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'A candidatura de Maia jamais será de governo', diz ACM Neto

Em entrevista ao 'Estado', o prefeito de Salvador, ACM Neto, presidente nacional do DEM, reafirma o apoio do partido à candidatura ao Planalto do presidente da Câmara e justifica sua 'desistência' na disputa ao governo baiano

6 jun 2018 - 05h02
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Presidente nacional do DEM, o prefeito de Salvador, ACM Neto, surpreendeu aliados e agitou o cenário político local em abril, quando anunciou que não iria concorrer ao governo do Estado. Bem avaliado, Neto rivalizou politicamente por quase dois anos com o governador Rui Costa (PT), que vai tentar a reeleição este ano. Ao Estado, o prefeito justifica sua "desistência" e a escolha de seu substituto, José Ronaldo, e reafirma que o apoio do partido à candidatura do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ao Palácio do Planalto. Abaixo os principais trechos da entrevista:

Qual foi o impacto que sua desistência de concorrer ao governo teve na conjuntura política e eleitoral?

Eu não utilizo esse termo "desistência de candidatura" porque ele pressupõe que em algum momento eu decidi ser candidato e depois dessisti. E isso não aconteceu. Eu sempre deixei em aberto a possibilidade de ser ou não ser candidato a governador. Fui muito franco com meu grupo ao longo de todo ano de 2017. No começo desse ano de 2018, colocava de maneira muito aberta todas as minhas preocupações, especialmente deixava bem posicionado que a minha decisão dependaria, fundamentalmente, do desejo da população de Salvador. Fazendo pesquisas, verifiquei que a maioria da população prefiria a minha permanência à frente da prefeitura. O principal efeito da minha decisão é mudar o patamar de largada, mas eu aposto que não vai mudar o patamar de chegada, porque, assim como eu confiava na minha possibilidade de vitória, eu acredito na possibilidade de vitória do meu pré-candidato José Ronaldo.

Os partidos que compõem a base do governo somam 269 prefeitos baianos, enquanto o grupo de vocês, contando com o MDB, teria 145 prefeituras. Isso não é outra desvantagem, considerando que houve uma migração de prefeitos para o governo após sua decisão de não concorrer?

Depende do ponto de vista. Primeiro que essa migração foi em um volume muito inferior do que todos apostavam. O segundo ponto é que você precisa analisar essa conta de prefeitos de duas óticas. Se do ponto de vista do número de prefeitos, o nosso adversário tem vantagem; do ponto de vista de cidadãos governados por esses prefeitos, nós temos vantagem. Eles têm uma quantidade maior de cidades menores, a gente tem uma quantidade menor, mas de cidades maiores. E um terceiro aspecto a ser considerado é que, pegando uma base de 60% para o governo e 40% para nós, é um ponto de partida fantástico para quem está na oposição. Nunca na história da Bahia quem está na oposição saiu com 40% dos prefeitos do Estado. É um ponto de partida extraordinário.

Sua demora em decidir não ser candidato foi para segurar essa debandada, que era esperada?

Tem duas coisas, sendo muito franco, nessa história. Primeiro que eu dava sinais muito claros ao meu grupo de que eu não seria candidato. Já há algum tempo. Porém, havia internamente sempre uma pressão para que eu não antecipasse meu anúncio, naturalmente, na cabeça deles, entendendo que me convenceriam pela pressão. E, por outro lado, é óbvio que uma antecipação do anúncio da minha decisão poderia ter efeitos de mudança nessa configuração nossa muito maiores do que minha decisão ter acontecido no limite. Mas entenda que esse não foi o propósito. Isso foi o efeito, é uma consequência.

O MDB dos irmãos Vieira Lima foi o principal motivo da decisão?

Eu não apontaria isso nem diria que houve um principal motivo. Foi a soma de vários. Em relação ao MDB, eu tinha tomado uma decisão, desde o final do ano passado, de que eu não seria candidato a governador numa equação que envolvesse o MDB. É óbvio, é inegável todo o desgaste que o MDB viveu aqui na Bahia, sobretudo nos últimos dois anos, e eu não queria trazer isso para o meu palanque. Eu não queria passar toda uma campanha justificando coisas que eu não tenho nenhuma responsabilidade. Por isso tinha decidido que o MDB não estaria na minha equação política. Nada que signifique dizer que eles não têm o direito de se defender. Eles têm o direito. Não faço condenação prévia de ninguém, procuro manter o respeito nas relações pessoais, porém para mim estava muito claro que, caso eu fosse candidato a governador, deveria ser sem carregar isso comigo.

O senhor sugeriu que o deputado Lúcio Vieira Lima migrasse para um partido nanico, e, sem ele, manter o MDB em sua chapa?

Jamais. Jamais. Jamais. Tive vários diálogos com o deputado Lúcio e jamais pedi a ele que deixasse o MDB. Não houve isso em nenhuma hipótese.

Quais foram os outros motivos que o senhor disse existir para não ser candidato?

O primeiro e mais relevante foi o pacto que eu fiz com Salvador de consultar a população. Não é fácil alguém construir uma reeleição com 74% dos votos em uma cidade que sempre foi muito dividida politicamente. Outra coisa que pesou muito foi a minha idade, óbvio. Entender que ainda posso construir muito no futuro, entender que é preciso dar passos atrás para depois dar muitos outros à frente. A minha condição era diferente de qualquer outro. Eu estava aos 39 anos no meu segundo mandato de prefeito, com uma aprovação excelente, com o desejo da população de que eu seguisse o meu trabalho, e de repente eu teria que ir para uma eleição podendo colocar tudo isso que eu construí até agora em risco. Vencendo ou perdendo, ficaria a marca do cara que renunciou a um mandato que ele poderia ter cumprido.

Qual é a viabilidade na candidatura do José Ronaldo contra o governador?

É claro que sabíamos que ele começaria atrás nas pesquisas, porque ele é um sujeito muito conhecido na região dele, prefeito de Feira de Santana, a segunda cidade da Bahia, por quatro vezes, sempre aprovado com mais de 70%. Sempre ganhou eleição no primeiro turno, conhece a realidade de cada um dos 417 municípios da Bahia por ter sido deputado estadual e federal e presidente da União dos Prefeitos, é um sujeito que, ao mesmo tempo, pode olhar pelas grandes cidades e pelo interior completamente esquecido pelo governador nesses últimos quatro anos. É um cara que tem experiência administrativa, tem conhecimento político, conhece o Estado, que por ter sido prefeito sabe como se dá esse contato direto com as pessoas, que para mim é a grande diferença da política de hoje, já que o grande problema da política brasileira hoje é o distanciamento do cidadão, das ruas. E José Ronaldo tem toda uma trajetória que embasa essa aproximação. Ele tem um espaço grande para crescer.

José Ronaldo disse nessa semana que conversaria com o João Santana, pré-candidato do MDB, mas não respondeu se conversaria com o Lúcio Vieira Lima, que de fato negocia pela legenda. O senhor acha que o MDB deveria estar na chapa?

Primeiro não vejo nenhum problema de ninguém conversar com Lúcio. Eu já tive várias conversas com Lúcio. Conversar não tira pedaço de ninguém e eu não estou aqui para demonizar ninguém. Segundo, eu tenho dito que uma coisa é ACM Neto candidato a governador, pois caberia a mim decidir quem comporia meu palanque. Outra coisa é José Ronaldo. Se ele entender que deve negociar com o MDB, e o MDB quiser negociar com ele, ACM Neto terá que respeitar a condução do candidato. Então, essa definição não cabe a mim, cabe ao candidato ao governador.

Essa negociação com o PSDB para João Gualberto abrir mão da candidatura garante palanque para Geraldo Alckmin na Bahia?

Nós não sabemos se Democratas e PSDB estarão juntos na disputa presidencial. Hoje, por exemplo, cada um tem seus pré-candidatos. Caso Democratas e PSDB estejam em palanques distintos, é óbvio que aqui na Bahia, por estarmos juntos, ambos terão espaço para fazer sua campanha presidencial.

A canddiatura de Rodrigo Maia, que tem 1% das intenções de votos, é viável?

Ela existe, a candidatura dele não depende de pesquisas. Eu diria que dois pontos são fundamentais. Primeiro o próprio desejo dele de ser candidato e, em segundo, a construção de apoios políticos que nos dê impulsionamento para essa candidatura. A candidatura é para valer sim, ele é o candidato do Democratas, tem todo o apoio e suporte do partido para ser candidato, e qualquer decisão em outro sentido cabe a ele tomar. O partido será solidário e estará com ele em qualquer cenário.

Com quem o DEM convesrsa atualmente?

Estamos conversando com muita gente. É impossível deixar de avaliar todos os cenários. Temos conversado com Solidariedade, PP, PRB, PR, PSC, de alguma forma conversado com o PSDB, temos conversado com o Podemos, e isso não exclui outras conversas que podem ocorrer. Veja que eu lhe citei partidos que têm pré-candidatos e outros que não têm. E eu entendo que esse conjunto de forças do centro vão ter que ser capazes de fazer uma leitura muito precisa do cenário para definir qual o melhor caminho e garantir que, qualquer que seja o próximo presidente, ele tenha compromisso com uma agenda responsável e equilibrada e possa tirar o Brasil da crise que vive desde 2014.

Há alguma dificuldade de dialogar com o PSDB?

Nenhuma. De jeito nenhum. Tenho muitos amigos no PSDB, tenho muito respeito pelo presidente do PSDB, que é o (ex) governador Geraldo Alckmin. Não tem nenhuma dificuldade, o que não quer dizer que estaremos juntos. Não existe, como existiu no passado, nas eleições passadas, nas três últimas eleições, praticamente uma aliança natural, autoexplicativa. Dessa vez, não. Poderemos estar juntos? Até poderemos. Porém é algo que terá que ser construído. Não está construído hoje. E que não pode ser construído necessariamente apenas em torno do nome do PSDB. É o que a gente coloca sempre: o PSDB tem que estar disposto a sentar numa conversa em condições também de abdicar, também de abrir mão.

Maia seria também um candidato do governo nas eleições?

A candidatura dele jamais será de governo, como também não será de oposição. E isso eu deixei muito claro no dia 8 de março, na nossa convenção, quando a pré-candidatura dele foi lançada. Nós estamos tranquilos para defender e sustentar a participação que o Democratas teve (no governo Temer) nesse momento tão difícil para o País. Estamos prontos para defender e sustentar a contribuição que demos. O que não nos obriga a defender o que eventualmente tenha acontecido de errado, defender o que eventualmente o partido tenha tido qualquer participação.

Onde o governo errou?

Não há nenhum governo perfeito nem nenhum governo apenas tomado por defeitos. Para mim, os dois grandes problemas foram a péssima comunicação e distanciamento completo das ruas, da realidade do povo, do dia a dia do brasileiro. Então muitas decisões foram tomadas em Brasília com base na experiênia de Brasília, do que é vivido no Congresso Nacional, nas rodas de discussão política, e isso é muito diferente do que é o Brasil. Eu pude constatar isso sobretudo quando me tornei prefeito. Eu vi a distância do Brasil real, sofrido pelas pessoas, do Brasil tratado nos corredores da Esplanada dos Ministérios e do Congresso Nacional. E eu acho que o governo Temer cometeu esse erro desde o princípio, que foi não ter criado essa conexão, ou não ter buscado, mesmo sabendo que o momento não era propício, esse link com as ruas.

Estadão
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