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Novo formato para a matéria escura pode resolver mistério de décadas sobre a Via Láctea

Às vezes, olhar para dentro, para o centro dinâmico e brilhante de nossa própria galáxia, pode revelar pistas inesperadas do que está além.

30 abr 2025 - 08h45
(atualizado às 15h32)
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Imagem de formação de estrelas no centro da Via Láctea: fenômenos de ionização de gases e emissão de radiação da densa região central da galáxia podem ser explicados por um tipo de matéria escura mais "leve" que a usualmente buscada pelos cientistas Susan Stolovy (SSC/Caltech) et al., NASA SPitzer/IRAC
Imagem de formação de estrelas no centro da Via Láctea: fenômenos de ionização de gases e emissão de radiação da densa região central da galáxia podem ser explicados por um tipo de matéria escura mais "leve" que a usualmente buscada pelos cientistas Susan Stolovy (SSC/Caltech) et al., NASA SPitzer/IRAC
Foto: The Conversation

Os astrônomos há muito tempo estão intrigados com dois fenômenos estranhos no centro da nossa galáxia, a Via Láctea. Primeiro, o gás na zona molecular central (CMZ, na sigla em inglês), uma região densa e caótica próxima ao núcleo da Via Láctea, parece estar ionizado (o que quer dizer que ele está eletricamente carregado porque perdeu elétrons) em uma taxa surpreendentemente alta.

Em segundo lugar, telescópios detectaram um misterioso "brilho" em raios gama na região com uma energia de 511 quilo-eletronvolts (keV) (que corresponde à energia de um elétron em repouso).

É interessante notar que esses raios gama são produzidos quando um elétron e sua contraparte de antimatéria (todas as partículas carregadas fundamentais têm versões de antimatéria de si mesmas que são quase idênticas, mas com carga oposta), o pósitron, colidem e se aniquilam em um flash de radiação.

As fontes de ambos fenômenos ainda não estão claras, apesar de décadas de observação. Mas em um novo estudo, publicado no periódico Physical Review Letters, mostramos que ambos podem estar ligados a um dos ingredientes mais elusivos do Universo: a matéria escura. Em particular, propomos que uma nova forma de matéria escura, menos maciça do que os tipos que os astrônomos normalmente procuram, pode ser a responsável.

Processo oculto

A CMZ se estende por quase 700 anos-luz e contém alguns dos gases moleculares mais densos de nossa galáxia. Ao longo dos anos, os cientistas descobriram que essa região é excepcionalmente ionizada, o que significa que as moléculas de hidrogênio estão sendo divididas em partículas carregadas (elétrons e núcleos) em uma velocidade muito maior do que a esperada.

Isso pode ser resultado de fontes como raios cósmicos e a luz das estrelas que bombardeiam o gás. Entretanto, essas fontes por si só não parecem ser capazes de explicar os níveis observados.

O outro mistério, a emissão de 511keV, foi observado pela primeira vez na década de 1970, mas ainda não tem uma fonte claramente identificada. Vários candidatos foram propostos, incluindo supernovas, estrelas maciças, buracos negros e estrelas de nêutrons. Entretanto, nenhum deles explica totalmente o padrão ou a intensidade da emissão.

Fizemos uma pergunta simples: ambos os fenômenos poderiam ser causados pelo mesmo processo oculto?

A matéria escura compõe cerca de 85% da matéria do Universo, mas não emite nem absorve luz. Embora seus efeitos gravitacionais sejam claros, os cientistas ainda não sabem do que ela é feita.

Uma possibilidade, muitas vezes negligenciada, é que as partículas de matéria escura poderiam ser muito leves, com massas de apenas alguns milhões de elétron-volts, muito mais leves que um próton, e ainda assim desempenhar um papel cósmico. Esses candidatos leves à matéria escura são geralmente chamados de "partículas de matéria escura sub-GeV" (giga elétron-volts).

Essas partículas de matéria escura podem interagir com suas antipartículas. Em nosso trabalho, estudamos o que aconteceria se essas partículas leves de matéria escura entrassem em contato com suas próprias antipartículas no centro galáctico e aniquilassem umas às outras, produzindo elétrons e pósitrons.

No gás denso da CMZ, essas partículas de baixa energia perderiam energia rapidamente e ionizariam as moléculas de hidrogênio circundantes de forma muito eficiente, removendo seus elétrons. Como a região é muito densa, as partículas não viajariam para muito longe. Em vez disso, elas depositariam a maior parte de sua energia localmente, o que corresponde muito bem ao perfil de ionização observado.

Usando simulações detalhadas, descobrimos que esse processo simples, partículas de matéria escura se aniquilando para produzir elétrons e pósitrons, pode explicar naturalmente as taxas de ionização observadas na CMZ.

Melhor ainda, as propriedades necessárias da matéria escura, como sua massa e força de interação, não entram em conflito com nenhuma restrição conhecida do Universo primitivo. A matéria escura desse tipo parece ser uma opção séria.

O quebra-cabeça do pósitron

Se a matéria escura estiver criando pósitrons na CMZ, essas partículas acabarão se desacelerando e se aniquilando com os elétrons do ambiente, produzindo raios gama com energia exata de 511keV. Isso forneceria uma ligação direta entre a ionização e o brilho misterioso.

Descobrimos que, embora a matéria escura possa explicar a ionização, ela também pode ser capaz de replicar alguma quantidade de radiação de 511keV. Essa descoberta surpreendente sugere que os dois sinais podem se originar da mesma fonte, a matéria escura leve.

O brilho exato da linha de 511keV depende de vários fatores, incluindo a eficiência com que os pósitrons formam estados ligados aos elétrons e onde exatamente eles se aniquilam. Esses detalhes ainda são incertos.

Uma nova maneira de testar o invisível

Independentemente de a emissão de 511keV e a ionização da CMZ compartilharem uma fonte comum, a taxa de ionização na CMZ está surgindo como uma nova e valiosa observação para estudar a matéria escura. Em particular, ela fornece uma maneira de testar modelos que envolvem partículas leves de matéria escura, que são difíceis de detectar usando experimentos tradicionais de laboratório.

Imagem do céu noturno acima do Observatório de Paranal, Chile, em 21 de julho de 2007, tirada pelo astrônomo do ESO Yuri Beletsky. A
Imagem do céu noturno acima do Observatório de Paranal, Chile, em 21 de julho de 2007, tirada pelo astrônomo do ESO Yuri Beletsky. A
Foto: The Conversation

Mais observações da Via Láctea podem ajudar a testar teorias da matéria escura. ESO/Y. Beletsky, CC BY-SA

Em nosso estudo, mostramos que o perfil de ionização previsto da matéria escura é notavelmente plano em toda a CMZ. Isso é importante, pois a ionização observada está de fato espalhada de forma relativamente uniforme.

Fontes pontuais, como o buraco negro no centro da galáxia ou fontes de raios cósmicos, como supernovas (estrelas em explosão), não podem explicar facilmente esse fato. Mas um halo de matéria escura suavemente distribuído pode.

Nossas descobertas sugerem que o centro da Via Láctea pode oferecer novas pistas sobre a natureza fundamental da matéria escura.

Futuros telescópios com melhor resolução poderão fornecer mais informações sobre a distribuição espacial e as relações entre a linha de emissão de 511 keV e a taxa de ionização da CMZ. Enquanto isso, observações contínuas da CMZ podem ajudar a descartar ou fortalecer a explicação da matéria escura.

De qualquer forma, esses sinais estranhos do coração da galáxia nos lembram que o Universo ainda é cheio de surpresas. Às vezes, olhar para dentro, para o centro dinâmico e brilhante de nossa própria galáxia, revela pistas mais inesperadas do que está além.

The Conversation
The Conversation
Foto: The Conversation

Shyam Balaji recebe financiamento da STFC sob a bolsa ST/X000753/1. Ele é afiliado ao King's College London.

The Conversation Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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