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Discriminação e falta de informação elevam casos de Aids no Brasil, diz ONU

18 jul 2014 - 00h32
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Mariana Della Barba e Kleyson Barbosa

Da BBC Brasil em São Paulo

O número de novos casos de infecção por HIV no Brasil aumentou 11% e o índice de mortes no país atribuídas à Aids subiu 7%, entre 2005 e 2013, segundo relatório divulgado na quarta-feira pela Unaids (Programa da ONU para HIV e Aids).

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Os dados chamaram a atenção porque vão na contramão da média global, em que os casos de infecção caíram 13% nos últimos três anos e o número de óbitos relacionados diminuiu 35% de 2005 a 2013, segundo o relatório.

Para especialistas ouvidos pela BBC Brasil, entre as causas do aumento estão a desinformação entre jovens, a discriminação contra gays e problemas de foco nas campanhas do governo.

Segundo a Unaids, a prevalência do HIV na América Latina é concentrada em determinados grupos mais vulneráveis, como gays, profissionais do sexo e usuários de drogas. Além disso, ao menos um terço das novas infecções na região ocorre em jovens, com idade entre 15 anos e 24 anos.

Jovens gays

A diretora do Unaids no Brasil, Georgiana Braga-Orillard, disse que os números do Brasil na pesquisa não a surpreenderam totalmente, já que dados oficiais já vinham apontando uma maior ocorrência de infecção por HIV entre jovens homossexuais.

"Muitos jovens de hoje se protegem menos, acham que não precisam de camisinha, até por acreditarem que Aids é uma doença do passado ou de pessoas mais velhas. Eles não viram ídolos morrerem, como [os cantores] Cazuza ou Renato Russo", disse Georgiana.

Para ela, a desinformação sobre a doença não diz respeito apenas ao governo. "Hoje, se fala menos sobre a Aids também nas escolas e até na mídia, em que o assunto acaba entrando em pauta apenas na página de ciência."

O governo brasileiro confirmou à BBC Brasil que existe um "crescimento de casos novos, concentrados nesses grupos e [isso] está de acordo com o cenário que o Ministério da Saúde tem apresentado nos últimos boletins epidemiológicos", porém não informou o que influenciou o seu aumento.

Preconceito

Além da falta de informação entre jovens, a diretora da Unaids também cita a discriminação contra grupos como os homens gays, o que faz com que eles demorem para fazer testes e procurar tratamento precocemente.

"Um problema é que, por enfrentarem discriminação, muitos homossexuais não procuram ajudam ou procuram tardiamente", afirma Georgiana.

"É preciso ver de perto por que essas pessoas não estão procurando tratamento, visto que o Brasil temos tudo: tratamento gratuito, remédios feitos aqui, testes rápidos também gratuitos."

A médica infectologista e pesquisadora do Laboratório de Pesquisas Clínincas DST/AIDS da Fiocruz Brenda Hoagland avalia que se trata de uma realidade nacional: "O que acontece no Brasil é que o diagnostico é tardio. Se o diagnostico é tardio, aumenta risco de transmissão e também de óbitos".

Ela explica que o tratamento é importante na política de prevenção, uma vez que "estudos mostram que quando a pessoa realiza o tratamento corretamente o vírus pode se tornar indetectável e ter sua capacidade de transmissão reduzida em até 96%".

Testagem

Segundo o governo, os números da Unaids apontam também para o fato de o Brasil, no mesmo período, ter aumentado os testes de HIV feitos em sua população.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que "a cobertura da realização dos exames passou de 28% da população sexualmente ativa (15 a 64 anos), em 2005, para 37%, em 2013".

A pesquisadora da Fiocruz avalia que a captura de dados também melhorou no período e pode ter influenciado no aumento do número de pessoas diagnosticadas.

Brenda, contudo, critica as campanhas de orientação e mostra preocupação com o crescimento do vírus em um dos grupos mais vulneráveis à doença: os homens que fazem sexo com homens.

"A gente tem que mudar a maneira de fazer campanha. Primeiro, porque ela só acontece no Carnaval. Depois porque é preciso ter campanhas educativas e mais elucidativas sobre onde o risco é maior. As campanhas apontam que o risco é igual, mas o risco ao fazer sexo anal ou sexo oral é diferente, por exemplo", considera.

A pesquisadora frisa que é importante conscientizar a todos. "A realidade é que o número de vezes que a pessoa se protege não muda muito, independente da orientação sexual". Depois de 30 anos da epidemia, ela acredita que "é preciso falar as coisas como elas são para que as pessoas individualmente trabalhem o risco".

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