Bibi Perigosa coroa o talento dramático de Juliana Paes
Atriz supera estigmas da beleza e sensualidade com atuação irretocável em ‘A Força do Querer’
A beleza abre portas. Mas imediatamente impõe degraus intermináveis a serem vencidos para se atingir o reconhecimento do talento. Afinal, o belo insulta e inferioriza o outro – merece ser punido, pensam os incomodados.
“O número dos que nos invejam confirma as nossas capacidades”, escreveu Oscar Wilde. Ter a oportunidade de exibi-las é o desafio hercúleo de quem nasceu pactuado com Afrodite ou Adônis.
Juliana Paes sempre foi medida com a régua da estética: desde o primeiro minuto que chamou a atenção do telespectador vestindo um uniforme de empregada em ‘Laços de Família’, no ano 2000.
‘Musa’, ‘diva’, ‘símbolo sexual’. O acúmulo de títulos pode ter acariciado o ego, porém impediu que a maior parte das pessoas enxergasse a essência de seu trabalho.
Nunca foi apontada como ‘grande atriz’ – esta, aliás, outra condecoração impregnada de estigmas. Doze novelas depois, ela finalmente chegou ao topo da escadaria.
O trabalho na minissérie ‘Dois Irmãos’, exibida em janeiro, já ressaltara sua força dramática. Mas é agora, em ‘A Força do Querer’, com a ambiguidade de Bibi Perigosa, que Juliana Paes se mostra uma artista maturada.
A personagem usa a beleza e a sensualidade da atriz sem que isso seja visto de maneira pejorativa. A atuação é tão competente e forte que ofusca o indisfarçável apelo visual.
A atriz conduz Bibi pela corda bamba: vilã com eventuais crises de consciência, esposa apaixonada com rompantes de psicótica, mãe zelosa que se deixa seduzir por fuzis, uma fora da lei em busca de justiça.
Gloria Perez, autora exímia na construção de heroínas irresistíveis, desta vez presenteou os noveleiros com uma anti-heroína rica em contradições. Prato cheio para uma atriz capacitada como Juliana Paes.
É um prazer vê-la em cena, com aqueles olhos gigantescos ora exalando medo, ora disparando ira; a oscilação entre a sutileza em algumas sequências e, em outras, o bem dosado descontrole emocional de sua personagem.
Graças à qualidade do texto, da direção, da edição e da atuação, Bibi se fez protagonista absoluta de ‘A Força do Querer’.
Poucas vezes se viu tamanha ousadia na teledramaturgia nacional: uma bandida encabeçando a principal novela da Globo.
Não poderia ter acontecido em momento mais oportuno: Bibi Perigosa é a cara do desvirtuado Brasil de hoje.