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Mãe de jovem com síndrome de Down estuda gastronomia para acompanhar filho nas aulas

Deise Campos frequentou os dois anos de graduação como acompanhante psicopedagoga de Guilherme

21 mar 2019 - 12h14
(atualizado às 13h11)
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Guilherme Campos sempre gostou de cozinhar. Desde pequeno, por influência do pai e da avó materna, se arriscava na cozinha. Aos 23 anos, formou-se em gastronomia pela Universidade Anhembi Morumbi. A história pode parecer comum, mas acumula vários desafios e lições inspiradoras por trás.

Apesar de Guilherme ter síndrome de Down, alteração genética causada por um erro na divisão celular, sua mãe nunca aceitou que fosse deixado de lado. "Sempre acreditei no potencial dele. Se a escola não dava atenção, trocava. Há 25 anos, a inclusão era uma coisa super difícil, nem se falava, então as escolas não queriam aceitar. Nunca fui radical com isso. Queria que ele fosse amado, aceito e recebido como qualquer outra criança", conta Deise Campos, mãe de Guilherme, de 25 anos, e Renata, de 29.

Além da influência em casa, a gastronomia passou de paixão a profissão depois que Guilherme conheceu uma amiga que se formou no curso. "Tive interesse, fui atrás e voltei a estudar", conta. Ao receber a notícia de que o filho havia sido aprovado, Deise foi à universidade conversar com a coordenação pedagógica: "Eles disseram que o Guilherme precisava ter o acompanhamento de uma psicopedagoga, que isso era uma exigência da universidade, mas que poderia ser eu, a mãe", recorda. Apesar de ser formada em engenharia e não gostar de cozinhar, ela não hesitou em aceitar a proposta e entrar de cabeça no curso junto ao filho.

Graduação em gastronomia

Ao longo dos dois anos de graduação, Guilherme seguiu uma rotina comum: frequentava as aulas, conversava com os amigos e fazia as provas e trabalhos da faculdade. No entanto, sempre ali presente, estava a mãe. Deise acompanhava as aulas como ouvinte, sem colocar a mão na massa, de fato. "Nas atividades teóricas, a gente conversava com a coordenadora para fazer uma prova menos extensa, porque quem tem síndrome de Down é uma pessoa um pouquinho mais lenta do que as outras, então ele demora mais pra fazer", relata uma das únicas adaptações feitas ao aluno.

"A partir do Ensino Médio, quando percebi que ele estava com mais dificuldade para estudar, decidi trabalhar por conta própria na minha casa", esclarece Deise, que atuava como engenheira. A partir de então, conseguiu fazer o próprio horário para se dedicar mais ao filho, como aconteceu também na graduação. Para quem não gostava de cozinhar, ela acabou encarando o desafio de retornar à faculdade com muito entusiasmo e a experiência só trouxe benefícios: "Eu amei voltar para a universidade e estar em contato com os jovens depois de tantos anos afastada. Adorei as matérias, teorias, aprender as culinárias do mundo inteiro", recorda.

A experiência também foi importante para Guilherme, que enfrentou um desafio e amadureceu: "Minha mãe é uma amiga, companheira de faculdade e muito mais. Eu me senti solto, porque se não tivesse minha mãe comigo lá na faculdade, talvez teria passado por bullying ou outras coisas", revela. Hoje, o jovem de 25 anos trabalha diariamente em um renomado restaurante de culinária italiana em São Paulo.

Dia Internacional da Síndrome de Down: como promover a inclusão social?

Com o Dia Internacional da Síndrome de Down em pauta, data celebrada nesta quinta-feira, 21, Deise endereça uma mensagem aos pais de jovens com Down. "Eles têm capacidade e a gente precisa acreditar e batalhar. Tudo com calma, porque cada um tem sua hora. Então ofereça estudos, esportes, teatro. É uma vida comum como qualquer outra pessoa".

Ela menciona os casos de discriminação e bullying sofridos por Guilherme ao longo da vida, mas diz que sempre falou abertamente sobre a condição com o filho justamente por imaginar que isso pudesse acontecer. "Desde pequeno ele sabe que tem síndrome de Down, então aprendeu a resolver os próprios problemas quando encontrava algum tipo de dificuldade", explica.

Em meio às lembranças, Deise recorda: "Quando ele nasceu, me falaram que ele poderia não andar ou falar. Eu não queria que ele ficasse encostado em um canto, por isso eu ficava em cima. Queria que ele fosse feliz. Eu sou uma mãe igual a qualquer outra".

* Estagiária sob supervisão de Charlise Morais

Estadão
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