Script = https://s1.trrsf.com/update-1764790511/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

Estados Unidos

Trump pressiona Estados e cria 'batalha dos mapas' antes das eleições de meio de mandato

Presidente americano está exigindo que Estados republicanos realizem processo conhecido como gerrymandering; Democratas prometem resposta

27 ago 2025 - 10h13
Compartilhar
Exibir comentários
Resumo
Donald Trump pressiona Estados republicanos a adotarem o gerrymandering antes das eleições de meio de mandato, enquanto democratas prometem responder com redesenhos próprios, acirrando disputas políticas nos EUA.

O presidente americano Donald Trump, deu a largada para a "batalha dos mapas" nos Estados Unidos. Depois de pressionar o Texas a modificar seus distritos para favorecer o Partido Republicano em um processo conhecido como gerrymandering, Trump pediu que Estados como Indiana, Ohio e Missouri fizessem o mesmo. A iniciativa escalonou, com Estados democratas como Califórnia, Nova York e Illinois prometendo responder com redesenhos democratas em um processo sem precedentes na história americana.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump
Foto: Anna Moneymaker/GettyImages

No Texas, o projeto de redesenho dos distritos já foi aprovado e deve entrar em vigor, apesar de possíveis desafios judiciais. Os políticos democratas do Estado chegaram a sair do Texas por duas semanas para prevenir a votação do projeto por falta de quorum, mas retornaram depois que a Califórnia prometeu fazer seu próprio gerrymandering para responder aos republicanos.

Os dois Estados mais populosos dos Estados Unidos esperam usar seus novos mapas nas eleições de meio de mandato, em 2026. No pleito, um terço dos assentos do Senado será renovado, assim como todos os assentos da Câmara dos Deputados.

Os republicanos do Texas esperam que os novos mapas possam fornecer cinco novos assentos para os republicanos. Já os democratas da Califórnia querem eliminar os ganhos texanos com cinco novos assentos da legenda no Estado.

Atualmente os republicanos comandam as duas casas legislativas em Washington, mas as eleições de meio de mandato tendem a favorecer o partido que não está no poder. A expectativa de Trump é que o gerrymandering republicano garanta a manutenção de seu partido no comando da Câmara dos Deputados.

Para Steve Israel, um ex-congressista democrata que liderou o Comitê de Campanha Congressional Democrata de 2011 a 2015, a intenção inicial da prática de gerrymandering era justa, mas a iniciativa passou a ser usada como arma de campanha.

"A ideia do gerrymandering era garantir que cada membro do Congresso americano representasse o mesmo número de pessoas, mas agora essa prática se tornou uma maneira de garantir a reeleição dos membros do Congresso", disse Israel, em entrevista ao Estadão.

Gerrymandering

O processo de gerrymandering está ligado ao desenho dos limites dos distritos congressionais americanos. Na terra do Tio Sam, cada Estado americano elege dois senadores e os congressistas são eleitos por meio do voto distrital. Cada distrito nos EUA elege um representante e os distritos são divididos igualmente em população.

A cada 10 anos, após o censo, os Estados americanos redesenham os limites dos distritos congressionais para refletir as mudanças populacionais em um processo conhecido como redistritamento.

Mas políticos de ambos os partidos aproveitam o processo de redistritamento para manipular os mapas e favorecer certos candidatos, em uma prática conhecida como gerrymandering.

O termo tem origem no nome do ex-governador de Massachusetts Elbridge Gerry, que redesenhou os distritos do Estado em 1812. Um jornal local afirmou que um dos distritos desenhados por Gerry parecia uma salamandra (salamander, em inglês) e desde então a prática ficou conhecida como gerrymander, unindo o sobrenome do governador e a palavra salamander.

A prática de gerrymandering é permitida nos Estados Unidos, mas cada Estado tem uma legislação específica sobre como redesenhar os distritos.

"A única coisa que a Constituição exige é que todos os distritos devem ter a mesma população e que não se pode discriminar com base em raça ao desenhar um distrito", aponta Richard Briffault, professor da Escola de Direito da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

O especialista destaca que existem duas formas de aplicar o gerrymandering. A primeira é chamada de cracking e consiste em dividir grupos de eleitores desfavorecidos pelo partido que domina o controle do redesenho dos mapas entre vários distritos. Com a força eleitoral dividida, esse grupo tem dificuldade de eleger seus candidatos preferidos em qualquer distrito.

A segunda prática é chamada de packing e consiste em amontoar grupos desfavorecidos em poucos distritos para que eles vençam com margens esmagadoras, mas não tenham força no resto do Estado.

"De acordo com esse tipo de gerrymandering, o partido que desenha os mapas coloca o máximo de eleitores da oposição em um distrito", diz Briffault. "Então ao invés de ganhar o distrito por 60% dos votos, um congressista da oposição ganha por 90%. A oposição está fortemente representada em um distrito, mas não tem voz em outros lugares".

Por que o Texas quer fazer gerrymandering?

Apesar da prática de gerrymandering ser considerada comum nos Estados Unidos, os Estados geralmente esperam até a divulgação do Censo, que será em 2030, para redesenhar os distritos. Mas os republicanos do Texas decidiram antecipar o processo e conseguiram aprovar o projeto por terem maioria nas casas legislativas estaduais.

O governador do Texas, o republicano Greg Abbott, defendeu o processo de gerrymandering antecipado, citando uma carta do Departamento de Justiça que argumentava que vários distritos precisavam ser redesenhados por conta de uma decisão do Tribunal de Apelações dos EUA.

A decisão argumenta que a Lei Federal de Direito ao Voto, que protege o voto de minorias nos Estados Unidos, não exige a existência dos chamados "distritos de coalizão", onde grupos considerados minorias constituem uma maioria.

Mas especialistas entrevistados pelo Estadão argumentam que a decisão não diz que esses distritos precisam ser redesenhados.

"O questionamento do Texas em relação aos 'distritos de coalizão' não é a razão do gerrymandering antecipado", destaca Joseph Fishkin, professor da Escola de Direito da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA, na sigla em inglês). "Não faz sentido redesenhar um Estado inteiro por conta de uma decisão que afeta apenas alguns distritos".

Para o especialista, a mudança nos chamados "distritos de coalizão" significa menos representação de minorias como afro-americanos e latinos, que tendem a votar majoritariamente no Partido Democrata.

A justificativa real das mudanças nos distritos texanos é a pressão de Donald Trump. O presidente americano teme a perda da Câmara dos Deputados para o Partido Democrata, que poderia atrasar sua agenda de governo e lançar investigações contra seu gabinete.

Os distritos redesenhados no Texas incluem grandes conglomerados urbanos como Dallas, Houston e Austin, que tendem a votar no Partido Democrata, assim como dois assentos na região do Vale do Rio Grande, perto da fronteira com o México, que tem uma grande presença latina que votou em Trump nas eleições presidenciais de 2024.

A expectativa é que o Partido Republicano tenha o controle de 30 das 38 cadeiras do Texas na Câmara dos Deputados dos EUA, colocando quase 80% dos assentos do Estado na mão dos republicanos.

Os republicanos esperam manter os votos latinos na região de fronteira que receberam em 2024, mas pesquisas de opinião indicam que o apoio latino no Texas pode ser temporário, devido a dificuldades econômicas amplificadas pelas tarifas de Trump e a política agressiva de deportação de imigrantes ilegais.

"Redesenhar os distritos pensando em ganhos passados é sempre uma dificuldade", aponta Jason Shepherd, advogado e analista republicano, em entrevista ao Estadão. "Pode ser que eles consigam os cinco assentos e pode ser que só consigam dois, mas ainda sim terá sido positivo para eles".

O domínio republicano nas cadeiras seria exagerado em relação a popularidade da legenda no Texas. Apesar de ser um Estado republicano, Trump venceu no Texas por 56% em 2024, bem abaixo dos 80% dos assentos que poderiam ser controlados pelo partido.

"Gerrymandering é um processo político", aponta Shepherd. "É curioso que os democratas só não gostam disso quando acontece com eles, mas existem muitos Estados americanos que são controlados por democratas em que poderíamos ter mais assentos".

Pressão de Trump cria 'batalha de mapas'

A pressão de Trump por mais assentos na Câmara dos Deputados dos EUA não parou no Texas. O presidente americano quer que outros Estados republicanos como Indiana, Ohio, Missouri e Florida também realizem um processo de gerrymandering no meio da década.

Mas não está claro se esses Estados podem fazer isso. Nos EUA, cada Estado americano tem uma legislação diferente sobre gerrymandering. Enquanto no Texas é possível redesenhar os distritos apenas com uma maioria nas duas casas legislativas estaduais, Indiana e Ohio precisariam mudar leis estaduais para redesenhar distritos e agradar Trump.

Já os democratas tentam responder como podem. O governador da Califórnia, Gavin Newson, conseguiu aprovar uma proposta para a realização de um plebiscito em que os cidadãos do Estado vão decidir em novembro se aprovam ou não um redesenho dos distritos que seja mais favorável aos democratas. A medida acabaria com a comissão independente que desenha os distritos na Califórnia até 2030, quando o grupo voltaria a atuar depois do Censo.

Nova York, Maryland e Illinois também estudam aplicar medidas semelhantes que poderiam beneficiar os democratas, mas sem um processo claro de como essa mudança poderia ser feita até as eleições de meio de mandato.

"Os democratas têm uma margem estreita para conseguirem a maioria, então eles precisam lutar da mesma forma que os republicanos", aponta Israel, que foi congressista pelo Partido Democrata. "Se o Texas está decidindo usar formas abusivas de gerrymandering, os democratas não têm escolha senão usar essas mesmas táticas em lugares como Califórnia, Nova York e Maryland".

Para Fishkin, da Escola de Direito da Universidade da Califórnia em Los Angeles, a "batalha dos mapas" é ruim para todos os cidadãos americanos e prejudica a competitividade das eleições no país. "O conceito de gerrymandering é tentar desenhar os distritos para conseguir um resultado previsível e nada competitivo, então existe uma perda política nesse processo".

Para Israel, o gerrymandering republicano dá uma "vantagem artificial" ao partido antes das eleições de meio de mandato e vai ser mais difícil tirar o comando da Câmara das mãos da legenda da situação. "Os democratas vão precisar gastar mais dinheiro em lugares que eles não precisariam se não fosse o gerrymandering do Texas, mas ainda é possível".

De acordo com o ex-congressista democrata, a pressão de Trump por um gerrymandering no meio da década é sem precedentes na história americana. "Os republicanos poderiam ter dito não a Trump, mas escolheram abusar do sistema".

A pressão de Trump sobre o gerrymandering, aliada a política tarifária do republicano e as deportações em massa devem colocar o presidente americano no centro das atenções para o próximo ciclo eleitoral. "As eleições de meio de mandato são um referendo em relação às políticas de Donald Trump", opina o analista republicano Jason Shepherd.

Estadão
Compartilhar
Publicidade

Conheça nossos produtos

Seu Terra












Publicidade