PUBLICIDADE

Frequentei baladas virtuais na quarentena e olha no que deu

O relato de um jovem repórter, amante da noite de São Paulo, sobre as festas virtuais durante o isolamento

10 jun 2020 - 12h12
(atualizado em 30/5/2023 às 09h46)
Compartilhar
Exibir comentários

É sexta à noite. Encerrado o expediente e minha rotina de exercícios em casa, é hora de se arrumar. Acho que a máxima de que todo mundo espera algo de uma sexta à noite se aplica bem quando se é um jovem-adulto inquieto como eu. Tomei meu banho, botei uma roupa e abri uma cerveja: a noite só está começando. Liguei a TV da sala e entrei no canal de YouTube de uma famosa casa noturna de São Paulo. Um DJ se apresenta ao vivo. Começou a balada.

A quarentena e seu consequente isolamento social matou o calendário 2020 de atividades boêmias no Brasil. De grandes festivais a barzinhos, passando por baladas e festas juninas. É terminantemente proibido qualquer tipo de aglomeração. Se no início as pessoas não se deram conta da duração deste período (“Ah, no máximo um mês, vai!”) foi ao longo do tempo que as empresas de entretenimento e os artistas se deram conta de que o isolamento duraria mais do que todos imaginavam. Era preciso se reinventar.

A quarentena e seu consequente isolamento social matou o calendário 2020 de atividades boêmias no Brasil
A quarentena e seu consequente isolamento social matou o calendário 2020 de atividades boêmias no Brasil
Foto: Pixabay

Começaram então as lives sertanejas. Superproduções patrocinadas que se tornaram extremamente populares, chegando a durar mais de 4 horas e bater recordes de audiência. Depois, tivemos festivais online. Um deles, na gringa, o “One World: Together At Home” chegou a reunir alguns dos maiores nomes da música mundial na mesma transmissão, de Rolling Stones à Lady Gaga, passando por Paul McCartney, Chris Martin e Elton John. E mais, todas essas lives tinham fins beneficentes e mobilizaram grandes doações para o combate ao novo coronavírus. Pouco a pouco, a indústria musical se reinventava.

A balada virtual

Bem, voltando ao começo deste texto, decidi entrar em uma live da Tokyo, famosa balada hype-hipster de São Paulo que promovia eventos semanais com patrocínio de uma marca de bebidas. Nessas lives, uns três DJs se apresentavam e você podia assistir no conforto de seu lar.

Na primeira semana eu fiz só um teste. Para ser sincero, durou 15 minutos. Ou menos. Veja bem, para uma pessoa noturna como eu, que ama varar madrugadas adentro nas pistas de dança da capital, a experiência toda ser resumida em um DJ tocando um setlist ao vivo na TV da sala enquanto meus cachorros me entregavam bolinhas para brincar era meio frustrante. Desisti.

E vamos para a segunda sexta-feira. Na semana seguinte, fui mais determinado. Me fechei no quarto, para não passar vergonha na frente dos meus pais. Sim, depois de oito anos morando sozinho, vim para Belo Horizonte quarentenar na casa dos meus pais, aos 25 anos de idade. Dureza. 

Liguei a TV, apaguei a luz. Confesso que até consegui dançar uma música ou outra. O mais difícil, pra mim, foi a falta de interação entre os presentes. Ou, melhor dizendo, “não-presentes”.

Explico: para quem gosta de festa, a maior graça talvez não seja só a música em si, o jogo de luzes e o ambiente escuro. As outras pessoas são grande parte do que torna a aventura noturna interessante. Seja para flertar, no caso dos solteiros (como eu), ou pelo simples fato de ser tomado pela presença de, digamos, 100 ou 200 pessoas dividindo a mesma energia na pista de dança.

Os DJs até eram bons, sim. Mas como eu vou interagir com as pessoas? Cheguei a conferir a caixa de comentários do ao vivo no YouTube e, para a minha surpresa, as interações se resumiam à meia dúzia de gatos pingados elogiando a música ou fazendo pedidos de outras músicas. E, por mais que eu gostasse do que estava tocando, me dei conta de que passava mais uma sexta à noite sozinho no meu quarto, de luzes apagadas, bebendo umas e vendo um DJ executar um set a 500 quilômetros de distância de mim pelo YouTube. Desisti depois de uma hora de “balada”.

Até tentei com estilos musicais aos quais sou mais apegado. Num sábado à noite, a equipe de funk Furacão 2000 fez uma live com os clássicos das pistas, da década de 90. Dancei bastante? Dancei. Curti mais do que a pretensa “balada virtual”, talvez. Mas a trilha sonora serviu de música de fundo enquanto eu fazia outras coisas. Não me pegou. 

“Balada virtual” no Habbo Hotel, joguinho clássico do início dos anos 2000
“Balada virtual” no Habbo Hotel, joguinho clássico do início dos anos 2000
Foto: Reprodução

Minha última tentativa foi uma “balada virtual” no Habbo Hotel, joguinho clássico do início dos anos 2000 que permite a criação de avatares para interação com outros usuários. Isso num domingo à noite. Pelo menos, desta vez, consegui conversar com outras pessoas. O problema é que essa conversa em questão se resumiu a xingamentos e trolls aleatórios pixelados. Suspeito que eu estava cercado de adolescentes, mas isso é algo que não posso provar.  

Para algumas pessoas, todavia, o Habbo tem sido uma boa alternativa. Há quem esteja comemorando aniversários virtualmente, DJs famosos fazendo baladas virtuais integrando plataformas de stream com o game, enfim. Para cada um, o que funciona melhor. Pra mim, não rolou.

Conclusão

Baladas virtuais não funcionam pra mim, um jovem que ama curtir a noite e conhecer gente. Não funciona para extrovertidos que gostam de contato humano, de jogar conversa fora, de esbarrar nos crushes ou de encontrar novas paqueras. Se você se identificou com a descrição, essas lives não são pra você. 

Veja bem, é muito diferente se trancar no quarto enquanto o DJ lança “a braba”, por melhor que seja, e esfregar ombros em pessoas numa pista de dança cheia e mal iluminada no centro de São Paulo, bebendo um drink que custa três vezes o seu valor normal. Tá, talvez o lado bom seja economizar no preço da bebida, mas confesso que até dos esbarrões e empurrões nos estreitos corredores das festas eu sinto falta.

O certo é que mesmo com o controle da pandemia e uma possível flexibilização da quarentena no Brasil, grandes aglomerações de pessoas em eventos devem ser a última etapa a ser retomada. Se até teatros e cinemas ao redor do mundo estão diminuindo sua lotação máxima para evitar novos contágios, quem dirá um inferninho subterrâneo com 50 pessoas se espremendo em uma pista de dança? 

Entrevistei um DJ famoso esses dias, desses que tocam em grandes festivais, e ele me disse que os artistas trabalham com a perspectiva de voltar às pistas apenas em 2021. Longe não? Mas paciência, afinal, num cenário de milhares de mortes por conta de uma pandemia, uma das últimas preocupações deve ser o retorno das festas. Enquanto isso, se tudo o que eu disse é bobagem e funciona para você: pegue sua bebida favorita, faça login no Habbo Hotel, entre em uma sala-balada e abra o Twitch. Começou a diversão. 

Fonte: Redação Terra
Compartilhar
Publicidade
Publicidade