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TST valida geolocalização como prova digital de jornada de bancário

Bancário alegou que determinação viola seu direito à privacidade; prova ficará limitada aos horários alegados pelo trabalhador, segundo TST

17 mai 2024 - 17h41
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TST valida geolocalização como prova digital de jornada de bancário
TST valida geolocalização como prova digital de jornada de bancário
Foto: Getty Images

O Tribunal Superior do Trabalho cassou uma liminar que impedia que o Banco Santander utilizasse prova digital de geolocalização para comprovar a jornada de um bancário de Estância Velha, no Rio Grande do Sul. Por maioria de votos, a decisão é da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2). Segundo o colegiado, a prova é adequada, necessária e proporcional e não viola o sigilo telemático e de comunicações garantido na Constituição Federal. 

Em uma ação trabalhista ajuizada em 2019, o bancário - que trabalhou 33 anos no Santander - pedia o pagamento de horas extras. Ao se defender, o banco disse que o empregado ocupava cargo de gerência e, portanto, não estava sujeito ao controle de jornada. Por isso, pediu ao juízo da 39ª Vara do Trabalho de Estância Velha a produção de provas de sua geolocalização nos horários em que ele indicava estar fazendo horas extras, para comprovar “se de fato estava ao menos nas dependências da empresa”. 

O bancário protestou, mas o pedido foi deferido. O juízo de primeiro grau determinou que ele informasse o número de seu telefone e a identificação do aparelho (IMEI) para oficiar as operadoras de telefonia e, caso não o fizesse, seria aplicada a pena de confissão - quando, na ausência da manifestação de uma das partes, as alegações da outra são tomadas como verdadeiras.

Contra essa determinação, o bancário solicitou mandado de segurança no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) contra a determinação, alegando violação do seu direito à privacidade, “sobretudo porque não houve ressalva de horários, finais de semana ou feriados”.  Na avaliação do trabalhador, o banco tinha outros meios de provar sua jornada, sem constranger sua intimidade.

O Santander, por sua vez, sustentou que a geolocalização se restringiria ao horário em que o empregado afirmou que estaria prestando serviços. Portanto, não haveria violação à intimidade, pois não se busca o conteúdo de diálogos e textos.   

Ao Terra, o advogado Aloísio Costa Junior, sócio do escritório Ambiel Advogados e especialista em Direito do Trabalho, explica que nenhum direito é absoluto e todos podem ser sujeitos a restrições. Essas restrições devem ser estabelecidas pela legislação ou por decisões judiciais, com o objetivo de proteger outros direitos, sejam eles próprios ou de terceiros, e devem ser adequadas, necessárias e proporcionais.

No caso analisado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), o advogado analisa que a restrição ao direito do trabalhador, através da análise de dados de geolocalização, foi considerada razoável para obter provas em um processo judicial, sendo uma decisão técnica adequada ao caso específico.

Aloísio também esclarece que a legislação não define uma ordem específica de sucessão para tipos de provas, ou seja, não exige que uma parte produza um tipo específico de prova antes de recorrer a outros meios. As partes têm o direito de utilizar todos os métodos legais e moralmente legítimos para provar os fatos alegados em um tribunal. 

"Se o TST concluiu que o uso de dados de geolocalização é permitido, não haveria motivo para condicionar o acesso a essa prova à impossibilidade de provar os fatos de outro modo", destaca o advogado.

O especialista em Direito do Trabalho também explica que a recente decisão do TST não tem caráter vinculante, ou seja, não obriga outros juízes e tribunais trabalhistas a seguirem o mesmo entendimento. No entanto, trata-se de um precedente significativo, vindo de um Tribunal Superior, que provavelmente será utilizado como argumento favorável por partes que desejam usar esse tipo de prova em ações trabalhistas. Essa decisão pode influenciar futuras interpretações e aplicações da lei, ainda que não seja uma obrigatoriedade para todos os casos, de acordo com ele.

O que consideraram os ministros

O ministro Amaury Rodrigues, relator do recurso, considerou a geolocalização do aparelho celular adequada como prova, argumentando que a medida permite saber onde estava o trabalhador durante o alegado cumprimento da jornada de trabalho por meio do monitoramento de antenas de rádio-base. Para o magistrado, a medida é proporcional, "por ser feita com o menor sacrifício possível ao direito à intimidade". 

O ministro lembrou que a diligência coincide exatamente com o local onde o próprio trabalhador afirmou estar, e só se poderia cogitar em violação da intimidade se as alegações não forem verdadeiras. Quanto à legalidade da prova, o relator afirmou que não há violação de comunicação, e sim de geolocalização. “Não foram ouvidas gravações nem conversas”, ressaltou.

Em seu voto, o ministro aurgumentou que a Justiça do Trabalho capacita os juízes para o uso de tecnologias e utiliza um sistema [Veritas] de tratamento dos relatórios de informações quanto à geolocalização, em que os dados podem ser utilizados como prova digital para provar, por exemplo, vínculo de trabalho e itinerário ou mapear eventuais “laranjas” na fase de execução. 

“Desenvolver sistemas e treinar magistrados no uso de tecnologias essenciais para a edificação de uma sociedade que cumpra a promessa constitucional de ser mais justa, para depois censurar a produção dessas mesmas provas, seria uma enorme incoerência”, afirmou.

Ainda, segundo o relator, a produção de prova digital é amparada por diversos ordenamentos jurídicos, tanto de tribunais internacionais como por leis brasileiras, como a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, a Lei de Acesso à Informação e o Marco Civil da Internet, que possibilitam o acesso a dados pessoais e informação para defesa de interesses em juízo.

Na votação, ficaram vencidos os ministros Aloysio Corrêa da Veiga e Dezena da Silva e a desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa.

Para Veiga, a prova de geolocalização deve ser subsidiária, e não principal. No caso, ela foi admitida como primeira prova processual, e o ministro defende que havia outros meios menos invasivos de provar as alegações do empregado. Na sua avaliação, as vantagens da medida para provar a jornada não superam as suas desvantagens. “A banalização dessa prova de forma corriqueira ou como primeira prova viola o direito à intimidade”, concluiu.  

Em nota, o Santander reforça que não comenta casos ainda em andamento na Justiça. Sobre a questão específica da reportagem referente ao uso de provas digitais, o banco afirma entender ser de fundamental importância, uma vez que são mais eficientes para a Justiça do que as provas testemunhais.

"A tecnologia está presente nas situações cotidianas e informações obtidas por meios digitais só contribuem para uma análise mais fidedigna dos fatos, bem como para a apuração da verdade real com maior eficiência probatória, confiabilidade e precisão da prova, celeridade processual, ampla defesa e contraditório. Vale destacar que, em consonância com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), toda privacidade fica assegurada. A adoção crescente das chamadas provas digitais favorece grandemente a Justiça e, por consequência, toda a sociedade", acrescentou o banco. 

Fonte: Redação Terra
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