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Startup de saúde Alice demite 63 pessoas 7 meses após aporte milionário

Empresa oferece planos de saúde corporativo e individual e recebeu em dezembro um investimento de US$ 127 milhões

11 jul 2022 - 18h04
(atualizado às 18h10)
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Sete meses após receber um aporte de US$ 127 milhões, a startup de saúde Alice entrou para a lista de empresas nacionais de tecnologia a fazer cortes em massa. O Estadão apurou que 63 pessoas foram desligadas na última sexta-feira, 8. A empresa confirmou para a reportagem o número de demitidos e afirmou que os cortes fazem parte de um "redimensionamento" da equipe de vendas. Outros 20 profissionais foram realocados dentro da empresa.

Para alguns ex-funcionários, a Alice afirmou que a empresa estava com mais funcionários que o necessário e que precisaria cortar parte do quadro por conta da situação econômica atual. Para outros demitidos, porém, a justificativa não mencionava corte de gastos ou qualquer dificuldade financeira — apenas uma reestruturação.

"Disseram que o motivo foi redução de custo da empresa. Achavam que a empresa ia crescer muito e não aconteceu, além da crise afetar também", explicou uma ex-funcionária ouvida pelo Estadão. "Individualmente não foram claros quanto ao critério dos que saíram e dos que ficaram. Infelizmente faltou transparência nisso", disse outro ex-funcionário, ao Estadão. As fontes não quiseram ser identificadas.

Startup Alice oferece plano de saúde para empresas e pessoas físicas
Startup Alice oferece plano de saúde para empresas e pessoas físicas
Foto: Divulgação/Alice / Estadão

Em nota, André Florence, CEO da healthtech, disse: "Ao longo do semestre, entendemos melhor as oportunidades de sermos mais eficientes e seguirmos sustentáveis no longo prazo". A startup informa que os vendedores desligados receberão um salário extra, plano de saúde estendido por 2 meses, além das verbas rescisórias obrigatórias.

Mudança de foco

A Alice recebeu um aporte de US$ 127 milhões em dezembro do ano passado, liderado pelo conglomerado japonês SoftBank. Na época, o investimento foi um dos maiores do setor de saúde em 2021.

Em junho deste ano, a Alice anunciou um plano de saúde corporativo com foco em negócios com até 250 funcionários. Segundo os ex-funcionários, a guinada veio após pressão de investidores para que o principal produto da empresa seja o plano voltado ao mercado corporativo.

A empresa, que nasceu focada na venda de planos de saúde diretamente para pacientes, já tinha anunciado a compra da startup Cuidas, que oferece consultas com médicos da família e enfermeiros para funcionários de empresas.

Os ex-funcionários dizem que a mudança de foco enfrentou algumas dificuldades importantes. Um deles é o fato de que a empresa se restringe apenas à cidade de São Paulo, o que deixa a oferta de produtos limitada. A segunda delas é a competição no mercado: além de outras startups do setor brigarem por espaço, operadoras tradicionais de saúde possuem boa parte dos contratos vigentes de planos corporativos. Questionada sobre o assunto, a startup não quis comentar.

Segundo os ex-funcionários ouvidos pelo Estadão, a empresa não conseguiu atingir a meta de clientes corporativos e individuais estimada para o ano. Questionada pela reportagem, a Alice preferiu não comentar.

Em maio deste ano, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regulamenta os planos de saúde no Brasil, autorizou o reajuste das assinaturas de saúde em até 15,5%, depois de congelar as altas durante a pandemia. Em seu site, a Alice afirma que seus planos sofreram reajuste de 12,13%, abaixo do estimado pela agência.

O reajuste abaixo do permitido seria uma forma de atrair clientes para a plataforma. Fontes informaram ao Estadão que o objetivo era alcançar 50 mil membros de planos individuais até o final de 2022, mas que, quando o plano corporativo ganhou a atenção da empresa, essa meta foi reduzida para 14 mil. A empresa não quis abrir seus números para o Estadão.

Inverno das startups

Conhecidas por contratar centenas de funcionários ao mês, as startups têm realizado centenas de demissões pelo mundo — o fenômeno não é exclusivo do Brasil. O período tem sido batizado de "inverno das startups", após a onda positiva causada pela digitalização da pandemia nos últimos dois anos.

Segundo especialistas consultados pelo Estadão nos últimos meses, as demissões ocorrem como reajuste de rota em meio à alta global nos preços e à guerra da Ucrânia, que desorganiza a cadeia produtiva mundial. Nesse cenário, investidores viram as costas para investimentos de risco, como startups. Com isso, levantar rodadas tem sido mais difícil do que durante a pandemia, quando a fonte do capital parecia infinita.

Fundos de investimento alertaram as startups sobre o cenário desafiador. O investidor Masayoshi Son, presidente do SoftBank, um dos maiores investidores de startups no Brasil e investidor da Alice, disse que o conglomerado japonês deve reduzir os investimentos em empresas de tecnologia neste ano devido aos maus resultados das empresas nas quais investe — as informações são do jornal Financial Times.

Além do SoftBank, a aceleradora Y Combinator, uma das mais conhecidas no Vale do Silício, recomendou que as startups reavaliassem suas finanças e que ficassem prontas para cortar gastos. A medida, de acordo com a aceleradora, é uma forma de prever até 24 meses sem investimentos. "Crises econômicas geralmente se tornam grandes oportunidades para os fundadores que mudam rapidamente sua mentalidade, planejam com antecedência e garantem que sua empresa sobreviva", afirmou a gestora na carta.

Estadão
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