Embora a possibilidade de renúncia de um papa esteja prevista no Código de Direito Canônico, a decisão de Bento XVI de abrir mão do comando da Igreja Católica causou surpresa em fiéis e até mesmo na cúpula do Vaticano. Isso porque a situação é incomum, já que o último pontífice a renunciar foi Gregório XII, há quase 600 anos.
Historiadores ainda divergem sobre o número de papas que renunciaram aos seus postos, mas há unanimidade em três casos: Ponciano, Celestino V e Gregório XII. Segundo o historiador medieval Donald Prudlo, professor da Universidade do Alabama, por ser uma situação extremamente rara, a decisão da renúncia abre um questionamento sobre o que acontece com o papa após abdicar do cargo.
Ele explicou à Rádio do Vaticano que um dos casos mais conhecidos é o de Celestino V, que após a renúncia acabou sendo colocado em uma espécie de cela, em uma vida reclusa sob supervisão do novo pontífice, Bonifácio VIII. Situação diferente viveu o último papa a renunciar antes de Bento XVI. "Gregório, por outro lado, viveu o resto de sua vida como um bispo muito respeitado", afirma. De acordo com ele, apesar do "choque" que a renúncia de Bento XVI causou, a Igreja Católica está preparada para enfrentar o desafio de escolher um novo papa com o antecessor ainda em vida.
Veja a seguir a trajetória dos papas que renunciaram a seus cargos:
Ponciano
Segundo Donald Prudlo, as primeiras evidências sobre a possibilidade de renúncia de um papa vem do ano de 235 d.C., com São Ponciano. O italiano nascido em 175 assumiu o comando da Igreja Católica após um conclave em 230, uma época marcada por pela divisão do catolicismo.
Ponciano e outros líderes da Igreja foram exilados pelo imperador romano Maximino Trácio na Sardenha, uma ilha do mar Mediterrâneo. Percebendo que jamais conseguiria retornar ao Vaticano, decidiu renunciar ao posto.
Celestino V
São Celestino V renunciou à função no mesmo ano de sua eleição, em 1294. Ele vivia como eremita até a sua nomeação como papa e não se sentiu preparado para assumir a liderança da Igreja. A escolha de um desconhecido foi a opção do conclave para acabar com a guerra pela sucessão de Nicolau IV, morto dois anos antes. Mas o novo Papa rapidamente expôs as razões que o impediam de desempenhar suas funções: sua humildade e saúde. Ele abdicou em 13 de dezembro de 1294 e alguns dias depois o cardeal Bento Gaetani foi eleito para sucedê-lo sob o nome de Bonifácio VIII.
O novo papa tentou manter Celestino a seu lado, mas o monge tentou escapar e se juntar novamente à sua ordem, que passou a adotar o nome de "Celestinos". No entanto, ele foi capturado pelos guardas do Papa e passou a viver em uma espécie de cela. Celestino V morreu em 1296 e está sepultado na igreja de sua ordem em Aquila.
Gregório XII
Nascido em Veneza em 1327, Angelo Correr foi eleito papa com mais de 80 anos de idade. Ele assumiu o posto em 1406, com o nome de Gregório XII. A renúncia ocorreu em 1415, como parte de uma negociação no Concílio de Constança para acabar com as disputas de poder dentro da Igreja durante o período do Grande Cisma do Ocidente – uma crise na Igreja Católica que perdurou de 1378 a 1417. Como seu sucesso, foi eleito Marinho V. Gregório se tornou um bispo respeitado e morreu um ano depois.
O brasileiro Odilo Scherer, filho de alemães, está entre os nomes mais cotados para a sucessão do papa Bento XVI. Segundo a rede americana 'NBC', o atual arcebispo de São Paulo, de 63 anos, é considerado um católico moderado pelo Vaticano e possui grande apoio de dois grupos representativos da Igreja: a Congregação para o Clero e o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização
Foto: AFP
Na foto, o americano Timothy Dolan aparece em jantar entre os dois candidatos à presidência dos Estados Unidos nas últimas eleições: Barack Obama e Mitt Romney. Aos 63 anos, o arcebispo de Nova York é considerado um dos nomes mais carismáticos do catolicismo na atualidade, apesar da linha conservadora
Foto: AFP
Na foto, o italiano Angelo Scola aparece ao lado de Bento XVI no 7º Encontro Mundial de Famílias. O arcebispo de Milão, de 71 anos, já era considerado um dos favoritos a assumir o papado quando João Paulo II faleceu. Ele é chefe de uma uma fundação que visa promover a compreensão entre muçulmanos e cristãos
Foto: AFP
Ao lado ex-premiê italiano Silvio Berlusconi na foto, o italiano Angelo Bagnasco, de 70 anos, é o atual arcebispo de Gênova. Em 2007, recebeu ameaças de morte após comentários contrários ao casamento homossexual
Foto: AFP
Aos 64 anos, o ganês Peter Turkson é o atual presidente do Pontifício Conselho de Justiça e Paz do Vaticano. Perguntado sobre o crescimento da AIDS na África, ele disse que abstinência é uma solução melhor do que o uso de camisinha. Segundo a 'NBC', Turkson declarou, anos atrás, que o primeiro Papa negro teria "uma vida dura" e que não teria interesse na condição
Foto: AFP
Ex-arcebispo do Quebec, o canadense Marc Ouellet é o atual líder da Congregação de Bispos. Aos 68 anos, ele fala seis línguas e, por ter morado uma década na Colômbia, possui fortes laços com a América Latina. Em 2010, disse que o aborto é "um crime moral", mesmo em casos de estupro. Apesar do favoritismo, em 2011 ele declarou que se tornar papa deveria ser "um pesadelo"
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Outro forte candidato da América Latina é o argentino Leonardo Sandri. Aos 69 anos, o filho de italianos tem longa carreira diplomática no Vaticano e foi bastante próximo do papa João Paulo II
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Aos 70 anos, o italiano Gianfranco Ravasi é presidente do Pontifício Conselho da Cultura. A 'NBC' destaca o lado moderno do religioso, que tem um blog e já retuitou mensagens de Amy Winehouse, além de ter criticado publicamente padres que fazem "sermões chatos"
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Um dos nomes favoritos nas casas de apostas, o nigeriano Francis Arinze é o prefeito Emérito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos. Em 2003, foi alvo de protestos após associar homossexualidade a pornografia em uma palestra na Universidade americana de Georgetown
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Apesar de só ter se tornado cardeal em 2012, o filipino Luis Tagle, de 55 anos, trabalhou com Bento XVI na Comissão Teológica Internacional e é um dos nomes mais fortes da Igreja atualmente. Na foto, um filipino em Manilla prega seu quadro ao lado do atual papa como indicação de que ele será o sucessor