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Biden e Netanyahu entram em rota de colisão após votação da ONU sobre Gaza

25 mar 2024 - 20h36
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As relações em tempos de guerra entre o presidente norte-americano, Joe Biden, e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu sofreram um novo baque nesta segunda-feira, quando os Estados Unidos permitiram a aprovação de uma resolução de cessar-fogo em Gaza nas Nações Unidas, atraindo uma forte repreensão do líder de Israel.

Netanyahu cancelou abruptamente uma visita de delegação sênior a Washington nesta semana -- para discutir a ameaça israelense de promover uma ofensiva na cidade de Rafah, no sul de Gaza -- após Washington se abster em votação do Conselho de Segurança da ONU de resolução que exigia um cessar-fogo imediato entre Israel e o Hamas e a libertação de todos os reféns mantidos pelos militantes palestinos.

A suspensão dessa reunião coloca um novo e importante obstáculo no caminho dos esforços dos EUA, preocupados com o agravamento da catástrofe humanitária em Gaza, para que Netanyahu considere alternativas a uma invasão terrestre em Rafah, último refúgio relativamente seguro para os civis palestinos.

A ameaça de tal ofensiva aumentou as tensões entre os aliados de longa data, Estados Unidos e Israel, e levantou questões sobre a possibilidade de os EUA restringirem a ajuda militar caso Netanyahu desafie Biden e prossiga mesmo assim.

"Isso mostra que a confiança entre o governo Biden e Netanyahu pode estar se desfazendo", disse Aaron David Miller, ex-negociador do Oriente Médio para os governos republicano e democrata.

"Se a crise não for gerenciada com cuidado, ela só vai piorar."

A decisão de Biden de se abster na ONU, após meses aderindo à política de longa data dos EUA de proteger Israel no órgão mundial, pareceu refletir a crescente frustração com o líder israelense.

O presidente norte-americano, que concorre à reeleição em novembro, enfrenta pressão não apenas dos aliados dos Estados Unidos, mas também de um número crescente de colegas democratas para controlar a resposta militar de Israel ao ataque mortal do Hamas em 7 de outubro.

Netanyahu enfrenta seus próprios desafios internos, principalmente ligados a exigências de membros da coalizão de extrema-direita por uma atuação linha-dura contra os palestinos. Ele também precisa convencer as famílias dos reféns de que está fazendo tudo para libertá-los, ao mesmo tempo em que enfrenta protestos frequentes pedindo sua renúncia.

Quando o gabinete de Netanyahu anunciou o cancelamento da visita, ele afirmou que o fato de os EUA não terem vetado a resolução foi um "claro recuo" em relação à sua posição anterior e prejudicaria os esforços de guerra de Israel.

PERPLEXIDADE

Autoridades dos EUA disseram que o governo Biden ficou perplexo com a decisão de Israel e a considerou uma reação exagerada, insistindo que não houve mudança na política.

Washington havia evitado a palavra "cessar-fogo" no início da guerra de quase seis meses na Faixa de Gaza e havia usado seu poder de veto na ONU para proteger Israel em sua retaliação contra o Hamas.

Mas com a fome se apoderando de Gaza e em meio à crescente pressão global por uma trégua na guerra que, segundo autoridades de saúde palestinas, já matou cerca de 32.000 palestinos, os EUA se abstiveram na votação de pedido de cessar-fogo para o mês sagrado muçulmano do Ramadã, que termina em duas semanas.

O desafio agora, para Biden e Netanyahu, é evitar que suas diferenças saiam do controle, dizem os analistas.

Jon Alterman, diretor do programa do Oriente Médio no centro de estudos Center for Strategic and International Studies, em Washington, disse que não há razão para isso tornar-se um "golpe mortal" nas relações.

"Portanto, não acho que a porta esteja fechada para nada", disse ele.

A abstenção dos EUA, no entanto, contribui para o aprofundamento do distanciamento entre Biden e Netanyahu, que se conhecem há anos, mas mantêm um relacionamento difícil, mesmo nos melhores momentos.

No início deste mês, Biden disse em entrevista à MSNBC que uma invasão em Rafah seria uma "linha vermelha", embora tenha acrescentado que a defesa de Israel é "fundamental" e que não há como "cortar todas as armas para que eles não tenham o Iron Dome (sistema de defesa antimísseis) para protegê-los".

Netanyahu rejeitou as críticas de Biden e prometeu avançar em Rafah, última pedaço da Faixa de Gaza onde as forças israelenses não realizaram uma ofensiva terrestre, embora autoridades dos EUA digam que não há sinais de uma operação iminente.

Na semana passada, o líder da maioria no Senado dos EUA, Chuck Schumer, a mais alta autoridade judia eleita do país, descreveu Netanyahu como um obstáculo à paz e pediu novas eleições em Israel para substituí-lo. Biden considerou o discurso "bom".

Mas o presidente republicano da Câmara, Mike Johnson, disse a jornalistas na quarta-feira que estava pensando em convidar Netanyahu para discursar no Congresso. Isso seria visto como uma provocação a Biden, dando a Netanyahu um fórum de alto nível para expor suas queixas contra o governo dos EUA.

O senador democrata Sheldon Whitehouse disse à Reuters que Netanyahu parecia estar trabalhando com os republicanos para "transformar a relação EUA-Israel em uma arma a favor da direita".

A candidatura de Biden à reeleição em 2024 limita suas opções: ele precisa evitar dar aos republicanos um tópico a ser explorado pelos eleitores pró-Israel e, ao mesmo tempo, deter a erosão do apoio dos democratas progressistas, desanimados com seu forte apoio a Israel.

Por outro lado, ciente de que as pesquisas mostram que será derrotado em qualquer eleição realizada agora, Netanyahu aposta no amplo apoio à continuação da guerra em Gaza pela população israelense, ainda profundamente traumatizada pelo ataque de 7 de outubro.

Ele parece, portanto, disposto a arriscar testar a tolerância de Washington.

Todos os membros do governo de unidade emergencial de Netanyahu apoiam a continuação da guerra até que o Hamas seja destruído e os reféns sejam devolvidos, e tem havido poucos sinais de disposição para atender aos pedidos de moderação dos EUA, apesar do risco crescente de isolamento internacional.

O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, de extrema-direita, disse que Israel era um parceiro, mas que os Estados Unidos não eram seu "Estado patrono".

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