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Inovação

'Há um hype exagerado sobre agentes de IA', diz futurista que vem ao Brasil

Ian Beacraft, que vai dar palestra na Rio Innovation Week, fala ao 'Estadão' sobre o impacto da tecnologia em empresas e trabalhadores

18 jul 2025 - 09h10
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No hype em torno da inteligência artificial (IA), a expressão mais conhecida de 2025 é agente de IA, que indica sistemas capazes de automações complexas, que poderiam substituir partes inteiras de organizações. No entanto, até para quem vive de olhar para o que ainda está por vir no horizonte, há barulho exagerado sobre o tema.

Ian Beacraft, que vem ao Brasil em agosto para participar do Rio Innovation Week (RIW), está acostumado a olhar para o impacto da tecnologia em empresas, carreiras e trabalhadores. Futurista e fundador da consultoria Signal and Cipher, que acaba de abrir escritório no Brasil, ele também acredita que a capacidade da "IA agêntica" foi inflada — e que muitos projetos vão fracassar.

Para ele, no entanto, isso não é um problema inerente à tecnologia, mas sim à maneira como projetos digitais são executados nas organizações. Em um momento em que os algoritmos parecem ter chacoalhado as certezas e convicções de executivos, ele afirma que projetos do tipo precisam de clareza e confiança. É preciso, acima de tudo, humanidade.

Beacraft conversou com o Estadão antes de sua viagem até o Rio de Janeiro. Ele tratou de transformação digital, impacto da IA nas organizações e mudanças na vida de trabalhadores. Muitos desses temas serão discutidos em sua palestra no País — o Estadão é parceiro de mídia do RIW e fará uma ampla cobertura de palestras e atividades entre 12 e 15 de agosto.

Ian Beacraft vem ao Brasil para o Rio Innovation Week
Ian Beacraft vem ao Brasil para o Rio Innovation Week
Foto: Divulgação/Ian Beacraft / Estadão

Veja os principais momentos da conversa abaixo.

O sr. anunciou recentemente que está abrindo um escritório no Brasil. Quais são as oportunidades que você enxerga no País?

O Brasil é a nossa primeira expansão internacional e eu passei os últimos três anos conhecendo melhor o mercado. O que me atraiu foi a fusão única de criatividade e ambição, a composição de oportunidades no mercado, bem como a política e regulamentação que estamos começando a ver se materializar, que estão encorajando algumas dessas oportunidades. O nosso objetivo não é simplesmente importar um modelo dos EUA, mas sentar com as empresas brasileiras para desenvolver em conjunto o futuro do trabalho para as organizações, considerando suas restrições, equipes, oportunidades e desafios.

Há algum setor específico que o sr. esteja focado?

Nosso foco principal é trabalhar de forma agnóstica em termos de indústria, com equipes executivas e o foco principal é fazer com que elas pensem e ajam de forma diferente. Um dos principais desafios é que muitas pessoas ainda estão presas no paradigma da revolução da transformação digital. E o que continuamos dizendo é que a transformação não acontece em PowerPoint. Para nós, a única vez que a transformação realmente acontece é quando o modelo mental antigo de um líder se quebra. Isso não acontece em uma apresentação de PowerPoint. Não acontece em treinamento. Acontece quando eles têm a oportunidade de passar da teoria para a realidade. E é essa mudança, essa transição, que faz alguém ver o mundo de forma diferente.

A ideia de transformação digital é ampla e contínua. Nunca termina. Como as empresas podem se adaptar a novos ciclos que surgem todos os dias sem perder os investimentos anteriores e também sem se frustrar com o que já foi feito?

Quando se trata de transformação digital, um dos maiores desafios é que muitas iniciativas de transformação digital vêm com um cronograma de três a cinco anos. Você vê tipo, "ok, estamos implementando este ERP e essa é a estratégia de transformação digital". Mas o maior problema que vejo, especialmente em equipes executivas, é que eles tendem a ver a transformação como uma linha de chegada. Vivemos em um mundo onde a mudança é constante e, portanto, a capacidade de adaptação também deve ser constante. E uma das coisas em que nos concentramos é ajudar as empresas a perceber que seus investimentos passados não são custos irrecuperáveis, porque o investimento passado age como um trampolim para o que vem a seguir. Haverá algo depois da IA. Isso pode ser difícil para as pessoas imaginarem, porque é a coisa que está diante de todos nós agora. Mas o fato é que daqui a 500 anos o mundo será outro. Então, não podemos pensar na transformação como um lugar onde chegamos.

Qual é o maior erro que uma empresa pode cometer ao tentar trazer novas tecnologias para o ciclo de transformação digital?

Acho que o maior erro que as organizações cometem ao tentar implementar uma nova tecnologia é tratá-la como um projeto de TI, em vez de uma mudança cultural. Foi assim que fizemos a transformação digital. Trouxemos a tecnologia e todos tiveram que se adaptar. Era assim que grandes projetos de infraestrutura funcionavam. Uma das coisas que é única na IA é que é a primeira tecnologia que pode se adaptar a indivíduos em larga escala. E estou vendo muitas organizações tratando ela da mesma forma que introduziram novos sistemas de e-mail ou sistemas de banco de dados ou sistemas ERP.Isso é muito diferente. O maior desafio que vejo agora é que a tecnologia fica apenas com o CTO, quando o grupo mais importante está em toda a organização. Você precisa envolver o CEO, CTO, CFO e, mais importante ainda, o CHRO, porque isso muda tudo sobre processos e trabalhos e as funções que você vai desempenhar. Então, se você não reúne todos que impactam a cultura, as finanças, as operações e as pessoas, você terá um cenário muito incompleto de como essa mudança precisa acontecer.

Quais são os projetos mais desafiadores em que sr. trabalhou até hoje?

Os maiores desafios foram ajudar os clientes a entender que essa é tanto uma mudança cultural quanto uma mudança tecnológica. E o que precisamos analisar é que não estamos apenas tentando fazer a mesma coisa que fazíamos antes, só que melhor, mais rápido e mais barato. A maioria das organizações opera com métricas de consistência, clareza, eficiência, escalabilidade, repetibilidade. Essas são coisas que funcionam muito bem em um ambiente onde o sistema é estável e os desafios são bem conhecidos. É assim que temos administrado empresas nos últimos 50, 75 anos. Muitas das métricas que medimos hoje são precisamente as mesmas que teríamos medido no início dos anos 1900 ou final dos anos 1800. Fizemos algumas modificações, porém, quando os sistemas mudam ao redor da organização e as coisas são dinâmicas, essas métricas não servem para o próximo paradigma. Você também precisa mudar os incentivos. Você precisa mudar as operações. Você precisa dar às pessoas uma visão clara do que vai acontecer. Se você não fizer essas coisas, você não descobrirá a verdadeira capacidade nativa e a oportunidade que é inerente a essa tecnologia. E outras empresas ultrapassarão você.

Quais são as limitações da IA como tecnologia? E quais são as nossas limitações para explorar a IA?

Essas duas coisas andam de mãos dadas. Eu acho que as limitações da tecnologia e os limites de como as exploramos criam duas das restrições mais importantes em torno do avanço da IA em nossas organizações. Quando se trata das limitações da tecnologia, há algo que chamamos de fronteira irregular e inteligência irregular. É a ideia de que se a IA faz algo muito bem, ela também deve fazer bem algo relacionado à primeira tarefa — até que descobrimos que ela faz mal essa nova tarefa. Esta é a primeira vez que estamos construindo o futuro sistema operacional de nossas empresas e indústrias em uma tecnologia sobre a qual entendemos completamente. Este é um terreno muito difícil para nós percorrermos. Portanto, as limitações da tecnologia são reais e, se não forem abordadas de forma eficaz, podem causar muita frustração. A outra é quão bem somos capazes de adaptar nossas empresas. Isso se refere à mudança de mentalidade, processo e treinamento e requalificação de nossas pessoas. Um dos maiores desafios para as organizações é que os líderes vivem dizendo que a IA é importante, mas eles não definem o que isso significa para seus funcionários. E a falta de clareza cria medo, que leva à ansiedade e à resistência. A confiança não vem da tecnologia. A confiança vem das pessoas.

Como encontrar o equilíbrio entre a experimentação com a IA e a definição de metas para projetos?

Uma das coisas em que nos concentramos é criar métricas específicas em torno dessa mudança. Dependendo do seu departamento, você pode medir a taxa de difusão do aprendizado. Ou seja, quão rápido o conjunto de habilidades está sendo difundido dentro da organização. Outro exemplo são coisas como o número de protótipos desenvolvidos por uma equipe e, em seguida, a proporção de protótipos para comercialização. É importante estabelecer não apenas uma guia clara em sua estratégia - "aqui está nossa visão" - mas também métricas concretas em torno dos comportamentos. Isso é o que dá às pessoas a motivação, a estrutura e o roteiro para dizer: "Ah, ok, é para cá que estamos indo. Isso é o que é importante e isso é o que se espera de mim". Essas três coisas ajudam a criar um impulso dentro da organização que realmente gera valor.

É comum que a tecnologia ocorra de maneira heterogênea não apenas na sociedade, mas também dentro das empresas. Há funcionários mais engajados e curiosos do que outros. Como as empresas podem tornar esse movimento mais homogêneo dentro de seus negócios?

Sempre haverá essa diferença entre os primeiros a adotar e as pessoas que são mais relutantes. A maneira como vejo isso é a seguinte: você precisa projetar a adoção como um movimento, não como algo obrigatório. O que quero dizer com isso é que muitas iniciativas de adoção de novas tecnologias emergentes vêm de cima para baixo. O melhor é criar esses convites para participar, oportunidades para que alguém encontre valor para si mesmo. Só assim a pessoa será realmente compelida a fazer isso. Para as pessoas verem esse valor e se engajarem, elas precisam ver outras pessoas tendo sucesso em um contexto que lhes importa.

A expressão da vez é "agentes de IA". Qual é a sua opinião sobre o potencial da tecnologia?

Acho o hype muito exagerado. Eu me sinto da mesma forma que Andrej Karpathy e Andrew Ng e vários outros líderes. Isso realmente existe, mas os profissionais de marketing se apossaram e transformaram em algo que não é. O que estamos vendo como IA no espaço de automação e agentes é 90% arquitetura de software e fluxo de trabalho de automação. Talvez, 10% de IA real. Estão se referindo a agentes como se fosse um "pó mágico", que, de repente, você usa e ganha um sistema de IA tipo Jarvis [do filme o Homem de Ferro].

Então, não é surpresa para você a projeção da Gartner de que 40% dos projetos de agentes de IA serão cancelados até 2027.

Acho, inclusive, que o número é baixo. No momento, estamos vendo 85% de todas as iniciativas falharem. E não é por causa da tecnologia, é por causa da maneira como a estamos abordando. Isso vem de nossos velhos modelos mentais. O novo cenário é sobre cultura, estratégia, dinâmica de mercado e nossas organizações. Tudo isso precisa ser considerado em estratégia de IA. As percepções sobre o que agentes são capazes de fazer estão superestimadas e farão um desserviço a muitas dessas iniciativas. Mas acho que, mesmo que seja uma taxa de fracasso de 60% a 70%, isso não é uma coisa ruim. Precisamos experimentar, porque a taxa de sucesso de 15% se torna 25%, 45%, 85% ao longo do tempo. Aprendemos com o fracasso tanto quanto aprendemos com o sucesso.

Como os trabalhadores podem navegar nesse cenário complexo de aprender uma nova tecnologia, enquanto há pressão para projetos que envolvam essa mesma tecnologia?

É paralisante para muitas pessoas. Elas não sabem por onde começar. E meu conselho é "começar pequeno, construir hábitos, não buscar heroísmos". Você não precisa aprender tudo de uma vez e se tornar um especialista em IA da noite para o dia. Se você olhar seu feed do LinkedIn, talvez sinta que está muito atrasado, mas não é o caso. Eu diria para começar a usar IA diariamente, mesmo que seja para tarefas básicas. Encontre coisas em sua vida para as quais ela possa ser impactante e você começará a ter experiência. O mais importante, não faça isso sozinho. Encontre colegas que estejam fazendo algo, que também estejam aprendendo, colabore com eles e compartilhe as vitórias, compartilhe os fracassos, e olhe para a IA como um esporte coletivo.

Empresas gigantes já admitem demissões em massa por conta de IA: Microsoft, Amazon, Ford e outras. A IA veio para ajudar empresas e não os trabalhadores?

Estamos vendo uma narrativa mais presente nas notícias do que a outra, porque ela está afetando muitas pessoas. Existe uma conversa de que as empresas ainda estão tentando reequilibrar as contratações feitas da pandemia, mas acho que isso não faz mais parte da equação. Outra coisa é que a maioria dessas demissões também vem de big techs que construíram todo o seu sistema operacional na própria tecnologia, o que significa que as coisas para as quais elas foram projetadas são mais propensas a serem integradas em sistemas que podem ser integrados pela IA. Isso significa que muitas das funções que eles têm são mais automatizáveis, o que é meio irônico, dado o fato de que são empresas de tecnologia. Não dá para fingir que cargos não vão mudar ou que certas ocupações que eram necessárias antes não serão eliminadas. Essa é uma dura realidade. O que precisamos fazer é criar uma rede de segurança e um aparato para requalificar as pessoas, para lhes dar a oportunidade de entender para onde suas ocupações estão indo. E isso exige um acordo de ambos os lados para criar esse ambiente onde automação e demissão não sejam a única solução.

Já existem vagas criadas para que humanos detectem erros gerados por IA, especialmente IA generativa. Esse ciclo faz sentido?

É maluco, não é? A estrutura atual dos sistemas de IA é projetada para imitar a mente humana e os humanos são incrivelmente falíveis. Então, quando você projeta um sistema para imitar isso, ele vai replicar várias dessas particularidades. Então, por mais interessante e engraçado que isso pareça, faz sentido. E acho que é também de onde virão os novos empregos. Por exemplo, em vibe coding na e construção de sistemas agênticos, se você tem erro em um prompt, toda resposta será ruim. Há um efeito em cascata que se amplifica em todo o sistema. Com vibe coding, as pessoas dizendo: "Ok, eu construí este aplicativo em um dia e posso colocá-lo em produção". Mas essas coisas estão cheias de falhas de segurança. A razão pela qual estamos tendo que contratar pessoas para consertar isso é a nossa incompatibilidade de expectativas sobre onde essa tecnologia funciona. Ou seja, se vemos sucesso em um lugar, automaticamente pensamos que podemos obter sucesso em todos os outros lugares. Mas estamos precisando meio que recuar. Estamos navegando neste território onde ainda não sabemos os limites do que funciona e do que não funciona. E às vezes acertamos, às vezes não.

Informações sobre o Rio Innovation Week 2025

  • Data: 12 a 15 de agosto de 2025;
  • Horário: 10:00 às 21:00;
  • Local: Pier Mauá, Av. Rodrigues Alves, 10 - Praça Mauá, Rio de Janeiro;
Estadão
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