PUBLICIDADE

Tragédia em Santa Maria

Delegado do caso Kiss: não há espaço para amadorismo entre gestores

Marcelo Arigony reforçou que a legislação confusa não vai impedir que sejam apontadas todas as responsabilidades por tragédia em boate

13 mar 2013 - 23h01
(atualizado às 23h01)
Compartilhar
Exibir comentários
<p>Incêndio na Boate Kiss deixou mais de 240 pessoas mortas e centenas de feridos</p>
Incêndio na Boate Kiss deixou mais de 240 pessoas mortas e centenas de feridos
Foto: Rafael Dias/Agência Freelancer / Especial para Terra

O delegado regional de Polícia Civil de Santa Maria, Marcelo Arigony, reforçou nesta quarta-feira que todas as responsabilidades serão apontadas ao final do inquérito que investiga o tragédia da Boate Kiss, que causou a morte de 241 pessoas. Ele ressaltou que a legislação pode ser confusa, mas que isso não pode impedir que todos os fatos sejam esclarecidos.

Veja quem são as vítimas do incêndio em boate de Santa Maria

Veja como a inalação de fumaça pode levar à morte 

Veja relatos de sobreviventes e familiares após incêndio no RS

Veja a lista com os nomes das vítimas do incêndio da Boate Kiss

"Legislação existe, e ela precisa ser cumprida. Ela pode ser sobreposta, ser complexa, mas essa análise está sendo feita e nós vamos chegar a uma conclusão, no final, sobre quem teria responsabilidade nesse caso", disse Arigony.

O delegado também deu um recado aos governantes que se apoiam em eventuais falhas da legislação para não agir. "Os gestores públicos devem ter uma dimensão maior da responsabilidade que eles têm quanto à concessão de alvarás e à fiscalização. O gestor público tem que saber da sua responsabilidade, que não existe mais espaço para amadorismo. Ele tem que conhecer as suas atribuições e o seu poder discricionário, que é o dever de agir. O não-agir resulta em situações como essa, que levaram a essa tragédia", disse.

Arigony ainda comentou que espera mudanças daqui para a frente. "Nós temos certeza que esse fato vai revolucionar o entretenimento no País. Infelizmente essas pessoas que morreram vão ser os mártires dessa revolução. Vai haver e já está havendo uma mudança de postura de todos os órgãos fiscalizadores."

Em um exemplo de como a legislação pode ser falha, a Polícia Civil confirmou nesta quarta-feira que o projeto de reforma sem ampliação da Boate Kiss não foi aprovado pela prefeitura. O documento havia sido recebido pelos investigadores na terça-feira à tarde.

O segundo projeto de reforma – o primeiro tinha 29 apontamentos a corrigir – precisava ainda de seis correções técnicas, de acordo com a análise do Escritório da Cidade, uma autarquia municipal. Entre eles, faltava o Habite-se (documento que atesta que o imóvel foi construído seguindo-se as exigências da legislação estabelecidas pela prefeitura para a aprovação de projetos). A informação que os delegados tinham é que existia um Habite-se de 2000 (quando funcionava um depósito de bebidas no local), mas essa questão ainda vai ser melhor verificada.

Outras exigências diziam respeito a rampas de acesso e questões ligadas à burocracia. O projeto estava disponível para ser retirado e corrigido pelos responsáveis – ele estava assinado pela empresa Eccon Empreendimentos de Turismo e Hotelaria Ltda, dona do imóvel – em 16 de março de 2010, mas isso nunca foi feito.

O que os delegados tentam entender agora é como o alvará de localização foi fornecido pela prefeitura, mesmo que tenham ficado pendentes seis correções que deveriam ter sido feitas no projeto de reforma. Pela lei, a aprovação do projeto de reforma não é uma exigência para que o alvará de localização seja liberado. Isso é o que tem sido constantemente alegado por pessoas ligadas ao governo municipal.

"É uma questão que tem um ponto de interrogação sobre ela. Temos que ver se isso está correto e, se não está, há uma falha legislativa muito grande que precisa ser verificada", afirmou o delegado Sandro Meinerz, um dos responsáveis pelo caso.

Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou mais de 230 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A intenção é oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade
Publicidade