Comunidade muçulmana vê "explosão" da islamofobia na França

Associação diz que denúncias de casos aumentaram após atentados; muçulmanos questionam segurança especial a judeus

13 jan 2015 - 14h18
(atualizado às 14h56)
Grande Mesquita de Paris recebeu a proteção de policiais nesta terça-feira
Grande Mesquita de Paris recebeu a proteção de policiais nesta terça-feira
Foto: Fernando Diniz / Terra

Apesar do discurso de união que paira entre os franceses, a comunidade muçulmana tem observado um aumento do número de casos de islamofobia, que vão desde ataques a templos religiosos até ameaças nas ruas. O Coletivo Contra a Islamofobia na França (CCIF), uma associação que orienta vítimas de atos de preconceito e agressão, diz que houve uma “explosão” de denúncias desde quarta-feira passada, depois do ataque à redação da revista satírica Charlie Hebdo.

“Já são cerca de 80 casos de islamofobia que recebemos, como ataques, degradação e tiros em prédios, insultos. É um número enorme, uma verdadeira explosão”, diz Hafid Bouzadi, um dos membros do coletivo, enquanto saía do enterro do policial Ahmed Merabet, executado à queima roupa pelos terroristas Cherif e Said Kouachi, após o atentado à redação.

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No cemitério muçulmano de Bobigny, no subúrbio de Paris, o enterro de Ahmed recebeu centenas de pessoas. “Um bom muçulmano”, diz a vizinha Linda, cuja família é muito próxima aos parentes do policial. “Não era extremista. Um homem muito gentil e ambicioso.”

Apesar do esforço em diferenciar os seguidores do Islã dos extremistas, a preocupação do aumento da islamofobia é uma realidade. “Eu me sinto ameaçada quando porto o hijab (véu que cobre o cabelo), não uso na rua. Coloquei aqui porque estou numa cerimônia. Os muçulmanos só se sentem bem quando estão entre eles”, diz a secretária administrativa Kahine, que também acompanhava o enterro. As ameaças contra mulheres representam 85% das denúncias recebidas pelo CCIF.

Membro de associação muçulmana diz que denúncias de ataques a prédios e ameaças aumentaram após atentados
Foto: Fernando Diniz / Terra

Para Kahine, o governo francês contribui para estigmatizar os muçulmanos e a dividir o país quando determinou, na última segunda-feira, a proteção de 717 locais de culto e ensino judaicos. “Respeitamos nossos irmãos judeus, mas infelizmente a França faz uma divisão”, diz.

A mesma preocupação é manifestada por Arnaud, um jovem agente da companhia de trens da França. “Eu, pessoalmente, penso que o governo procura apontar o dedo: é essa comunidade. E é o governo que pode fazer a islamofobia crescer”, disse, enquanto comprava um livro em frente à Grande Mesquita de Paris.

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“Os que vão ser primeiramente estigmatizados são os muçulmanos. A gente entende a proteção nas sinagogas e nas escolas, mas e os muçulmanos? Já se sabe de ataques a mesquitas depois dos atentados”, acrescentou.

Entre os seguidores do Islã, o consenso é que os terroristas que usam a religião para matar não os representam. “Um assassino é um assassino. Um assassino não pode pertencer a nenhuma religião. Ele está contra as leis de Deus”, diz o responsável pela livraria, que pediu para não ser identificado.

Nesta terça-feira, policiais fortemente armados chegaram para reforçar a segurança no entorno da Grande Mesquita de Paris. A vigilância sem distinções é defendida pelo rabino Phillipe Haddad,  da sinagoga da rua Copernique, em Paris.

“Temos que proteger as mesquitas também, os prédios do Estado, não temos escolha”, disse o religioso, que foi ao enterro do policial muçulmano morto. “Evidentemente que vai haver reações de violência islamofóbicas. É importante reafirmar a unidade nacional. Essas diferenças religiosas devem ser entendidas como uma harmonia cultural, e não de conflito entre os homens e as religiões”, afirmou.

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O reitor da Grande Mesquita de Paris, Dalil Boubakeur, disse ter ficado emocionado com a ida de representantes da comunidade judaica no enterro de Ahmed. “Eu acredito até o fim que nosso país é um país de paz, que todos temos os mesmos direitos.”

Foto: Arte Terra

 
Fonte: Terra
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