Racismo religioso oriundo de padre não deveria gerar tanta surpresa
Contestar nomes que fujam à lógica cristã é uma recomendação no Código de Direito Canônico da igreja católica
Yaminah, esse lindo nome que foge da normalidade ocidental foi suficiente para que uma família acusasse um padre de evitar falar o nome da filha durante o batismo. De um lado, os parentes da criança afirmam que o padre não falou o nome da sua cria, em vários momentos, alegando que o nome tinha ligação com uma outra religião; já o sacerdote disse que falou, sim, em outro momento.
Os pais de Yaminah ainda relataram que no ápice da cerimônia, quando o padre deveria falar “eu te batizo Yaminah”, o nome da criança também não foi falado.
Infelizmente, cristãos como Padre Júlio Lancellotti e o Pastor Henrique Vieira são raras exceções dentro dos dogmas cristão. Eu acredito que muitos de nós por vivermos em uma bolha à esquerda, por vezes esquecemos que a lógica cristã ocidental é de exclusão e não de acolhimento. A bíblia fala sobre submissão da mulher, proíbe relações homoafetivas, condena ao inferno quem quer viver ao seu modo e ainda tem bula papal chamada Dum Diversas que autorizava a escravização taxando os futuros escravizados como inimigos de Cristo.
No Brasil, a história do cristianismo deixa o mesmo rastro de sangue que deixou em todos os lugares por onde passou, mas o requinte de crueldade aqui tem pontos específicos.
Se buscar informações nas literaturas eurocêntricas é fácil achar uma imensa romantização dos jesuítas, que eles levaram a palavra de cristo, que foram fundamentais para instalação do cristianismo em território indigena, que espalharam o portguês em um papel educacional e, em obras mais idealizadoras, até surgem os jesuítas como pacificadores dos povos indígenas. Contudo toda essa lista tem o viés portugues como análise.
O que para europeu era levar a palavra de cristo para indígenas era ceifar suas religiões, a instalação de igrejas provavelmente foi feita com mão de obra de povos originários escravizados, espalhar o português é apagamento das linguagens oriundas desse território e essa “pacificação” foi, provavelmente, regada de muitos bandeirantes e carabinas.
O mesmo apagamento cultural sofridos pelos indígenas brasileiros, foi imposto também para negros e negras da África. Então apagamento cultural, religioso e linguístico são apenas uns dos vários métodos de catequização cristã. Todo indígena e negro ao se batizar ganhavam um nome novo, ou seja, a recusa ao nome é desde os primordios da igreja Cristã, se surpreender com isso hoje em dia me parece levemente jocoso. E não estou invalidando a reivindicação da família, longe disso. Penso que estão corretos, até porque em um país com tanto sincretismo religioso é completamente compreensível ver pais cristãos que buscam suas raízes ancestrais. A igreja deve se adaptar à mudança de cultura e de identidade de seus membros, e não o contrário. A religiosidade não deve pautar a sociedade e sim o contrário, ao meu ver.
O cristianismo foi pensado, moldado e aplicado para apagar identidades negras, indígenas, orientais, árabes e todas as coisas que não tem como centro o Cristo. Terreiros de matriz africana são violados por traficantes cristãos. O papa atual deu a entender que tem que levar cristo aos povos da amazônia. Então assim, a indignação é justa, tem que ganhar visibilidade para que não volte a acontecer, mas se surpreender é não entender em que base se dá o cristianismo. Muitas vezes a gente alimenta o monstro e depois não entende porque somos engolidos. Máximo respeito a todas as religiões, mas eu ainda tenho muita dificuldade em romantizar o grupo religioso responsável por escravizar meus antepassados.