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ENFOQUE-Como o Santander Brasil acelerou crescimento com financiamento a veículos

11 jan 2019 - 11h09
(atualizado às 11h12)
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Na BM Multimarcas, uma loja de carros usados na periferia de São Paulo, o proprietário Santel de Abreu Bernardo tem veículos que a maior parte dos grandes bancos não se atreveria a chegar perto. Lá há um Renault Clio 2003 azul, desbotado, com 195 mil quilômetros rodados. E um Volkswagen Gol Turbo tão velho que já teria idade para votar.

 REUTERS/Amanda Perobelli
REUTERS/Amanda Perobelli
Foto: Reuters

Mas, quando ele precisa fechar um negócio, Bernardo sabe que pode procurar um lugar para o financiamento do veículo: o Santander Brasil. A unidade brasileira do banco espanhol alcançou 25 por cento de participação no mercado de empréstimos automotivos no país, em parte por conceder crédito para clientes rejeitados por outras instituições financeiras tradicionais. Isso significa empréstimos para trabalhadores que precisam de motocicletas baratas e carros de duas décadas de idade.

O financiamento de carros ajudou o banco a passar pela recessão brasileira, enquanto rivais como Itaú Unibanco e Bradesco pisaram no freio e grupos internacionais como HSBC e Citigroup venderam suas operações de varejo no país.

Porém, há riscos na estratégia do Santander Brasil. "Quando um carro velho quebra, o dono prefere investir o dinheiro para consertá-lo, em vez de pagar o empréstimo", disse Bernardo, da BM Multimarcas. "É por isso que muitos bancos não gostam de financiar carros velhos."

Apesar disso, o Santander Brasil, terceiro maior banco privado do país, tem sido bem sucedido. O índice de inadimplência em operações vencidas há 90 dias é o menor entre os maiores bancos privados do Brasil, de 2,9 por cento em setembro.

Na comparação anual, a carteira de empréstimos a consumidores do Santander Brasil cresceu 22,6 por cento em setembro, mais que o triplo que a média da indústria de 7 por cento. A rentabilidade do banco, que por anos ficou atrás de seus pares no país, saltou para 19,4 por cento ante 16,3 porcento um ano antes. Esse índice superou o retorno do Bradesco, e aproximou o Santander Brasil do líder Itaú.

A unidade brasileira do Santander contribuiu com 26 porcento do lucro do grupo espanhol nos primeiros nove meses de2018, ante 19 por cento quatro anos atrás. A unit do Santander Brasil registra valorização de mais de dois terços nos últimos12 meses, superando a performance das ações da matriz e de Itaú e Bradesco.

Ainda assim, o tamanho do portfólio de veículos e a disposição do banco de apostar em clientes e veículos barrados por concorrentes poderia antecipar alguns buracos pelo caminho em um país com um histórico de volatilidade econômica.

"Certamente, a estratégia de crescimento do Santander Brasil é uma história de sucesso até agora", disse o analista André Martins, da XP Investimentos. "Mas o banco será o mais exposto à inadimplência se a economia recuar."

GESTÃO DE RISCO

Até agora, a economia do Brasil parece seguir um rumo de recuperação. E executivos do Santander Brasil dizem que a estratégia já foi testada.

Cerca de 80 por cento dos empréstimos para veículos do Santander Brasil são para financiamentos de carros com até quatro anos de uso, e a entrada é robusta, de 36 por cento na média.

"Se a carteira de crédito do Santander fosse problemática, já teria estourado depois da recessão histórica de três anos", disse Angel Santodomingo, vice-presidente financeiro do Santander Brasil. "Nosso sucesso em qualidade de crédito está relacionado a nossa capacidade de analisar e precificar o risco dos indivíduos."

Santodomingo não revelou a receita secreta do Santander, mas o banco está se apoiando em big data para analisar informações que vão além de renda e investimentos. Os funcionários responsáveis pelo risco no Brasil estão usando ferramentas do grupo espanhol que são usadas em outros países, incluindo os Estados Unidos, onde o Santander tem uma grande operação de financiamento de veículos para consumidores mais arriscados.

Dois anos atrás, o Santander Brasil lançou um aplicativo que permite aos vendedores de carros acertarem empréstimos em minutos para clientes que fornecessem oito tipos de informação, uma inovação que está sendo copiada agora por outros bancos brasileiros. O processo antes levava pelo menos um dia e exigia dos compradores enorme papelada. Se o empréstimo é aprovado, o cliente já assina o contrato digitalmente.

"Economiza muito tempo", disse Eduardo de Jesus, vendedor na Basile Auto, loja localizada em bairro de classe média na região noroeste de São Paulo.

O Santander Brasil planeja usar o modelo para avançar em empréstimos pessoais no Brasil, financiando viagens de férias, material de construção e paineis de energia solar, disse Andre Novaes, diretor da unidade de financiamento ao consumo do Santander Brasil.

Para se proteger contra calotes, o Santander Brasil tem encorajado clientes altamente endividados a refinanciarem e consolidarem diferentes tipos de débito em um único financiamento com condições mais amigáveis.

Porém, alguns veteranos do setor bancário consideram que a prática é uma forma do Santander Brasil mascarar seu índice de inadimplência. Grandes perdas em 2011 forçaram Itaú Unibanco e Bradesco apararem os financiamentos de motocicletas baratas e carros com mais de 10 anos. Eles também aumentaram as exigências de entrada e encurtaram os prazos, que chegaram a se alongar para até 70 meses, sem entrada.

RIAL NO COMANDO

O Santander está no Brasil desde 1982. O banco fez algumas aquisições relevantes, incluindo a compra da unidade brasileira do holandês ABN AMRO em 2007. Mas a maior parte de seu crescimento orgânico veio sob o comando de Sergio Rial, que assumiu a presidência-executiva do Santander Brasil em janeiro de 2016.

Advogado e economista, Rial atuou como vice-presidente financeiro da Cargill e foi membro do conselho de administração do ABN AMRO. Ele era presidente-executivo da Marfrig quando Ana Botín, presidente-executiva do conselho de administração do Santander, o recrutou para comandar as operações brasileiras do banco espanhol.

Não foram apenas os financiamentos a veículos que sustentaram o crescimento do banco no país. Rial também fez apostas em linhas de crédito mais seguras, incluindo crédito consignado e empréstimos imobiliários, além de ter expandido em cartões de crédito.

No geral, Rial tem fortalecido o braço de empréstimos a pessoa física do Santander Brasil em detrimento de financiamentos para grandes empresas. A carteira de pessoa física já compõe 70 por cento dos financiamentos do banco, 12 pontos percentuais acima do nível de quando Rial assumiu o comando da instituição.

Para engajar mais os funcionários, Rial atrelou uma parcela maior da remuneração dos funcionários à performance. O salário variável aumentou 16 por cento de 2015 a 2017, num período em que o número de funcionários encolheu 7 por cento. O número de clientes do banco tem crescido há 40 meses, alcançando 23,4 milhões em setembro.

Ainda assim, o negócio de financiamento de carros é o que mais chamado a atenção em termos de crescimento, inclusive da concorrência, apesar de despertar a preocupação de rivais sobre a qualidade do crédito.

"Quando os clientes chegam na loja, eles querem saber exatamente se a entrada cabe no bolso e as ferramentas do Santander mostram isso de imediato", Jesus, da Basile Auto, disse. "Outros bancos estão copiando isso agora."

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