O elo perdido do Black Sabbath: vídeo raro exuma a breve era Dave Walker
Entre a saída temporária de Ozzy e o álbum Never Say Die!, um ex-Fleetwood Mac assumiu os vocais
Vídeo raro confirma a breve passagem de Dave Walker pelo Black Sabbath entre 1977 e 1978, substituindo temporariamente Ozzy Osbourne antes da gravação do álbum "Never Say Die!".
Tenho uma camiseta — e uma caneca — estampada com um mantra inegociável: “Você só pode acreditar em você mesmo e nos seis primeiros discos do Black Sabbath”. O sexteto inicial, formado por Black Sabbath, Paranoid, Master of Reality, Vol.4, Sabbath Bloody Sabbath e Sabotage, é uma sequência blindada que só encontra rival nos seis primeiros trabalhos do Slayer — mas essa é outra discussão. Voltemos aos ingleses.
A hegemonia foi quebrada pelo sétimo álbum, o fraco Technical Ecstasy, marco da primeira grande crise criativa e pessoal da banda. O resultado foi o abandono do barco por Ozzy Osbourne no final de 1977. A história de sua substituição temporária por Dave Walker, entre setembro daquele ano e janeiro de 1978, sempre foi conhecida nos bastidores, mas soava quase como uma lenda urbana, um blefe não efetivado. Isso mudou agora. O surgimento de um vídeo raro (dica do bróder Rodrigo James), registrando a única apresentação do ex-vocalista do Humble Pie e Fleetwood Mac com a banda, é a prova cabal de que essa passagem relâmpago foi real.
Se a biografia do Sabbath costuma ser dividida por suas reinvenções vocais — as eras Ozzy, Dio, Gillan e Tony Martin —, pintou mais um nome para essa lista, ainda que sua duração tenha sido de apenas um suspiro.
O final de 1977 não foi nada bucólico para o grupo; vivia-se a ressaca de uma década de excessos. Entre tensões internas e esgotamento, a saída de Ozzy abriu um vácuo no trono logo antes da gravação do que viria a ser o álbum Never Say Die!. Num movimento de pura necessidade, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward recrutaram Walker, que trazia na bagagem a credencial de ter rodado a estrada com gigantes do blues-rock, e começaram a trabalhar em material inédito.
Com Walker, o Sabbath chegou a compor algumas canções, e a mão do novo vocalista assinou a letra da versão embrionária de “Junior’s Eyes”. No entanto, por muito tempo, a única evidência material dessa fase era um áudio de qualidade questionável. O batismo de fogo — e, ironicamente, o canto do cisne — de Dave Walker foi essa notória aparição na TV em janeiro de 1978, no programa Look! Hear! da BBC Midlands. Na gravação, que ressurge agora como uma relíquia arqueológica, a banda toca um trecho de “War Pigs” e a primeira versão de “Junior’s Eyes” com a letra de Walker.
O fim para o novato foi tão súbito quanto sua chegada. Pouco antes de entrarem em estúdio, Ozzy Osbourne, com sua imprevisibilidade lendária, decidiu voltar. Coube a Bill Ward a missão ingrata de dar a notícia a Walker: ele estava fora. A saga, contudo, teve requintes de crueldade: Ozzy recusou-se a cantar qualquer material composto durante sua ausência. As músicas foram reescritas e rearranjadas. Numa ironia histórica gerada pela teimosia do Madman, coube ao baterista Bill Ward assumir os vocais de “Swinging the Chain” no disco oficial.
Por décadas, Dave Walker permaneceu como uma nota de rodapé, o vocalista sem disco cuja existência era quase um mito. Mas a redescoberta da filmagem do Look! Hear! é mais que um artefato para colecionadores; é um vislumbre real no hiato de uma das maiores bandas da história. É a prova em vídeo do homem que, por quatro meses, ocupou o trono mais pesado da música, antes de ser varrido pelo retorno do Rei. Uma passagem breve, mas essencial para entendermos que, no Black Sabbath, vocalistas vêm e vão, mas só o riff é eterno.