Especialistas investigam a chamada "dependência de internet"

11 jun 2010 - 08h34
(atualizado às 10h12)
Tara Parker-Pope

Os seus amigos no Facebook são mais interessantes do que os da vida real? O acesso de alta velocidade à Internet o tornou impaciente com a lentidão de algumas crianças? Você às vezes pensa em usar o fast forward e de repente percebe que a vida não vem com controle remoto?

Uso excessivo de tecnologia pode remodelar a personalidade, dizem especialistas
Uso excessivo de tecnologia pode remodelar a personalidade, dizem especialistas
Foto: Divulgação

Caso sua resposta a qualquer dessas perguntas tenha sido afirmativa, a exposição à tecnologia pode estar lentamente remodelando a sua personalidade. Alguns especialistas acreditam que o uso excessivo da internet, celulares e outras tecnologias podem fazer com que nos tornemos mais impacientes, impulsivos, esquecidos e ainda mais narcisistas.

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"A vida mais e mais se assemelha a uma sala de chat", disse o Dr. Elias Aboujaoude, diretor da Clínica de Controle de Distúrbios de Impulsividade, na Universidade Stanford. "Estamos pagando o preço em termos de vida cognitiva, devido ao estilo de vida virtual que adotamos".

Dedicamos muito tempo aos nossos aparelhos, e alguns estudos sugeriram que a dependência excessiva de celulares e internet é equivalente a um vício. Sites como o netaddiction.com oferecem testes de autoavaliação para determinar se a tecnologia se tornou uma droga. Entre as questões usadas na identificação de riscos estão: você negligencia seus afazeres caseiros para ficar online mais tempo? Verifica seu e-mail frequentemente? Perde o sono com frequência por ficar conectado de madrugada? Se as respostas forem afirmativas, a tecnologia pode estar prejudicando sua vida.

Em estudo que será publicado pela revista Cyberpsychology, Behavior and Social Networking, pesquisadores da Universidade de Melbourne, Austrália, sujeitaram 173 universitários a testes para medir o risco de comportamentos problemáticos de internet e quanto a jogos de azar. Cerca de 5% dos participantes mostraram sinais de problemas quanto ao jogo, e 10% deles mostraram resultados suficientes para colocá-los no grupo de risco quanto ao "vício" em internet.

O uso da tecnologia estava claramente interferindo com a vida cotidiana dos estudantes, mas defini-lo como vício talvez seja ir longe demais, diz Nicki Dowling, a psicóloga clínica que comandou o estudo. Ela prefere a definição "dependentes de internet".

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Tipicamente a preocupação quanto à nossa dependência com relação à tecnologia é que subtrai tempo ao convívio com amigos e familiares no mundo real. Mas os psicólogos recentemente se intrigaram com um efeito mais sutil e insidioso de nossas interações online. Talvez o imediatismo da internet, a eficiência do iPhone e o anonimato das interações em chat mudem o cerne do que somos, questões que Aboujaoude considera em um novo livro sobre virtualidade que sai no ano que vem.

Aboujaoude também questiona se a vasta armazenagem de dados oferecida pelos sistemas de e-mail e a internet está impedindo as pessoas de deixar que o passado se vá, prendendo-as a muitas recordações desnecessárias e impedindo que acumulem novas experiências. Hoje em dia, tudo é armazenado na memória eletrônica, diz, de um e-mail inócuo enviado depois de um almoço de negócios a uma briga online com um cônjuge.

"Se a pessoa não consegue esquecer porque tudo aquilo está sempre presente, que efeito isso tem sobre a capacidade de criar memórias novas e lembrar coisas dignas de recordação?", ele diz. "Se você tem 500 fotos de suas férias no Flickr, em lugar de cinco fotos realmente significativas, isso muda a capacidade de relembrar os momentos dignos de recordação?"

E tampouco existe modo fácil de superar a dependência em tecnologia. Nicholas Carr, autor de um livro sobre os efeitos da internet no cérebro, diz que responsabilidades sociais e familiares, trabalho e outras pressões influenciam nosso uso da tecnologia. "Quanto mais profundamente a tecnologia está inserida nos padrões da vida cotidiana, menos escolha sobre se e como deveremos utilizá-la", ele afirmou em recente post sobre o tema.

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Alguns especialista sugerem simplesmente reduzir o tempo passado online, por exemplo estabelecendo limites para o número de vezes em que você verifica seu e-mail, ou deixando o celular em casa ocasionalmente.

O problema se parece com um distúrbio alimentar, disse a Dra. Kimberly Young, professora da Universidade St. Bonaventure, em Nova York, que realizou pesquisas sobre o aspecto vício da tecnologia online. A tecnologia, como a comida, é parte essencial da vida cotidiana, e quem sofre de um distúrbio de comportamento online não pode abandonar completamente o seu uso, e em lugar disso precisam aprender moderação e uso controlado. Ela sugere terapia para determinar as questões subjacentes que despertam a necessidade de que uma pessoa use a internet "como via de escape".

O Centro Internacional de Mídia e Estudo de Causas Públicas da Universidade de Maryland pediu que 200 alunos passassem um dia sem usar a mídia eletrônica. Os relatórios que eles apresentaram posteriormente sugerem que abandonar a tecnologia de vez não só cria dificuldades logísticas consideráveis como muda a capacidade de conexão com os outros.

"Trocar mensagens de texto e instantâneas com meus amigos sempre me reconforta", escreveu um aluno. "Sem esses dois luxos, sinto-me sozinho e isolado de minha vida. Embora estude com outros milhares de alunos, o fato de que não possa me comunicar com alguns deles usando a tecnologia se provou quase insuportável".

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