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A primavera, suas cores, flores e histórias que mudaram o mundo

27 set 2024 - 06h12
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Resumo
Início do outono no Hemisfério Norte e primavera no Hemisfério Sul trazem mudanças climáticas e de cenário, impactando até mesmo a arte, como na obra prima de Igor Stravinsky.
Foto: Unsplash

Salve, salve!!! Salve-se quem puder.

Aqui no Hemisfério Norte o outono começou oficialmente no domingo 22 de setembro às 14:43h. Ao sul do Equador a primavera deu o ar de sua graça no mesmo dia e horário.

Na primavera dessas bandas de cá, os casacões de inverno ainda são vistos nas manhãs ensolaradas, dando lugar a versões leves e coloridas na metade do dia, ao cair da tarde. Os restaurantes e cafés montam suas mesas ao ar livre, sem a menor cerimônia, contando com a preciosa colaboração do Astro Rei.

O compositor russo Igor Stravinsky apresentou sua obra prima “A Sagração da Primavera” no dia 29 de maio de 1913, na véspera da Grande Guerra, em Paris no Théâtre des Champs-Élysées, causando escândalo na época.

A playlist é dele, Stravinsky, de quem mais seria? Além da ”Sagração”, nesta seleção com o básico do gênio russo temos a Sinfonia em C, o “Pássaro de Fogo” e muitas outras composições.

A primavera: Deus salve as abelhas

As abelhas, umas poucas, fazem voos rasantes e cirúrgicos pelo gramado. Procuram as pequenas flores, os dentes de leão, em meio a tanto verde. Sem elas, as abelhas, não há polinização. E também não há mel pra comer com meu iogurte no café da manhã.

Sem a polinização, o pólen das flores não se espalha e as plantas não se reproduzem. E sem elas, as flores e a própria primavera não existem. Podem até existir, mas sem cores, perfumes e tantos outros insetos essenciais para a vida humana.

Tulipas brotam do nada em locais onde você nem se lembrava mais que as havia plantado. Cerejeiras e magnólias são um espetáculo à parte. Embelezam os arredores por duas semanas e depois somem durante as próximas cinquenta, mas é encanto mais do que suficiente.

Na cidade, os parques ficam cheios no fim de tarde. A molecada joga os casacos longe e sai correndo brincando. Os pais que se virem pra resolver isso quando começa a escurecer e a temperatura cai.

Casais, amigos, jovens, velhos, turistas, moradores de rua, a turma saindo do trabalho, todo mundo para um pouquinho para recarregar o corpo com vitamina D. O sol aparece no inverno, mas não com a mesma intensidade e sem contato direto com a pele já que os casacões a protegem.

É impressionante como o humor da cidade inteira muda para melhor. De um dia para o outro. Salvo uma recaída na temperatura, é só alegria até o final de setembro. Com sorte, entramos em outubro sem muitas preocupações com o clima.

O verão desse ano foi quente mesmo, muito mais que as três semanas de praxe acima de 35°C. Só foi sossegar no início de setembro, mas as sorveterias continuam faturando alto. As fontes de água natural instaladas para todo canto da cidade funcionam a todo vapor. Aliás, até outro dia tinha vapor d’água nos parques e praças sendo borrifado nas pessoas aliviando o calor.

Mas isso é papo pra daqui três meses.

A Sagração da Primavera / Le Sacre du printemps (1913)

O maior escândalo da História das Artes

A mais famosa sinfonia de Igor Stravinsky foi criada sob encomenda para musicar a peça de balé homônima produzida pela companhia do famoso empresário Sergei Diaghilev. A coreografia e dança são assinadas por ninguém menos do que a lenda Vaslav Nijinsky.

A premiére de A Sagração da Primavera foi em Paris pelos Ballets Russes de Diaghilev em 29 de maio de 1913 e ainda hoje é considerada por todos os críticos como o maior escândalo artístico já acontecido no mundo ocidental. Não houve nada próximo disso. A música de Stravinsky e a coreografia de Nijinsky levaram o público presente a um estado de euforia descontrolada.

Os nobres burgueses parisienses logo se mostraram contrários àquela revolução na dança, coreografia e música. Dizem que foi ali a criação do Balé Moderno.

A catarse coletiva chegou a tal ponto que a burguesia conservadora partiu pra briga literalmente contra os apoiadores e mais liberais. Cavalheiros de fraque chegaram às vias de fato se estapeando e jogando sapatos uns nos outros enquanto Nijinsky levava o balé na raça enquanto a música mal podia ser ouvida.

O espetáculo chegou enfim ao desfecho, mas o mundo das artes jamais foi o mesmo.

São 14 trechos que resultaram nas cenas a seguir:

Primeira parte, a Adoração da Terra

I. Introdução / II. Os Áugures da Primavera: Dança dos Jovens / III. Ritual da abdução / IV. Os Círculos da Primavera / V. Jogos das duas tribos rivais / VI. Procissão do Sábio / VII. A Adoração da Terra / VIII. A Dança da Terra /

Segunda Parte: O Sacrifício

IX. Introdução / X. O Círculo Místico das Jovens / XI. Glorificação da Escolhida / XII. Evocação dos Ancestrais / XIII. O Ritual aos Ancestrais / XIV. Dança do Sacrifício.

Veja a obra completa executada com perfeição pela Radio Philharmonic Orchestra sob comando do maestro holandês Jaap van Zweden no Concertgebouw em Amsterdam.

Fonte: Guia dos Clássicos, Rafael Fonseca

Pra ver e ler

FILMES: Fantasia – Walt Disney (1940). Clássico absoluto.

Walt Disney usou um trecho da sinfonia de Stravinsky em seu famoso filme. Na animação a música ganha forma e movimento em cenas no fundo do mar onde águas vivas e medusas dançam ao som da “Primavera".

Veja ou reveja as belas imagens.

Sob o Sol da Toscana – Audrey Wells (2003). La dolce vita.

Destaque para essa história água com açúcar de Hollywood. A paisagem exuberante combinando com Diane Lane e a Alfa conversível do amante da protagonista ajudaram na escolha de um filme que retratasse o esplendor da primavera.

La dolce Vita clássica na Costa Amalfitana com Positano e todas aquelas cidadezinhas de cair o queixo que você só encontra na Itália.

LIVRO: A Sagração da Primavera - Modris Eksteins (2000). Essencial para entender o Século XX e suas Guerras.

Modris Eksteins, historiador nascido em Riga, capital da Letônia em 1943, usa o nome do famoso balé de Stravinsky em seu clássico livro para descrever as mudanças no consciente coletivo após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), seus impactos, consequências e principalmente as causas que originaram o conflito que surgiu para acabar com todas as guerras.

No balé, o público assiste a um festival pagão de boas-vindas à primavera, mas a ideia inicial de celebrar a Vida termina mal com o sacrifício bárbaro de uma virgem.

No livro, Modris Eksteins usa a estrutura de um drama em três atos tendo Berlim, Paris, os campos de Flandres e suas trincheiras como cenários. Os personagens são artistas, escritores e políticos, que escreviam mesmo sem saber o roteiro de uma tragédia que eles próprios encenavam e viveriam em breve na Grande Guerra.

O autor considera essa peça a confluência de todas as manifestações artísticas e culturais que vieram antes de sua apresentação, em 29 de maio de 1913, e de todas as que surgiram depois.

Como bem analisou Mércio Gomes em sua crítica, “este livro arrebatador, arrasador, por vezes sombrio e ominoso, é crucial para se entender todo o processo social e político, mas principalmente estético e cultural, que resultou, afinal, na demolição do mundo burguês, favorecendo nos escombros a ascensão tanto do comunismo quanto do nazifascismo, com suas novas ideologias que prometiam o nascimento de um 'novo homem' e de novas sociedades utópicas.”

O último ato da Segunda Guerra, após a criação e destruição do Terceiro Reich, termina com o suícidio de Hitler justo na primavera de 1945 dentro de um bunker no subsolo da sitiada Berlim enquanto seus oficiais dançavam e festejavam nos bares.

O autor emigrou com a família e seu pai, um pastor batista, para Winnipeg no Canadá e depois em Toronto. Foi ali onde ele fez seus estudos e se formou em História pela Universidade de Toronto.

(*) Pedro Silva é engenheiro mecânico, PhD em Materiais, vive em Viena, acha o outono, suas cores e trocas das folhas muito mais bonito do que a primavera, e escreve a newsletter Alea Iacta Est.

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