Por que o diagnóstico do câncer ainda é um desafio no Brasil? Especialistas respondem
Oncologistas e pesquisadores debateram os gargalos associados à doença no Summit Saúde e Bem-Estar
Apesar dos avanços tecnológicos nas estratégias de tratamento para diversos tipos de câncer, o rastreamento e o diagnóstico ainda são desafiadores no Brasil. Desinformação, baixa integração entre setores de atendimento e falta de profissionais especializados estão entre os fatores apontados por especialistas no Summit Saúde e Bem-Estar, promovido pelo Estadão nesta terça-feira, 21.
"Sabemos que a detecção precoce aumenta as chances de cura, então temos que fazer o básico bem-feito, ampliar o que já fazemos de uma forma mais eficaz", afirmou Renata Arakelian, oncologista da Rede Américas e dos hospitais Nove de Julho e Santa Paula.
Para a médica, não há falta de equipamentos para detecção, mas é preciso acionar toda a rede para as etapas que acontecem em seguida: "Depois da mamografia, tem de ter alguém que faça a leitura, que informe a paciente de que existe um problema, aí ela precisa ter acesso a exames diagnósticos e depois ao serviço de tratamento, então existem vários gargalos".
Apesar das campanhas de conscientização para busca da mamografia, o câncer de mama ainda é um dos que mais atingem as mulheres brasileiras. Outro tipo de câncer que preocupa autoridades e profissionais de saúde é o colorretal.
Os cânceres de colo do útero, mama, pulmão e colorretal são os mais rastreáveis, ressaltou Angélica Nogueira Rodrigues, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Assim como em outros tipos de câncer, as causas podem ser multifatoriais, mas é possível combater a doença a partir da detecção precoce, destacaram os especialistas.
Falta de patologistas
Entre os principais entraves, Victor Piana de Andrade, CEO do A.C.Camargo Cancer Center, destacou o déficit de profissionais capacitados para o diagnóstico.
"O diagnóstico correto é um elemento central e existem patologistas especializados para cada tipo de tumor", afirmou. "São mais de 800 (tipos), é uma ciência muito diversa. Saber os 'nomes' e 'sobrenomes' (dos tumores) não é simples, mas a organização da oferta de serviços e a previsão do tratamento nascem a partir do diagnóstico."
"Nós temos ? dos patologistas que deveríamos ter no País", disse Andrade, ressaltando que os profissionais existentes estão distribuídos de forma desigual pelo território nacional. "É mais séria a (questão da) distribuição deles. Há grandes vazios no Brasil e o País vive um desafio enorme."
Recentemente, o Ministério da Saúde anunciou uma parceria com o A.C.Camargo para estruturar centros de diagnósticos, formar patologistas e criar uma rede para que profissionais de regiões distantes possam se comunicar e discutir os exames. No curto prazo, o hospital tem trabalhado na elaboração de laudos de pessoas à espera do diagnóstico.
Acesso à informação
Para Lenio Alvarenga, diretor médico da Novartis, ainda há muito temor em torno do diagnóstico, mas o acesso à informação deve ser trabalhado para desconstruir essa ideia: "Quem procura acha, sim, mas achar antes é sempre melhor."
"O câncer avançado é um grande drama da oncologia. A gente precisa fazer esta mudança: sair do (diagnóstico de) câncer avançado para o (de) câncer precoce", acrescentou Andrade. Segundo ele, se descoberto logo no início, o câncer pode passar a ser uma doença mais simples de tratar do que o diabetes.
Prevenção
Quanto à prevenção, os painelistas concordaram que é preciso estimular a redução da obesidade e do sedentarismo. "Podem parecer medidas bobas, mas elas têm um impacto grande na prevenção, especialmente em jovens", disse Renata.
"As pessoas estão sobrecarregadas, especialmente as mulheres que têm grandes jornadas de trabalho e são provedoras. A alimentação e a atividade física ficam para depois, e temos de mostrar a importância dessas coisas, que podem ser simples, mas têm um impacto enorme."
Outras formas de prevenção, lembrou Angélica, são evitar o tabagismo e o consumo de bebidas alcoólicas; fazer os exames preventivos, como a mamografia e a colonoscopia; e tomar as vacinas contra HPV e hepatite B.