Acredite: banda norte-americana lança vinil com restos humanos
The Ataris utilizou cinzas do pai do vocalista da banda para a manufatura do produto, que foi vetado nos EUA
A banda norte-americana The Ataris teve uma iniciativa que gerou uma enorme polêmica nos EUA reacendendo o debate sobre limites da arte e da legislação. Em seu primeiro retorno após 15 anos de um hiato sem lançamentos, o grupo voltado ao som emo e punk melódico, decidiu homenagear o falecido pai do vocalista Kris Roe de uma forma singular: prensando parte de suas cinzas em uma edição especial de vinil.
A iniciativa da banda, embora carregada de emoção e simbolismo, acabou sendo vetada em oito estados dos Estados Unidos, reacendendo discussões sobre ética, legalidade e os limites da expressão artística.
O disco, batizado de William Charles Roe Memorial Ashes Variant, contém duas faixas: a inédita Car Song no lado A e uma nova versão de In This Diary, sucesso da banda lançado originalmente em 2003 e que, segundo Kris, era a música favorita de seu pai.
William Charles Roe faleceu em 2014, vítima de complicações relacionadas ao alcoolismo. A ideia de eternizá-lo em um vinil surgiu após Kris conhecer um serviço que permite incorporar cinzas humanas ao material do disco — uma forma de transformar luto em arte.
Em comunicado publicado no site oficial da banda, Kris Roe explicou que seu pai sempre foi um grande apoiador do The Ataris. Ele participava ativamente dos fóruns de fãs, filmava os shows e mantinha contato com a comunidade que acompanhava o grupo: "Quando descobri que era possível prensar cinzas em um disco, soube imediatamente que essa seria a melhor maneira de homenageá-lo", escreveu o vocalista.
Apesar da intenção afetiva, a iniciativa esbarrou em barreiras legais. Embora a comercialização de produtos com restos mortais humanos seja permitida em 42 estados americanos, ela é proibida em outros oito: Flórida, Geórgia, Massachusetts, Missouri, Nova Hampshire, Carolina do Sul, Texas e Virgínia. A banda, ciente das restrições, publicou um aviso em seu site pedindo que fãs residentes nesses estados não adquiram a edição especial, sob risco de cancelamento do pedido.
The Ataris: a repercussão do lançamento em vinil da banda
A repercussão foi imediata. Enquanto parte do público elogiou a ousadia e a sensibilidade do tributo, outros questionaram os limites éticos da prática. Críticos apontaram que, embora legal em muitos lugares, o uso de restos humanos em produtos comerciais pode ser visto como desrespeitoso ou até mesmo macabro. Já os defensores do The Ataris argumentam que a homenagem foi feita com profundo respeito e que a arte, por natureza, deve ser livre para explorar temas delicados.
Além do caráter pessoal, o projeto também possui um viés social. Parte dos lucros obtidos com a venda do vinil será destinada à organização Shatterproof, que atua na prevenção e no tratamento da dependência química nos Estados Unidos. A escolha da instituição não é aleatória: Kris revelou que sua família enfrentou sérias dificuldades durante sua infância devido ao alcoolismo do pai. Após anos de afastamento, os dois se reaproximaram quando William conseguiu se manter sóbrio com o apoio dos Alcoólicos Anônimos.
O lançamento do vinil também marca um novo capítulo na trajetória do The Ataris. A banda, que teve seu auge nos anos 2000, retorna com uma proposta mais madura e emocionalmente carregada. A edição especial esgotou rapidamente, tornando-se um item cobiçado entre colecionadores e fãs da cena alternativa.
O caso levanta questões importantes sobre como lidamos com o luto, a memória e os limites da arte. Até que ponto é aceitável transformar restos mortais em objetos culturais? A resposta, ao que tudo indica, depende tanto da legislação quanto da sensibilidade de cada indivíduo.
Enquanto isso, Kris Roe segue firme em sua missão de manter viva a memória do pai — não apenas em sua música, mas também em ações concretas de apoio a quem enfrenta os mesmos desafios que sua família viveu. E, para muitos, isso é o que torna essa homenagem tão poderosa: ela não apenas eterniza uma vida, mas também busca transformar dor em esperança.