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Livro de mulheres periféricas une ancestralidade e bordados

“Pangeia - Entre Elos - Palavra de Mulher” foi desenvolvido pela Coletiva Tear&Poesia e publicado em 3 idiomas: português, espanhol e yorubá

28 mar 2022 - 05h00
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Maria Rosário faz parte da Coletiva desde 2007
Maria Rosário faz parte da Coletiva desde 2007
Foto: Facebook Tear&Poesia

De acordo com estudos geológicos, há cerca de 300 milhões de anos, o planeta Terra era formado por um único e imenso bloco chamado Pangeia. Por meio das ações das placas tectônicas, esse “supercontinente” se separou, dando origem aos continentes como os conhecemos hoje.

Apesar de os seres humanos terem surgido muito tempo depois – o homo sapiens data de 300 mil anos atrás –, a ideia de um único continente norteia o livro “Pangeia - Entre Elos - Palavra de Mulher”, escrito em português e traduzido para espanhol e yorubá.

O material foi lançado neste mês de março pela Coletiva Tear&Poesia de Arte Têxtil Preta Nativa, que atua na região do Jardim São Luís, na zona sul de São Paulo.

Atividade de bordado realizada em 2019
Atividade de bordado realizada em 2019
Foto: Facebook Tear&Poesia

Com quase 20 anos de trajetória, o grupo é formado por mulheres que aprendem a arte do bordado, mas também estudam a ancestralidade presente nessa cultura e as conexões com povos indígenas, latinos e africanos.

O “Pangeia” é o primeiro livro delas e foi financiado pela Lei de Fomento à Cultura da Periferia, da Prefeitura de São Paulo, em 2020. A publicação consiste em fotografias dos bordados feitos pelas mulheres do grupo, além de textos de autores convidados.

Inicialmente, a ideia era reunir poesias de mulheres periféricas, negras e nativas, mas a pesquisa acabou levando-as a um mergulho nas origens do bordado.

“O bordado tem origem profunda na África e era feito, inclusive, por homens. Temos exemplos em Pernambuco com os maracatus, no Maranhão com a cultura do boi, e com os povos indígenas nativos de Abya Yala na América”, conta Rita Maria Carneiro, 61, produtora cultural e cofundadora da Tear&Poesia.

Segundo Rita, foi a semelhança entre o que era produzido pelos nativos brasileiros e os africanos que as fizeram pensar na Pangeia. “Convidamos pessoas para escrever sobre como seria se ainda estivéssemos num único continente. Os textos percorrem essa linha e todo o processo dos bordados vem em torno disso”, diz.

Decoração do evento de lançamento do livro
Decoração do evento de lançamento do livro
Foto: Facebook Tear&Poesia

Além da publicação e o processo que envolveu o desenvolvimento do livro, as mulheres da Coletiva também ofereceram oficinas de grafismo indígena e africano, e aulas de introdução aos idiomas yorubá e guarani.

“Essas oficinas conseguiram alcançar outro público por conta de serem virtuais. Se fossem presenciais, talvez a gente não fosse ter essa quantidade de pessoas”, celebra Rita. Ela conta que cerca de 300 pessoas se inscreveram para o curso de yorubá.

Contudo, a parte mais complicada do processo foi a produção dos painéis fotografados para a publicação.

“Quase 20 painéis foram bordados assim [sem encontros presenciais], tinha que levar o tecido com o desenho do bordado para elas [as bordadeiras] fazerem em casa. Tudo com todo o cuidado para que não ninguém se contaminasse”, explica. 

Decoração do evento de lançamento do livro
Decoração do evento de lançamento do livro
Foto: Facebook Tear&Poesia

A dona Maria Rosário Paulo, 73, foi uma das oito mulheres que participaram desse trabalho. Moradora do Parque Santo Antônio, que também pertence ao Jardim São Luís, ela faz parte do Tear&Poesia desde 2007, quando o grupo se reunia no Sacolão das Artes, no Capão Redondo, zona sul.

Maria conta que sempre mexeu com linha e agulha, mas nunca com “o valor e a importância” que encontrou no bordado.

“Lá na roça a gente usava isso [o bordado] como remendo para a roupa. Às vezes até fazia vestido de casamento, feito na mão, com agulha. A gente não tinha máquina de costura, não tinha nada. A gente improvisava alguma coisa. Nunca faço nada para mim, mas tenho prazer de ver [feito]”, diz.

Nesses mais de 10 anos juntos com a Coletiva, Maria já participou da produção de um mapa afetivo para a inauguração do Sesc Santo Amaro, em 2011, de visitas a aldeias indígenas em Parelheiros, no extremo sul da cidade, e até já deu oficinas de bordado.

Ainda assim, ela fica sem palavras ao ser questionada sobre ver o próprio trabalho em um livro. “Qualquer coisa que eu falar ainda está sendo pouco. Sou uma pessoa que veio do meio do mato mesmo, e hoje estar com nome num livro é uma coisa muito significante para mim”, conta.

O “Pangeia - Entre Elos - Palavra de Mulher” foi lançado no último dia 12 de março em um evento no Bloco do Beco, no Jardim Ibirapuera, também na zona sul. Lá, a Coletiva pôde apresentar os painéis originais da publicação.

“Foi como se você tivesse entrado no livro de fato. Vem tudo na sua cabeça e te dá muita emoção. Sou muito emotiva, me emociono com as coisas, parece ser uma pequena coisa, mas para mim é grandioso”, conta Rita Maria.

Segundo a cofundadora do Tear&Poesia, o próximo trabalho da Coletiva é desenvolver uma “biblioteca” online com textos sobre ancestralidade feminina preta e nativa, além de músicas e cantigas que contem essa história.

Maria Rosário com o livro em mãos
Maria Rosário com o livro em mãos
Foto: Facebook Tear&Poesia

Serviço

Para adquirir o livro “Pangeia - Entre Elos - Palavra de Mulher” é preciso entrar em contato diretamente com a Tear&Poesia pelo e-mail pangeiaentreelos@gmail.com ou pelas redes sociais.

O livro vem acompanhado de um calendário composto por poesias de mulheres africanas, indígenas, latinas e periféricas e um pôster, e está sendo vendido por R$ 35.

Agência Mural
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