“A periferia poderia receber muita gente”, diz ativista sobre hospedagem na COP 30
Por que diante da falta de locais e dos preços exorbitantes de hospedagem, bairros periféricos não viram opção em Belém?
Capital paraense poderia se inspirar em iniciativas que dão certo há muito tempo, como o turismo em favelas cariocas, onde brasileiros e gringos comem, dormem, passeiam, tiram fotos e voltam felizes para casa.
Moradias alugadas nas periferias – as “baixadas”, como são chamadas em Belém – poderiam resolver o mais recente problema da COP 30, que é a falta de locais para hospedagem e preços exorbitantes, quando existem vagas.
Na capital paraense, inúmeros bairros são vizinhos ao Parque da Cidade, onde acontecem os principais eventos da COP 30. Maracangalha, Marambaia, Sacramenta e Curió, por exemplo, estão a minutos de distância, caminhando.
Mas esses e outros locais não estão sendo mobilizados. Segundo Andrew Leal, 27 anos, arquiteto e urbanista, o preconceito e a falta de iniciativas oficiais são fatores que ajudam a explicar a exclusão.
Leal é idealizador do Observatório das Baixadas, uma das organizações de periferia mobilizadas para atuar paralelamente à COP 30, discutindo as demandas de quem sofre diretamente os efeitos das mudanças climáticas. Ele falou ao Visão do Corre.
Por que as pessoas da periferia não colocam suas casas para alugar?
Não colocam por um certo receio de como as pessoas possam ver isso. Posso te dar cem por cento de certeza: muita gente na periferia gostaria de colocar suas casas para alugar na COP. Mas existe um preconceito com a região Norte, especialmente com as periferias.
Você esteve na Alemanha, no evento de preparação para a COP, você percebeu esse preconceito?
Sim, estive na cidade de Bonn. Existe um estereótipo muito forte, principalmente com a Amazônia, todo mundo acha que é mato, só tem floresta, não tem cidade, nem áreas urbanas. Isso dificulta.
O que vocês, que atuam nas periferias, estão fazendo em relação a isso?
A gente tentou incentivar as pessoas das periferias a receberem gente de fora, só que, para fazer isso, a gente precisaria de tempo. Estamos realizando muitas ações, não deu para levar à frente. Tentamos até criar um mapa com zonas periféricas que poderiam receber pessoas, casas, famílias, seria muito interessante, porque está faltando leito. A periferia, com certeza, conseguiria receber muita gente.
Existem bairros periféricos próximos aos locais de realização da COP 30?
A gente tem periferias muito próximas do Parque da Cidade, local principal da COP 30. Da Terra Firme, por exemplo, dá uns quinze minutos, no máximo, de carro ou moto. Mas falta esse apoio municipal, estadual e até federal de incluir, de fato, as comunidades periféricas dentro desse ambiente que está se criando de hotelaria alternativa em Belém, como a hospedagem nas escolas.
Então o motivo da exclusão não é geográfico?
Vai se reproduzir o que foi feito em outros países, que é evitar que as pessoas de fora olhem para o lado mais esquecido da cidade. Quando a gente esteve em Baku, no Azerbaijão, no ano passado, a gente foi para um mercadão público bem distante do centro, e vimos a pobreza de uma cidade rica, cujo uso do mármore é impressionante, porém uma parte não tem asfalto, havia ônibus caindo aos pedaços.
A ideia é mostrar a parte estruturada de Belém?
Imagino que vai existir essa política de tentar ocultar uma parte da cidade que sofre com as mazelas da falta de estrutura urbana. Até por isso não existe esse engajamento, mas se tivesse, com certeza não estaria tendo esse problema de hotelaria em Belém. O mercado está se aproveitando e passando uma imagem terrível para o Brasil e para o mundo.