Ministro, Tarcísio e Nunes vão acionar agência para romper contrato com a Enel em SP
Empresa está sob pressão após novo blecaute na Grande São Paulo; concessionária tem falado em investimento recorde para modernizar rede elétrica e aumento das podas preventivas
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o governo federal vai pedir à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que inicie a análise do processo de caducidade do contrato com a Enel.
"Não há outra alternativa há não ser a caducidade. O governo estadual, federal e municipal estão na mesma página. Saímos com isso acordado para iniciar o processo de caducidade", complementou o governador Tarcísio.
A declaração ocorre após um apagão ter deixado 2,3 milhões de imóveis na Grande São Paulo no escuro em decorrência de vento recorde na quarta-feira passada, 10. Nesta terça-feira, 16, seis dias após o evento climático, paulistas ainda reclamam de falta de eletricidade. A Enel, porém, diz que todos os casos causados pela ventania da semana passada já foram resolvidos.
Nesta tarde, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD) e o prefeito Nunes realizaram uma reunião a portas fechadas sobre a Enel.
A concessionária tem apontado investimento recorde para modernização da rede elétrica desde que assumiu a concessão, em 2018. De 2025 a 2027, foram R$ 10,4 bilhões. A empresa também disse ter intensificado manutenções preventivas e duplicado o número de podas de árvores em contato com a rede, chegando a mais de 600 mil podas realizadas por ano desde 2024 (leia mais abaixo).
A Enel tem destacado que os ventos na semana passada atingiram quase 100 km/h, o que resultou em centenas de árvores caídas. A empresa diz ainda ter mobilizado até 1.800 equipes para os reparos.
Esse número é contestado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), que diz ter identificado uma quantidade bem menor de veículos da empresa nas ruas por meio do sistema municipal de câmeras.
Na última semana, moradores relataram diversos transtornos, desde a perda de estoque até dificuldades para trabalhar e interrupções no fornecimento de água, também prejudicado pelo blecaute.
A nova crise de energia — após episódios semelhantes em 2023 e 2024 — fez a empresa voltar aos holofotes, com pedidos de intervenção federal pelas autoridades de São Paulo. Uma das preocupações é sobre a renovação antecipada da concessão com a empresa italiana, cujo contrato é válido até 2028.
Nove dias antes do blecaute, a área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) já havia recomendado que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) avaliasse a possibilidade de intervenção federal na Enel.
A auditoria destacou que a concessionária não teria cumprido sete dos onze Planos de Resultados firmados. Também disse que penalizações não têm sido eficazes, diante da judicialização das multas aplicadas pelo órgão regulador (de mais de R$ 260 milhões).
Nesta segunda, 15, Tarcísio já havia dito que a União não pode empurrar a renovação com a empresa "goela abaixo". Na semana passada, o ministro do governo Lula chegou a dizer que Nunes e Tarcísio faziam "disputa política" com o evento extremo climático.
No sábado, 13, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a Enel restabelecesse imediatamente o fornecimento de energia a hospitais, serviços de saúde, eletrodependentes e outros serviços essenciais, sob pena de multa de R$ 200 mil por hora. E deu até 12 horas para os demais imóveis afetados.
Na tarde de segunda, após o fim do prazo, a Defensoria Pública do Estado e o Ministério Público Estadual afirmaram que vão oficiar a Enel e a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado (Arsesp) requisitando informações sobre a quantidade de imóveis sem energia desde quarta. "A solicitação é necessária para apuração do eventual descumprimento e o cálculo de multa por hora."
'Estamos desesperados', diz dono de restaurante em Pinheiros que está sem luz há dias
Proprietário de um restaurante em um sobrado na Rua Francisco Leitão, em Pinheiros, na zona oeste da capital, Hugo Delgado relata ainda estar sem energia nesta terça, 16. Segundo ele, o estabelecimento já soma R$ 40 mil de prejuízo com as perdas do apagão, e a Enel ainda não informa um prazo concreto para o restabelecimento da eletricidade. "Estamos desesperados."
A luz no local acabou às 14h de quarta-feira, assim como no resto do bairro, e chegou a voltar às 11h30 de quinta, 11. Mas a felicidade durou pouco: meia hora depois, uma árvore em frente ao restaurante caiu, derrubando a fiação elétrica. "O resto da rua está com energia. Só a gente e o sobrado vizinho, com duas casas geminadas, seguimos no escuro", afirma Delgado.
O proprietário do restaurante em Pinheiros calcula ao menos R$ 30 mil de prejuízo com vendas perdidas nos dias fechados e R$ 3 mil com perda de produtos em geladeiras, além de gastos extras de R$ 7 mil com a contratação de um gerador, que usou no último sábado, 13. "Somos um restaurante pequeno e esses números são grandes para a gente", enfatiza. "É muito assustador, isso quebrou completamente as nossas pernas."
Além do gerador alugado no sábado, dia de maior movimento, Delgado tem tentado manter o restaurante aberto na hora do almoço com o uso de luz natural. Ele conta com a ajuda de vizinhos com energia, que disponibilizaram suas geladeiras para que ele pudesse guardar produtos. O empresário também precisou recorrer aos vizinhos para carregar o celular e as maquininhas de cartão de crédito.
"A situação está muito complicada e não sabemos quando vai normalizar", desabafa, suspirando. "É urgente. Já são seis dias. Tentamos contato com a Enel por todos os canais, pelo aplicativo, pelo atendimento telefônico, por telefone e até pelo direct do Instagram. E nada."
Após a reportagem questionar a concessionária, a empresa enviou equipes ao endereço.