas oportunistas e não confiáveis cheguem ao mercado.
A advogada Juliana Bueno, sócia imobiliária da HRSA Sociedade de Advogados, acha que essa possibilidade é baixa. "Porém, o movimento pode impulsionar proprietários a retomar práticas como o cheque caução ou o fiador", antecipa.