Letalidade policial cai 9,5% em SP, mas patamar se mantém acima das 400 mortes no semestre
Mortes cometidas por policiais em confronto teve redução após ano recorde. Especialista diz que número de vítimas permanece 'inaceitável' e pede política institucionalizada de controle do uso da força
SÃO PAULO - Policiais do Estado de São Paulo mataram 415 pessoas em confrontos no primeiro semestre deste ano, queda de 9,5% em relação ao mesmo período do ano passado, quando o índice atingido havia sido o maior em 14 anos -este tipo de ocorrência bateu recorde histórico ao longo de 2017. No mesmo período, 27 policiais morreram, menor número de vitimização desde 2001.
O levantamento de dados foi feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública a partir de informações divulgadas mensalmente pelas polícias no Diário Oficial do Estado. A conta leva em consideração o que os órgãos declaram como "mortes decorrentes de oposição à intervenção policial", que inclui ocorrências envolvendo policiais em serviço e de folga. As 415 vítimas deste ano superam a quantidade registrada em 2016 (403), mas está abaixo do número de mortes de 2015 (449) e de 2014 (416).
Diretora executiva do Fórum, Samira Bueno diz que o resultado é positivo, mas há ressalvas. "Não há política institucionalizada de controle do uso da força pelos policiais. Com isso, a redução tem mais a ver com lógicas locais, tem mais a ver com o coronel da área que é mais engajado e pega no pé", disse. Ela classifica o número de 415 como "muito alto" e "inaceitável". "Sem essa política, é impossível prever a continuidade dessa redução, pois não há sustentabilidade ao longo do tempo. Não sei se podemos comemorar."
A polícia diz haver políticas de redução da letalidade. "Nós estamos dando continuidade às políticas de redução da letalidade adotada desde comandos anteriores, pois entendemos que a preservação da vida é o principal objetivo de uma instituição policial", disse ao Estado o comandante-geral da corporação, coronel Marcelo Vieira Salles.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública classifica como "equivocada" a forma de reunião dos dados feita pela reportagem por unir casos envolvendo policiais de folga e em serviço. "O correto é mantê-los separados, já que possuem dinâmica e políticas de redução completamente diferentes." A reportagem age baseada no próprio formato divulgado pelas polícias no Diário Oficial, em que, apesar da especificação de quantos casos aconteceram em serviço ou de folga, ficam reunidos sob o mesmo termo "morte decorrente de intervenção policial", como é possível perceber por meio da imagem do comunicado publicado na edição desta terça-feira, 31.
A pasta acrescenta que as ocorrências envolvendo agentes em folga caíram 33,07% no primeiro semestre deste ano, em comparação com igual período de 2017 - de 127 para 85 casos. Já as mortes decorrentes de intervenção policial envolvendo policiais civis e militares em serviço, disse a secretaria, caíram 0,62% neste mesmo período - de 332 para 330.
"Em 2017, o índice de suspeitos que morreram após confronto com a polícia foi de 18%. Também no ano passado, foram presos em flagrante 152.448 pessoas. No mesmo período, 687 morreram ao confrontar a polícia durante o serviço, ou seja, 0,45% do total de prisões", disse a pasta, que acrescenta que "a opção pelo confronto é sempre do criminoso".
A secretaria disse investigar todos os casos para se certificar da legitimidade do uso da força. "Todas as MDIPs (Mortes Decorrentes de Intervenção Policial) são acompanhadas, monitoradas e analisadas para constatar se a ação policial foi realmente legítima."
Secretário abriu mão de desconto em bônus
Apesar desse posicionamento, o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Mágino Alves Barbosa Filho, decidiu deixar de aplicar um desconto previsto no bônus pago a policiais civis, militares e peritos em caso de alta nas mortes cometidas por esses agentes, como revelou o Estado em maio.
Mesmo com a letalidade policial recorde constatada em 2017, em todos os trimestres Mágino tomou a decisão de que a redução de até 20% no bônus trimestral, cujo valor total pode chegar a R$ 2 mil para cada policial, não seria aplicada em razão de um suposto "novo paradigma no comportamento criminal": os bandidos estariam atuando com mais violência e usando fuzis, por exemplo, com maior frequência.