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Renúncia de cardeal suspeito abre crise na Igreja Católica

Angelo Becciu disse que se sentia "amigo" do papa Francisco

25 set 2020 - 10h25
(atualizado às 10h58)
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O cardeal Angelo Becciu se pronunciou nesta sexta-feira (25) pela primeira vez sobre sua renúncia ao cargo de prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e aos direitos do cardinalato e afirmou ser vítima de uma "situação surreal".

Angelo Becciu havia sido nomeado cardeal pelo próprio papa Francisco
Angelo Becciu havia sido nomeado cardeal pelo próprio papa Francisco
Foto: ANSA / Ansa - Brasil

A aceitação da renúncia pelo papa Francisco foi comunicada pela Santa Sé na última quinta-feira (24), já de noite, algo raro nos informes do Vaticano, e provocou um terremoto na Igreja Católica.

A nota oficial é lacônica e diz apenas que o "Santo Padre aceitou a renúncia" de Becciu "ao cargo de prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e dos direitos relativos ao cardinalato", mas o prelado italiano está no centro de um inquérito que apura o uso de donativos para pobres na compra de imóveis.

A investigação já levou à suspensão de funcionários da Secretaria de Estado do Vaticano suspeitos de usar recursos do Óbolo de São Pedro, sistema de arrecadação de donativos da Igreja, em transações imobiliárias, como a compra de um edifício residencial em Londres por US$ 200 milhões, em parceria com um fundo de Luxemburgo.

Na época da aquisição, Becciu era o "número 2" na Secretaria de Estado, principal dicastério da Cúria Romana. Além disso, segundo a revista italiana l'Espresso, o cardeal teria confiado o caixa do Vaticano ao banqueiro Enrico Crasso, que, por sua vez, teria direcionado recursos para fundos especulativos em paraísos fiscais.

Também na época em que era substituto para Assuntos Gerais da Secretaria de Estado, Becciu teria pedido e obtido financiamentos a fundo perdido para uma cooperativa comandada por seu irmão, Tonino, e que faz ações para a Cáritas na Sardenha. Os montantes totalizariam 100 mil euros.

"É um pouco estranha a coisa, me sinto até um pouco atordoado. Até 18h02 de ontem, me sentia amigo do Papa, fiel executor do Papa. Depois, o Papa diz que não tem mais confiança em mim porque recebeu dos magistrados um aviso de que eu teria cometido atos de peculato", afirmou Becciu nesta sexta-feira, em coletiva de imprensa.

O crime de peculato consiste na apropriação de bens e recursos públicos para fins particulares. Na coletiva, o cardeal italiano admitiu ter destinado 100 mil euros à Cáritas na Sardenha, sua região de origem, mas negou irregularidades.

"Faz parte das prerrogativas do substituto [seu ex-cargo na Secretaria de Estado] destinar somas que estão em um fundo particular voltado à Cáritas. Em sete ou oito anos, nunca tinha feito uma obra de apoio para a Sardenha. Sei que na minha diocese tem uma emergência, sobretudo pelo desemprego, então quis destinar aqueles 100 mil euros à Cáritas", contou.

Segundo Becciu, o dinheiro ainda está sob poder da entidade beneficente da Igreja Católica e não foi transferido para a cooperativa de seu irmão. "O dinheiro ainda está lá, não sei por que sou acusado de peculato", declarou.

Sobre a aquisição do edifício em Londres, o cardeal garantiu não ter usado recursos do Óbolo de São Pedro na operação. "A Secretaria de Estado tinha um fundo e precisava crescer", afirmou, acrescentando que o assunto não foi discutido na reunião com o Papa que selou sua renúncia.

"Renovo minha confiança no Santo Padre. Ao me tornar cardeal, prometi dar a vida pela Igreja e pelo Papa. Hoje renovo minha confiança", ressaltou. Oficialmente, Becciu continua sendo um cardeal, mas sem as prerrogativas do cargo, como participar de um eventual conclave.

Essa é a primeira vez no pontificado de Jorge Bergoglio que um prelado da Cúria Romana renuncia, além do cargo no próprio dicastério, aos direitos do cardinalato. Angelo Becciu, 72 anos, tem uma longa trajetória na administração do Vaticano e foi nomeado como cardeal por Francisco, em junho de 2018.

"Espero que, cedo ou tarde, o Santo Padre perceba que houve um grande equívoco", disse.

Ansa - Brasil   
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