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No futuro, pode haver pandemia da saúde mental

Pesquisa realizada por consultoria aponta que 73% dos 400 brasileiros entrevistados foram emocionalmente impactados pelo isolamento social

21 set 2020 - 13h07
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Uma pesquisa divulgada este mês pela consultoria Conversion mostrou que 73% dos 400 brasileiros entrevistados foram emocionalmente impactados pelo isolamento social. O estresse foi o mais indicado por eles (42,5%), seguido por tédio (41,5%) e crise de ansiedade (33%). A brasiliense que optou por manter anonimato relata que o medo de sair de casa despertou a síndrome do pânico, quadro que ela não apresentava havia muitos anos. E a avalanche de notícias sobre o novo coronavírus tornaram-se gatilhos para crises de ansiedade.

"A pandemia gera uma diversidade grande de estressores, de natureza diferente. É muito diferente passar pela doença e estar com medo de morrer ou ter sequela, ou ter medo de algo acontecer com o pai, de perder o emprego, de ficar confinado sozinho e começar a sentir solidão. No geral, estressores do tipo perigo levam mais para quadros de ansiedade. Situações de perda levam mais a quadro depressivo", explica o psiquiatra Diogo Lara, membro do Comitê Técnico da Aliança para a Saúde Populacional (ASAP).

O médico diz que um mesmo elemento estressor pode se manifestar de diferentes formas em cada pessoa. A depressão pode levar tanto a um desejo de ficar só na cama ou a um quadro de alcoolismo. E um mesmo indivíduo, que já possui algum transtorno mental, pode desenvolver outros tipos. Tudo está relacionado ao que é ativado no cérebro.

"O sofrimento psíquico tem elementos em comum, que são mais semelhantes do que diferentes. Exemplo disso é que um mesmo remédio pode servir para quatro transtornos", afirma Lara. Na avaliação do psiquiatra, a pandemia atual proporcionou um deslocamento geral da saúde mental para pior. Quem não sofria com isso passou a sofrer. Quem já tinha algum quadro viu o problema se intensificar. A preocupação agora é com o futuro.

No futuro, uma pandemia de saúde mental pode ocorrer

A instrumentadora cirúrgica e laserterapeuta Priscilla Martin percebe que a pandemia tem sido pior para as crianças, a exemplo do filho dela. "Vejo ele chorando porque tem saudade dos amigos, da escola. As aulas on-line estão massacrando eles. A rotina para ele está péssima." A preocupação dos especialistas é que esses níveis de estresse levem a uma pandemia de saúde mental no futuro, que também terá reflexos dos adultos que sofrem hoje.

"Crianças que buscavam apoio e segurança nos pais sentem que eles estão ansiosos, angustiados, num movimento de vida que é totalmente diferente do conhecido. Elas consomem essa insegurança e estão em um momento de estresse que ainda não sabem identificar e falar sobre o que estão sentindo", alerta a psicóloga Cristina Laubenheimer.

O psiquiatra Diogo Lara completa que o acúmulo de estresse hoje, em diferentes intensidades, pode fazer as crianças entenderem que o mundo é perigoso e as pessoas são frágeis. "Isso é introjetado como se fizesse parte da personalidade dela e pode enxergar o mundo com um filtro mais negativo e assustado", diz. Ele indica que, talvez, as taxas de saúde mental não voltem ao basal e que fique uma marca, com chance aumentada de transtornos para várias pessoas.

Estudos acerca do surto de SARS - outro coronavírus que matou mais de 800 pessoas - no início dos anos 2000 mostram que sobreviventes da infecção se recuperaram fisicamente da doença, mas experimentaram declínio na saúde mental. Há registros de um quarto dos pacientes desenvolverem estresse pós-traumático e 15,6% tendo transtorno depressivo 30 meses após a contaminação. Segundo os pesquisadores, o surto "pode ser considerado uma catástrofe de saúde mental".

Estadão
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