Efeito Tarcísio embaralha votação da MP do IOF e placar pode frustrar o Planalto
Pauta da Câmara aproxima centro e oposição em críticas à política tributária do governo Lula
A votação da MP 1303, que altera a tributação sobre investimentos e juros sobre capital próprio, tornou-se o primeiro teste do governo Lula após o rompimento com União Brasil e Progressistas. O chamado “efeito Tarcísio” ganhou força no Congresso, com o governador paulista articulando resistência à proposta. Deputados como Kim Kataguiri e Luiz Philippe de Orléans e Bragança criticaram o caráter arrecadatório da medida e alertaram para impactos negativos sobre investimentos e setores produtivos.
A debandada de partidos do centrão da base de apoio do governo começa a deixar suas marcas no Congresso. A votação da medida provisória que altera a tributação sobre investimentos financeiros e juros sobre capital próprio virou o primeiro teste de fogo para o Planalto após o rompimento com União Brasil e Progressistas.
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Nos bastidores, parlamentares relatam que o clima é de “cenário adverso” para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A leitura entre aliados é que o chamado “efeito Tarcísio” — a ofensiva política do governador de São Paulo — provocou uma reconfiguração silenciosa das forças no plenário.
Para conter a sangria, o entorno de Lula age em duas frentes: articulação direta com líderes partidários e telefonemas da cúpula petista para parlamentares indecisos. Segundo relatos, Gleisi Hoffmann, ministra das Relações Institucionais, fez ligações pessoais para defender o texto e tentar evitar novas deserções.
Do outro lado, o governador Tarcísio de Freitas intensificou a ação entre deputados de legendas de centro, pedindo resistência à proposta. Interlocutores afirmam que as conversas partiram de seu núcleo político e tiveram efeito imediato: líderes de siglas que até ontem compunham a base decidiram entrar em obstrução, comprometendo a contagem de votos do governo.
Avaliação pontual
O deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP) avalia que a proposta repete erros de gestão econômica ao penalizar o investimento produtivo e comprometer o crescimento de longo prazo. “O maior prejuízo é taxar investimentos a longo prazo. Não satisfeitos em taxar duplamente a população, acumulando a arrecadação do IOF com a da MP, ainda querem incentivar que as pessoas gastem tudo no curto prazo e deixem o país sem investimentos estruturais. Além do prejuízo pra investidores, para geração de emprego e renda, ainda aumentamos a dívida pública pro futuro. Um completo desastre”, afirmou o parlamentar ao Terra.
Na mesma linha, o deputado Luiz Philippe de Orléans e Bragança (PL-SP) classificou a Medida Provisória 1303 como um movimento “claramente arrecadatório” do governo. “O Planalto tenta vender a ideia de modernização, mas o objetivo real é ampliar impostos e aumentar o controle sobre setores produtivos e inovadores, como o de ativos digitais e fintechs. Lula e sua base atuam de forma intensa nos bastidores, comprando apoio para garantir aprovação da medida”, disse. O parlamentar reconheceu, entretanto, que o governador Tarcísio de Freitas tem se manifestado com “preocupação legítima” sobre os impactos da proposta, mas destacou que “não houve qualquer contato direto comigo ou com minha equipe”.
Segundo ele, Tarcísio "tem se posicionado e dialogado com o Congresso sobre o tema".
Estratégia
Com o placar em aberto, o presidente Lula mobilizou ministros e aliados de última hora. Fernando Haddad passou parte da terça-feira na Câmara tentando convencer parlamentares sobre a importância da medida. Ainda assim, a base avalia que o cenário é “muito apertado” e que o governo pode sofrer uma derrota simbólica.
Prazo apertado
A MP perde validade nesta quarta-feira, 8. Para evitar o revés, precisa ser aprovada na Câmara e no Senado ainda hoje. A proposta estabelece alíquota única de 18% para aplicações financeiras, aumenta o imposto sobre juros sobre capital próprio e equipara a tributação das fintechs à dos bancos.
Na tentativa de conter resistências, o governo recuou de elevar o tributo sobre as casas de apostas — gesto interpretado como aceno ao centrão. O valor esperado de arrecadação, antes estimado em R$ 20 bilhões, caiu para cerca de R$ 17 bilhões.
Nos bastidores, a leitura é de que a medida se transformou em campo de guerra política entre Planalto e Palácio dos Bandeirantes. A força de Tarcísio entre parlamentares do centro e a perda de sustentação do governo em legendas-chave deixaram o desfecho imprevisível. O “efeito Tarcísio”, como já se diz nos corredores da Câmara, promete ecoar além da MP do IOF.